Entrevistas

ROMULO MELLO fala sobre licença para fotografar nos parques

FOTOGRAFIA & BUROCRACIA & ARTE

Fotógrafos de natureza querem liberdade para clicar


 


Silvestre Gorgulho


Além de luz, da arte e da técnica, uma bela fotografia de natureza precisa também de muita paciência. E de licenças especiais. A discussão levantada pelos fotógrafos de natureza quanto à obrigação do Instituto Chico Mendes em pedir autorização prévia para o trabalho nas unidades de conservação, além da doação do material produzido, ainda não acabou. Em entrevista exclusiva à Folha do Meio, o presidente do ICMBio, Rômulo Mello, deixou claro que há necessidade de alguns ajustes e prometeu promover um fórum para discutir e aperfeiçoar a Instrução Normativa.


ICMBio abre diálogo com fotógrafos


A regra do ICMbio é clara: a utilização de imagens e a realização de filmagens, gravações e fotografias, de caráter educativo, cultural, científico, comercial e publicitário no interior das Unidades de Conservação, exceto Área de Proteção Ambiental e RPPN – Reserva Particular do Patrimônio Natural, dependerá de prévia autorização. E mais: Todas as atividades de filmagens, gravações e fotografias em Unidades de Conservação deverão ser acompanhadas por um ou mais funcionários da Unidade ou por pessoas por ela indicada, às expensas do autorizado. O ICMBio deverá receber, a título de doação, cópia do material bruto produzido, mediante assinatura de Termo de Cessão para uso não comercial da imagem. E mais: as doações de material somente poderão ser feitas às Unidades, as quais procederão a inserção deste no patrimônio do ICMBio. Para completar: As doações não devem substituir o pagamento previsto. Para muitos fotógrafos da natureza, como Izan Petterle, essa é uma arbitrariedade claramente autoritária que limita em muito a liberdade de expressão. A discussão é boa, gera uma certa polêmica, mas tanto o ICMbio como os profissionais da fotografia querem apenas chegar a um consenso. Na edição de julho, falaram os fotógrafos. Agora, fala o ICMbio pelo seu presidente, Rômulo Mello, um conciliador por natureza. “Vamos abrir um diálogo. Propo­nho que nos reunamos para discutir e aperfeiçoar a Instrução Normativa de forma que os fotógrafos e outros técnicos possam sugerir aprimoramentos”.




 


 



 


 




 


 



 



 



 



 




 


 


 


 


 


“Estamos revisando a Instrução Normativa para que ela represente um avanço na relação com os profissionais que geram imagens”.


RÔMULO MELLO –Entrevista


Rômulo Mello já foi presidente do Ibama, diretor do MMA e é o primeiro presidente do  Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).  Rômulo José Fernandes Barreto Mello é paraense, graduado em Engenharia Agronômica pela Faculdade de Ciências Agrárias do Pará, com especializações em Heveicultura e Gestão de Centros de Pesquisa. Por ter um vasto currículo dedicado à gestão da causa ambiental, ele foi escolhido para  assumir o desafio de implantar o ICMBio, promover a regularização fundiária nas UCs e ainda buscar alternativas econômicas sustentáveis para cada unidade.


“A idéia não é res­tringir e sim organizar para que a ação ocorra sem riscos para o fotógrafo e para a Unidade”.


Folha do Meio – A fotografia educa, sensibiliza e até ajuda a  preservar. Por que restringir a ação de fotógrafos nas Unidades de Conservação?
Rômulo Mello – A idéia não é res­tringir e sim organizar para que ela ocorra sem riscos para o fotógrafo e para a Unidade. A Unidade de Conservação tem que cumprir com sua função, que é a de conservar a biodiversidade.


FMA – Um simples fiscal ou vigia tem discernimento para proibir a entrada de um fotógrafo num parque?
Rômulo – Existem áreas dentro das unidades que, pelo plano de manejo, são intangíveis ao uso público. Nós permitimos o acesso, com  acompa­nhamento,  por entender o papel edu­cativo da geração de imagens.  E entendemos que é necessário o acompa­nhamento para garantir a segurança dos profissionais, uma  vez que em varias unidades constata-se a presença de animais e acidentes geográficos ou sensibilidades ecológicas que podem colocar em risco a vida do fotógrafo.   “Um simples fiscal ou vigia” cumpre regras estabelecidas e pode salvar a vida de pessoas que não conhecem aquele ambiente . Além da segurança do fotógrafo, as áreas definidas como intangíveis demandam maior proteção, tendo em vista o caráter desses espaços, onde a primitividade da natureza permanece intacta e deve ser especialmente protegida. Esta é a razão que pauta a rigidez quanto a alterações humanas, uma vez que tais áreas representam o mais alto grau de preservação. Esses espaços funcionam como matriz de repovoamento de outras zonas, onde já são permitidas atividades humanas regulamentadas.
O fotógrafo normalmente não tem restrições nas áreas de livre acesso, desde que não seja necessária alteração das atividades rotineiras das UCs bem como uso indevido da área, ou necessidade de apoio logístico ou de pessoal.



FMA – Os guardas e servidores das UCs conhecem a Instrução Normativa? Eles sabem o que são direitos autorais e que tem diferentes tipos de fotógrafos?
Rômulo –  Estamos revisando a Instrução  Normativa para que ela represente um avanço na relação com os profissionais que geram imagens. E os guardas e servidores do ICMBio, naturalmente, terão informações sobre o seu conteúdo. Nosso propósito é  reconhecer todos os direitos autorais.  Depois que assumimos o Instituto Chico Mendes, deixamos claro que todas as peças veiculadas no ICMBio devem ser identificadas, sendo seus autores profissionais amadores ou pessoal interno, que usa equipamento institucional, por entendermos que toda fotografia é uma criação pessoal.


FMA – Os profissionais da fotografia argumentam que toda atividade fotográfica é essencialmente artística e deve ser incentivada e não restringida.
Rômulo – Nós concordamos que fotografia é uma peça de arte.  Entretanto, nos casos em que esse trabalho é feito com a finalidade de geração de lucro por que não remunerar a fonte desse lucro? Afinal, há um custo de manutenção da biodiversidade e da beleza cênica, objeto da obra de arte. Além do custo mensal de servidores disponibilizados para fazer a gestão da UC, há custos de vigilância, de fiscalização, de logística para resguardar a área. Então, quando a fotografia ou a filmagem têm por objeto gerar lucros, não sendo meramente artística ou informativa, caracteriza o uso do meio ambiente, atividade que deve ser regulamentada e cobrada. Assim como existem as taxas sobre o uso do meio ambiente por diferentes empresas,  seja de turismo, para uso recreativo, uso de substâncias tóxicas, uso ou exploração de materiais potencialmente poluentes.  Ou seja, a fotografia para fins comerciais, que explora a imagem da UC, é  mais um tipo de uso do meio ambiente. 


“Quando a fotografia ou a
filmagem têm por objeto gerar
lucros, não sendo meramente
artística ou informativa,
caracteriza o uso do meio
ambiente, atividade que  deve ser regulamentada e cobrada”.


FMA – Outro argumento é que ne­nhuma UC tem personalidade jurídica própria para ter direito à proteção da imagem. Mais: a Instrução Normativa pretende criar a obrigação de doação da imagem fotográfica. Seria doação ou obrigação? Existe doação obrigatória?
Rômulo – Vamos ver a situação pelo lado do bom senso. Nossa  intenção é compor um acervo das unidades de conservação para uso  educativo e, claro,  reconhecendo os respectivos direitos autorais. A obrigatoriedade da doação implica também numa forma de compensação pela disponibilidade da imagem pelo fotógrafo, que teve acesso às dependências da UC.


FMA – Parece que existe uma ação de inconstitucionalidade contra a I.N. de 2002, movida pela ONG Grupo Ação Ecológica. Tem fundamento?
Rômulo – Não  temos conhecimento dessa ação.


FMA – O ICMbio foi idealizado para modernizar a gestão das UCs brasileiras. Esta modernização não passa por um maior diálogo com a sociedade civil, ou seja, com a classe de fotógrafos? Eles reclamam muito esta falta de diálogo.
Rômulo – Passa e para isso propo­nho que nos reunamos para discutir a I.N. de forma a que os fotógrafos e outros possam sugerir aprimoramentos.


FMA – O fotógrafo Zig Koch defende a tese de que a fotografia é instrumento de responsabilidade social e de conservação  ambiental. Deve ser uma atividade livre e incentivada. O que você acha?
Rômulo – Concordo com a tese.  Entretanto, acho que a atividade deve res­peitar os direitos individuais e, em especial, os coletivos.
As unidades de conservação são áreas especialmente protegidas, tendo em vista a diversidade bioló­gica que elas abrigam. Estas áreas são bens da sociedade, sob administração do Estado, por isso temos regras para permitir seu acesso e uso.


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MARCOS TERENA

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De filho pródigo à liderança internacional, o índio, piloto e cacique Marcos Terena, tornou-se um líder respeitado e o ponto de equilíbrio entre autoridades brancas e os povos indígenas.

O índio, piloto e cacique Marcos Terena é uma liderança respeitada internacionalmente e o ponto de equilíbrio autoridades brancas e os povos indígenas. Terena tem uma de luta, de diálogos e de fé.
Voltemos no tempo. Em 1990, o jornalista Zózimo Barroso do Amaral deu em sua coluna do Jornal do Brasil uma nota, com o título “Procura-se” dizendo que o líder indígena Marcos Terena acabara de ser demitido da Funai, onde era piloto – mesmo tendo entrado em avião só como passageiro e morrendo de medo.
Foi na resposta de Marcos Terena ao JB, que se conheceu o valor, a grandeza, a altivez e a dignidade de um índio. Escreveu ele ao JB:
“Sou um dos 240 mil índios brasileiros e um dos seus interlocutores junto ao homem branco. Quando ainda tinha nove anos, fui levado a conhecer o mundo. Era preciso ler, escrever e falar o português. Um dia a professora me pôs de castigo, não sabia por quê, mas obedeci. Fiquei de frente para o quadro negro, de costas para a sala. Quando meus colegas entraram, morreram de rir. Não sabia o motivo, mas sentia-se orgulhoso por fazê-los rir. Eles riam porque descobriram meu segredo: meu sapato não tinha sola, apenas um buraco, amarrado por arame. Naquele momento, sem querer, acabei descobrindo o segredo do homem civilizado: suas crianças não eram apenas crianças. Apenas uma palavra as separava das outras crianças: pobreza.” 
E Terena continua sua carta:
“Um dia me chamaram de “japonês”. Decidi adotar essa identidade. E fiz isso por 14 anos.” 
Foi passando por japonês que Marcos Terena conseguiu estudar, entrar para a FAB, aprender a pilotar. Veio para Brasília. Deixou de ser japonês para voltar a ser índio. Ai descobriu que era “tutelado”. Mais: como tinha estudo, começou a explicar a lei para seus companheiros de selva. “Expliquei – diz ele – e fui acorrentado. Pelos índios, como irmãos. Pela Funai, como subversivo da ordem e dos costumes”. Veio o drama: continuar sendo branco-japonês e exercer sua profissão de piloto, ou voltar a ser índio, mesmo sendo subversivo. Marcos Terena era o próprio filho pródigo. Sabia ler, escrever, analisar o mundo, entender outras línguas. Mas, como índio, recebeu um castigo dos tutores da Funai: não podia exercer sua profissão, pilotar. Só depois de muita luta, recebeu seu brevê do Ministério da Aeronáutica. A carta de Terena ao JB continua. É linda. Uma lição! Quando publicada, mereceu uma crônica especial da Acadêmica Rachel de Queiroz.
E Terena, ao concluir sua carta, lembrou ao jornalista: “Não guardo rancores pela nota. Foi mais uma oportunidade de fazer valer a nossa voz como índio. Gostaria apenas que o jornalista inteirasse dessas informações todas e soubesse de minha vontade em tê-lo como amigo”. 
Respeitado por índios e brancos, sulmatogrossense de Taunay, Marcos Terena, 66 anos, maior líder do Movimento Indigenista Brasileiro – é um exemplo. Seu nome, sua obra e sua luta se confundem com a própria natureza: rica, dadivosa, exuberante, amiga e fiel.
CINCO BRANCOS E CINCO ÍNDIOS DE VALOR
1 – CINCO HOMENS BRANCOS QUE SOUBERAM OU SABEM VALORIZAR A CULTURA INDIGENISTA?
TERENA – O Marechal Cândido Rondon, o antropólogo Darcy Ribeiro, o escritor Antônio Callado, o cantor Milton Nascimento e o sertanista Orlando Villas Boas.
2 – QUAIS OS CINCO ÍNDIOS MAIS IMPORTANTES NA HISTÓRIA BRASILEIRA?
TERENA – Cacique Cunhambebe, da Conferência dos Tamoios; Cacique Mário Juruna, dos Xavantes; Cacique Raoni, dos Txucarramãe, Cacique Quitéria Pankararue; e Cacique Marcolino Lili, dos Terena.
3 – A POLÍTICA É UMA ARMA PARA SE FAZER JUSTIÇA OU UM CAMINHO MAIS FÁCIL PARA ENCOBRIR INJUSTIÇAS?
TERENA – O poder legislativo é um pêndulo necessário entre os três poderes. Mas a única participação que tivemos foi do Deputado Mario Juruna, eleito pelo voto do RJ. O ideal seria assegurar algumas cadeiras no Senado e na Câmara aos diversos setores sociais, como uma verdadeira “assembleia do povo brasileiro” e não somente aos sindicatos organizados ou aos cartéis dos ricos e poderosos.
POPULAÇÃO INDÍGENA HOJE
4 – NAS SUAS CONTAS, QUAL A POPULAÇÃO INDÍGENA HOJE NO BRASIL?
TERENA –  Já fomos mais de 5 milhões, com 900 povos. Hoje estamos em fase de reorganização e crescimento já beirando os 530 mil em aldeias, e depois dos eventos nacionais e internacionais de afirmação outros 500 mil em centros urbanos, com mais de 300 sociedades e 200 línguas vivas em todo o Brasil.
5 – AS MISSÕES RELIGIOSAS QUE ATUAM NAS ÁREAS INDÍGENAS SÃO BOAS OU RUINS?
TERENA – As missões religiosas sempre foram a parte a abençoar os primeiros contatos com os indígenas. Elas foram criadas para gerenciar os mandamentos bíblicos e cristãos, mas no caso indígena cometeram um grande pecado. Consideraram os índios como pecadores e sem almas por não usarem roupas e não terem a mesma fé dos brancos. Isso foi ruim pois sempre respeitamos de forma sagrado o Grande Espírito.
6 – OS ÍNDIOS JÁ SERVIRAM COMO MARKETING PARA OS PORTUGUESES (MOTIVO DE FINANCIAMENTO DE NOVAS EXPEDIÇÕES, POIS O MUNDO CATÓLICO TINHA QUE SALVAR ALMAS) JÁ SERVIRAM COMO MARKETING PARA CANTORES DE ROCK, PARA ONGS, PARA CANDIDATOS E PARA GOVERNOS. ÍNDIO É UM BOM MARKETING?
TERENA – Índio é uma marca muito boa, porque índio é terra, é ecologia, é bem viver. Isso não foi usado só por artistas da mídia, mas por fabricantes de joias, de produtos de beleza, de comida e medicina alternativas. Geralmente isso não traz nenhum retorno para nossa causa, basta ver o descaso como a Funai é tratada dentro do Governo e, com ela, os índios.
7 – QUEM PENSA GRANDE E QUEM PENSA PEQUENO NA FUNAI?
TERENA – Os índios pensam de forma ampla porque pensam nas suas terras, nos seus ecossistemas como fonte para o futuro do país. Em compensação os últimos presidentes da Funai foram passivos, paternalistas e incompetentes para a promoção dos valores indígenas e da própria instituição como empoderamento étnico, institucional e fonte de respostas para o País e para o mundo.
SONHO: DEMARCAÇÃO E CÁTEDRA ÍNDÍGENA
8 – JURUNA FOI UM LÍDER ELEITO PELO HOMEM BRANCO. VALEU, PARA OS ÍNDIOS, ESSA EXPERIÊNCIA PARLAMENTAR?
TERENA – A lembrança de Mário Juruna é um marco na história dos Povos Indígenas. Como Cacique foi o maior dos últimos tempos, sendo respeitado pelas autoridades brasileiras por sua forma de ser, mas como Parlamentar não foi bem assim. Houve falta de assessoria suficientemente hábil, para sua reeleição por exemplo, para abrir portas para novos valores indígenas, até hoje…
9 – QUAL O GRANDE SONHO DA FAMÍLIA INDIGENISTA PARA O ANO 2020?
TERENA – A demarcação de todas as terras. Cumprir a Constituição e não rasgá-la como querem alguns parlamentares como a bancada ruralista; eleger o maior número de vereadores e prefeitos índios; criar uma Cátedra Indígena com um perfil de Universidade Intercultural, e transformar a Funai num Ministério do Índio, e inovar nas relações com os poderes públicos, nomeando indígenas para esses cargos, pois eles existem.
10 – RELIGIÃO: O HOMEM BRANCO NÃO RESOLVEU SEUS PROBLEMAS COM A RELIGIÃO QUE TEM, MAS ACHA QUE DEVE LEVAR SUA RELIGIÃO PARA OS ÍNDIOS. O QUE ACHA DISSO?
TERENA – Os índios creem em Deus, o grande Criador. Muitas aldeias já aderiram aos costumes cristãos, tendo inclusive pastores e sacerdotes indígenas, que rezam e cantam na língua nativa. Acho que acima de tudo, Deus tem um plano para os índios. Ajudar o homem branco a conhecer o verdadeiro Deus, que fez os céus, a terra e a água, onde estão as fontes de sabedoria, de respeito às crianças e aos velhos, e dos alimentos e medicamentos do futuro. Lamentamos muito que em nome da Paz e do seu Deus, o homem branco continue matando.
11 – O QUE O ÍNDIO ESPERA DA CIVILIZAÇÃO, DO HOMEM BRANCO DE HOJE?
TERENA – Na verdade, agora estamos mais especializados em assuntos do branco, percebemos uma grande carência de metas e ideais que não dependem apenas de dinheiro ou poder. A sociedade do novo Milênio se perdeu entre as novas tecnologias e está gerando uma sociedade sem velhos e jovens, onde a Mulher por ser Mulher, poderá ser o equilíbrio, a tábua de salvação dos valores sociais, interétnicos, econômicos e religiosos. Um governo que defende o armamento de sua sociedade não está a favor do bem estar de seu Povo e sim dos interesses das indústrias de armas e guerras. O índio brasileiro não aceita ser parte da pobreza, mas quer mostrar que podemos ajudar, contribuir, mas dentro de um respeito mútuo.
“POSSO SER O QUE VOCÊ É, SEM DEIXAR DE SER QUEM SOU!”
12 – SUA LUTA É PROVAR QUE A DIFERENÇA CULTURAL É FATOR DE DISCRIMINAÇÃO QUANDO DEVERIA SER FATOR DE UNIÃO PELA PLURALIDADE ÉTNICA. VOCÊ CONSEGUE PASSAR ESSA MENSAGEM?
TERENA – Eu tive oportunidade de nascer em uma pequena aldeia, de estudar sem qualquer apoio ou cotas, e mesmo com a discriminação poder chegar a fazer um curso de aviadores na FAB. Aprendi muito com os valores militares. Tenho uma profissão rara, que é pilotar aviões. Outros índios não tiveram essa oportunidade. Muitos cansados, desiludidos voltaram para suas Aldeias para formar um novo espírito de lideranças tradicionais, religiosas e políticas. Mas no novo Milênio é impossível aceitar quaisquer argumentos que nos isolem das oportunidades, por isso quando começamos o movimento indígena nos anos 80, buscamos aliados para trocas de ideias dos nossos valores e da sociedade como um todo, organizando os índios, debatendo com mestres da Antropologia, da CNBB, da OAB, da SBPC, envolvendo artistas e personalidades – tudo isso ajudou a sermos melhores compreendidos. Ajudou-nos a levar uma nova mensagem aos brasileiros: “Posso ser o que você é, sem deixar de ser quem sou!”
CULTURA FORTE, MAS ECONOMIA FORTE
13 – OS ÍNDIOS PARECIS SÃO HOJE GRANDE PRODUTORES RURAIS. FAZEM DUAS SAFRAS POR ANO DE SOJA, MILHO, GIRASSOL E OUTROS PRODUTOS. TRÊS MIL ÍNDIOS FAZEM MAIS DE R$ 50 MILHÕES COM O AGRONEGÓCIO. TEM ÍNDIO PILOTO DE COLHEITADEIRA, AGRÔNOMO E TEM ÍNDIO ESPECIALISTA EM MERCADO. FUNAI E IBAMA CRIAM TODAS AS DIFICULDADES BUROCRÁTICAS A ELES. O QUE VOCÊ ACHA DISSO?
TERENA – Temos que olhar com desconfiança tudo que é mágico. Se todos os agricultores fossem plantar soja para ficarem ricos, não haveria pobreza e fazendeiros endividados com bancos e credores. Teríamos condições de plantar soja, mas também seguir os princípios indígenas de gerar a segurança alimentar familiar. O Agronegócio não funciona assim. Por outro lado, os irmãos indígenas estão se empenhando em fazer a sua parte, que é demonstrar sua inteligência no manejo com a terra e sua força de trabalho. Ainda não sabemos como foram feitos os acordos financeiros das partes envolvidas.
14 – VOCÊ ACHA QUE O GOVERNO ESTÁ MEIO INDECISO?
TERENA – O Ministério da Agricultura do governo Bolsonaro tem demonstrado sua contradição interna. Alguns assessores de alto nível emitem sons de discriminação histórica e até de ódio. Então como acreditar fielmente que esse Ministério é um aliado. Seria um marketing ou seria a reformulação do Anhanguera quando mentiu para os antigos donos dessas terras, ao ameaçar por fogo em todos os rios, ao acender um fogo com aguardente? O mais estranho é que os órgãos de fiscalização e controle e defesa dos povos indígenas como a FUNAI e o IBAMA, estão sendo descontruídos como tais, mas felizmente isso não acontece com o Ministério Público Federal, que certamente dará um norte nos encaminhamentos futuro.
De toda forma, sempre defendo a livre determinação dos Povos Indígenas, a começar pela demarcação territorial, com cultura forte, mas economia forte também.
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Entrevistas

Fernando Henrique Cardoso – Entrevista sobre Meio Ambiente e Cidadania

Meio ambiente, desenvolvimento e cidadania, segundo o presidente FHC

Publicado

em

Fernando Henrique Cardoso (@FHC) | Twitter

Progresso sem meio ambiente é estéril

Para Fernando Henrique Cardoso, é facinante como o direito a um meio ambiente saudável passou a fazer parte do conceito de cidadania

Silvestre Gorgulho, de Brasília


O Presidente recebeu o jornalista Silvestre Gorgulho no Palácio do Planalto

” Cada vez mais, as pessoas se dão conta de que sem a adequada proteção ambiental, o próprio processo de desenvolvimento corre o risco de se tornar estéril.”

Em 1983, o professor Fernando Henrique Cardoso deixou cátedra e livros para assumir uma cadeira no Senado na vaga de Franco Montoro, eleito governador de São Paulo. Dois anos depois, o então senador Fernando Henrique viu fracassar seu primeiro grande teste eleitoral: em 85 perdeu a prefeitura de São Paulo para o ex-presidente Jânio Quadros. Mas, FHC não voltou para a sala de aula. Se recompôs e enfrentou o desafio político. Em 1986 deixou de lado muitas posições teóricas e, no rastro do sucesso do Plano Cruzado, conquistou uma cadeira no Senado. Aí iniciou uma trajetória política de vitórias. O intelectual de sucesso fora e dentro do Brasil deu lugar ao político de sucesso dentro e fora do Brasil. Caso raro! São vocações antagônicas, por isso é difícil alguém se adaptar à função de intelectual e político. Como o professor e escritor Fernando Henrique Cardoso conseguiu? Esse é um dos segredos que FHC vai contar aos leitores da Folha do Meio. Bem, os outros segredos são vários. Uns dizem respeito às derrotas, vitórias, avanços e marcha-rés sobre preservação da natureza e melhoria da qualidade de vida no Brasil. Outros são mais particulares. Por exemplo, por que em nenhum de seus 24 livros o professor e intelectual reconhecido internacionalmente tratou explicitamente da questão mais importante deste final de século: a relação do homem com o meio ambiente?

Folha do Meio – Presidente, nada mais global do que o meio ambiente…

FHCNão há como fazer uma fronteira política ou geográfica quando o assunto é ambiente. Não adianta um país aperfeiçoar suas leis ambientais, se os países vizinhos não fizerem o mesmo.

FMA – O meio ambiente pode mudar os acordos comerciais entre as nações?

FHCCada vez mais ganha terreno no cenário internacional a convicção de que os acordos comerciais entre as nações devem levar em conta a interação entre a formulação das políticas de desenvolvimento e o meio ambiente. Isso porque as preocupações ambientais afetam, potencialmente, as políticas de desenvolvimento e os fluxos comerciais globais. A incorporação da perspectiva do desenvolvimento sustentável permite a consideração conjunta do meio ambiente, da economia e do bem-estar humano nas questões comerciais. E isso constitui um degrau qualificativo nos debates regionais e internacionais. O meio ambiente está surgindo como um objetivo chave nessas relações, conceito compartilhado pelo Gatt, pelo Nafta e pelo Tratado de Maastricht, entre outros. O Brasil tem defendido a posição de que as iniciativas ambientais na área de comércio devem, contudo, constituir obstáculo adicionais aos fluxos de comércio dos países em desenvolvimento. Isso no sentido de que o combate à pobreza é o vetor essencial para o desenvolvimento sustentável.

FMA – E como o senhor vê a relação do Brasil com os outros países do Mercosul por ser a legislação brasileira ambientalmente mais avançada?
FHCTem um subgrupo de trabalho de Meio Ambiente do Mercosul estudando o problema. E tem buscado, a partir de realidades bastantes distintas, os ordenamentos legais nacionais para otimizar os níveis de qualidade ambiental nos países que integram o Mercosul. Nesse sentido, os princípios do desenvolvimento sustentável têm sido a base para todo o processo de cooperação entre os quatros países do bloco, influenciando as agendas negociadas e ajudando a superar as diferenças entre os países. Para ser eficiente, a política ambiental precisa tratar de questões que ultrapassam em muito o Ministério do Meio Ambiente. Expansão urbana, assentamentos fundiários, saúde, ciência e tecnologia, agricultura, energia e até relações exteriores têm ações na área ambiental.

FMA – O governo, isolando as ações no Ministério do Meio Ambiente, não está longe de fazer uma política ambiental pública preventiva? E com isso a questão ambiental não fica só na retórica?
FHC –
A formulação da Política Nacional do Meio Ambiente está a cargo do Conama. Ou seja, pelo Conama toda a sociedade participa da elaboração da política ambiental brasileira. E para ampliar ainda mais a Política Nacional de Meio Ambiente foi instituído o Sisnama. Daí temos a interação com todos os atores envolvidos nas questões mais diversas do interesse nacional. A política ambiental do governo é, portanto, objeto de um amplo processo que se caracteriza pelo diálogo, pela negociação e pela conciliação dos interesses em jogo. Levantamentos do INESC sobre a execução orçamentária nos primeiros cinco meses do ano indicam que os programas executados pelo Ministério do Meio Ambiente tiveram gastos efetivos de apenas 0,63% do total orçado. Programas como o Piloto de Proteção às Florestas Tropicais até agora não receberam um centavo.

FMA – O senhor não acha que o meio ambiente está pagando caro para garantir as metas de redução do déficit público?

FHCO PPG-7 já gastou este ano 13,4 milhões de dólares nos seus programas já aprovados. Um novo desenho deste programa foi aprovado recentemente, em Paris, trazendo para o governo brasileiro, por intermédio do Ministério do Meio Ambiente, a liderança do programa. O desembolso de recursos para os programas do PPG-7 deverá ser bastante agilizado nos próximos meses.

FMANo Congresso há uma preocupação com o que alguns parlamentares chamam de ameaça de desmonte do Ibama. As superintendências estaduais já foram extintas e está havendo muita nomeação política. Maior temor: afrouxamento na fiscalização. Faz sentido?

FHCCom a reestruturação aprovada agora em maio, o Ibama passou a ter uma nova estrutura que reforçou o seu papel de órgão responsável pela execução e fiscalização da política ambiental. A partir de agora, cabe ao Ibama executar as políticas nacionais de meio ambiente relativas à preservação, conservação, fiscalização e de controle do uso sustentável dos recursos ambientais. Além disso, o Ibama também apóia o ministério na execução da Política Nacional de Recursos Hídricos e desenvolve ações supletivas de competência da União na área ambiental. As mudanças feitas visavam, justamente, dar maior agilidade ao Ibama para cumprir seu novo papel. Vamos reforçar as atividades nas pontas, enxugando a estrutura central. No lugar das 27 superintendências extintas serão criados 90 escritórios de múltipla ação, com pelo menos uma unidade em cada estado. Também serão criadas oito coordenações regionais. Assim, as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste terão, cada uma, duas coordenações do Ibama. As regiões Sul e Sudeste uma cada.

“Um dos aspectos mais fascinantes é a maneira como o direito a um meio ambiente saudável passou a fazer parte do conceito, mesmo, de cidadania, transformando-se em elemento central do que tenho chamado de radicalização da democracia.”

FMA – Será mesmo criada a Agência Nacional de Água?
FHC Sim. A Agência Nacional de Água (ANA) será criada para tornar as ações no campo da gestão dos recursos hídricos mais ágeis. A ANA será uma autarquia especial dotada de uma estrutura flexível, com autonomia orçamentária e financeira. A criação da ANA, em estudo pelo Ministério do Meio Ambiente sob orientação da Casa Civil da Presidência, é também uma conseqüência das definições estabelecidas no contexto da reforma do aparelho do Estado. A futura agência vai atuar na implementação dos instrumentos da política de recursos hídricos, sucedendo a secretaria de Recursos Hídricos nesta tarefa. Na Secretaria permanecerão as funções de formulação da política para o setor.

FMA – Presidente, há alguma justificativa na demora de mais de um ano para a regulamentação de uma lei que marcou seu governo: a Lei da Natureza ou a Lei contra os Crimes Ambientais? O processo já passou por todas as instâncias e está há algum tempo no Gabinete Civil. O que falta para a regulamentação?

FHC – Primeiro, cumpre destacar que a Lei 9.605/98 já está sendo aplicada no que diz respeito às sanções penais, que não implicam em regulamentação. Por outro lado, as sanções administrativas pecuniárias estão pendentes desse instrumento, o que, no entanto, não invalida a sua aplicação. Há, inclusive, a possibilidade da remessa dos autos de infração ao Ministério Público para que, como Curador do Meio Ambiente, adote as providências no âmbito de suas competências. Mas há, efetivamente, demora na publicação do decreto de regulamentação. Entretanto, todas as sanções administrativas estavam dispersas em vários atos normativos, como por exemplo, portarias e instruções normativas e havia necessidade de que esses atos fossem consolidados e sistematizados, o que coube ao Ibama fazer. Essa proposta foi então encaminhada ao Ministério do Meio Ambiente para revisão final. Nesse momento, a proposta do Ibama, previamente consolidada, foi objeto de consulta pública, via Internet. Após as sugestões recebidas terem sido analisadas e incorporadas, a proposta final de decreto foi encaminhada à Casa Civil, que se manifestou contrária a proposta, quanto a forma. Não tendo, entretanto, apreciado o mérito. Com base nessa análise, a proposta foi devolvida ao Ministério do Meio Ambiente que, neste momento, está estudando e revendo a forma de apresentação. O empenho do governo é grande nesse sentido, para que a regulamentação esteja disponível no menor prazo possível e a lei possa alcançar sua eficácia plenamente.

FMA – Já se foram sete anos deste a realização da RIO-92, a chamada Cúpula da Terra, que discutiu meio ambiente e desenvolvimento. Como o senhor vê a demora de definição para discussões importantes sobre clima, biodiversidade, definição de recursos dos países desenvolvidos para financiar projetos ambientais em países em desenvolvimento?
FHCA RIO-92 deve ser entendida como um marco institucional que trouxe ao debate internacional, de forma integrada, todos os aspectos da ação humana sobre o planeta e o meio ambiente. A Cúpula da Terra definiu uma série de princípios e conceitos no plano internacional, dando ênfase à cooperação, que se traduzia em apoio financeiro, transferência de tecnologia e capacitação técnica, sobretudo para os países em desenvolvimento poderem fazer frente aos desafios ambientais em escala global. Evidentemente, as expectativas foram muito além das reais possibilidades de apoio material dos países desenvolvidos. Mas isso não quer dizer que deixaram de ser realizadas iniciativas relevantes. Na área de mudança do clima, por exemplo, estão sendo reforçados os compromissos dos países desenvolvidos. Não obstante, os resultados de Kioto são relevantes e constituem um passo adiante no processo, sobretudo com a aprovação da proposta brasileira do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. Na área da biodiversidade, apesar das dificuldades encontradas, caminha-se para definir espaços claros no que diz respeito à repartição justa e eqüitativa do uso dos recursos genéticos. Esse é um tema de especial importância para o Brasil, pois somos detentores de megabiodiversidade. A esse respeito está em exame no Congresso Nacional a lei de acesso a esses recursos. Na área de desertificação, a Convenção das Nações Unidas de Combate aos Efeitos da Desertificação e da Seca examinará em novembro deste ano, no Recife, o mecanismo financeiro de apoio ao pré-investimento de projetos de combate à desertificação e à seca. Por esses avanços, não se pode dizer que os efeitos derivados da Cúpula da Terra possam ser considerados negligenciáveis.

“A correta atuação política
consiste em recolher as demandas
da sociedade, ordená-las,
definir prioridades e estabelecer rumos de ação.”

FMA – Presidente, a questão ambiental surgiu de maneira explosiva há três décadas. Foi a partir de maio de 68 (o senhor estava no coração das manifestações estudantis, em Paris) que a percepção dos efeitos globais dos grandes desmatamentos, do emprego na energia nuclear, da queima de combustíveis, da formação dos grandes centros urbanos começou a motivar a comunidade científica, os intelectuais e a opinião pública para o problema. Nos seus 24 livros o senhor trata de tudo na relação homem, industrialização, desenvolvimento, democratização, capitalismo, mobilidade social, dominação e dependência. O senhor achava que meio ambiente estava fora da agenda do século?
FHC
Teria sido muita pretensão de minha parte buscar analisar na íntegra a “agenda do século”. Meus escritos acadêmicos, embora abarcando temas complexos como os que você mencionou, têm objetivo menos ambiciosos. Isso não quer dizer, em absoluto, que o meio ambiente não fizesse parte de minhas preocupações. A partir, sobretudo, da Conferência de Estocolmo, em 1972, o assunto realmente entra na agenda internacional, e não poderia ser desconsiderado por qualquer observador atento da evolução das sociedades contemporâneas. Nesse processo, em que os temas ambientais foram adquirindo cada vez mais importância e merecendo maior atenção dos diferentes setores da sociedade, um dos aspectos mais fascinantes é a maneira como o direito a um meio ambiente saudável passou a fazer parte do conceito, mesmo, de cidadania, transformando-se em elemento central do que tenho chamado de “radicalização” da democracia.

FMA – Presidente, é impressionante como o senhor soube se adaptar na função de intelectual e político. Essa dupla vocação raramente andam juntas. Existe algum segredo?
FHC
A dimensão acadêmica é parte essencial de minha formação. Tem, portanto, enorme influência sobre minha atuação como homem público. Haveria muito a dizer sobre a relação entre intelectual e político – muito além da distinção elementar entre teoria e prática, entre conceito e vivência – mas me limitaria a uma questão que considero muito importante. De forma simplificada, pode-se dizer que a correta atuação política consiste em recolher as demandas da sociedade, ordená-las, definir prioridades e estabelecer rumos de ação. Em boa medida, a formação intelectual, embora não se substitua à experiência política, complementa esta última e contribui para uma melhor compreensão daquele leque de demandas, entre as quais se inclui, crescentemente, a proteção ao meio ambiente.

FMA – Nas suas viagens ao exterior, em relação ao meio ambiente, quais as principais observações que o senhor escuta de outros chefes de estado. A Amazônia ainda domina as discussões sobre ecologia no Brasil?
FHC
O tema, sem dúvida, perdeu muito do aspecto de confrontação que teve há alguns anos. Os esforços realizados pelo governo para o desenvolvimento sustentável da região amazônica são reconhecidos internacionalmente, o que torna o diálogo sobre o assunto muito mais fluído e construtivo. Nunca nada me foi dito em termos de cobrança. Ao contrário. A preocupação internacional existe, e é legítima, mas hoje em dia as discussões versam muito mais sobre as formas efetivas de cooperação. A questão das florestas é importante, mas naturalmente é apenas um dos aspectos da ampla agenda internacional sobre meio ambiente.

FMA – Presidente, acaba de ser criada a CPI da Borracha. Qual a solução que o senhor vê para a sobrevivência do seringueiro na Amazônia?
FHC
As populações envolvidas com a atividade extrativista na Amazônia já estão na floresta há muitas gerações. Portanto, trata-se de uma população adaptada ao ecossistema tropical. O governo dará todo o apoio ao setor por meio do programa Amazônia Solidária. Estou empenhado em viabilizar recursos solicitados pelo Ministério do Meio Ambiente para o programa, porque são de alta relevância para a região.

FMA – A questão ambiental envolve respeito à natureza. Mas como levar essa idéia às pessoas que, infelizmente, não respeitam nem seus semelhantes? Será que a sociologia pode explicar esse paradoxo?
FHC
Como disse antes, o direito a um ambiente saudável é, hoje, parte da noção mais ampla de cidadania. Cada vez mais, as pessoas se dão conta de que sem a adequada proteção ambiental, o próprio processo de desenvolvimento corre o risco de se tornar estéril. Há uma grande sabedoria por trás do conceito de “desenvolvimento sustentável”, e isso torna-se mais e mais evidente para todos, tanto no governo quanto na sociedade civil. No que se refere à ação individual – seja em relação ao meio ambiente, seja em relação a outros aspectos importantes da convivência social – o poder público tem, certamente sua responsabilidade na tarefa da conscientização de todos, mas parcela importante desse esforço cabe também às ONGs. A questão ambiental é uma das que mais se prestam ao desenvolvimento de parcerias eficazes entre o governo e a sociedade. É isso que estamos fazendo no Brasil.

FMA – Uma mensagem pelo Dia Mundial do Meio Ambiente.
FHC –
No Dia Mundial do Meio Ambiente devemos ter um momento de reflexão sobre o mundo que vivemos. Um mundo cujos recursos naturais são limitados. Temos compromisso com o futuro. Por isso determinei que o Ministério do Meio Ambiente se empenhe em oferecer alternativas capazes de impulsionar o crescimento econômico, gerar trabalho e, sobretudo, garantir uma melhor qualidade de vida, mantendo e recuperando as nossas riquezas naturais. Queremos, ainda, a participação de todos na formação de uma nova cultura ambiental diferente. Um futuro em que o meio ambiente promova o desenvolvimento sustentável, que assegure um mundo melhor para as atuais e futuras gerações.

GLOSSÁRIO

GATT – É o Acordo Geral de Comércio e Tarifas – Agência pertencente ao sistema da ONU, com sede em Genebra, que promove o livre comércio, organizando normas comuns e eliminando protecionismos. É também uma tribuna para solução de conflitos comerciais entre 123 países associados.NAFTA – É o Acordo de Livre Comércio da América do Norte, um bloco que engloba EUA, Canadá e México.

TRATADO DE MAASTRICHT – Acordo assinado em 1991, em Maastricht, Holanda, que acelerou o processo de integração econômica e monetária européia. O tratado previu um mercado interno único, com moeda própria – o Euro – e estabeleceu políticas comuns aos países que fazem parte da União Européia.

CONAMA – É o Conselho Nacional do Meio Ambiente, instância colegiada presidida pelo ministro do Meio Ambiente e integrado por representantes dos demais ministérios setoriais, governos dos estados e do DF e das Confederações da Indústria, do Comércio e da Agricultura. Tem poder normativo e poder de solução de conflitos.

SISNAMA – É o Sistema Nacional do Meio Ambiente, é composto por órgãos e entidades da União, dos estados, do DF, dos municípios e pelas fundações instituídas pelo poder público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, tendo como órgão superior o Conama.

LEI 9.605/98 – É a chamada Lei da Natureza ou Lei Contra os Crimes Ambientais, de 12 de fevereiro de 1989. É a lei que define sanções e punições nas áreas criminais, administrativas e reparação de danos para os crimes ambientais.

PPG-7 – É um Programa Piloto de Proteção à Florestas Tropicais, financiado pelos sete países mais industrializados – Alemanha, Canadá, EUA, França, Itália, Japão e Reino Unido. Mais de 60% dos recursos são de origem alemã.

MEGABIODIVERSIDADE – Biodiversidade é a variedade de gens, espécies e ecossistemas que fazem parte da biosfera. É a riqueza biológica do planeta. Megabiodiversidade é uma expressão que vem sendo usada para identificar regiões do planeta com alta diversidade biológica.

DESERTIFICAÇÃO – É a transformação de solos férteis em desertos. A ação do homem, como o desmatamento e a agropecuária podem levar à degradação do solo e ao agravamento das secas – princípio mortal da desertificação.

CIDADANIA – É o conjunto amplo de direitos e deveres civis, políticos, sociais, econômicos, ambientais e culturais dos habitantes de um Estado. Designa o fato de um indivíduo gozar dos direitos de um Estado, cumprindo também seus deveres para com este. Não importa qual a função que este indivíduo exerça na sociedade.

KIOTO – Refere-se à Conferência de Kioto, realizada em dezembro de 1997, quando foi assinado um protocolo de mudança climática, que definiu compromissos de redução de gases poluentes dos países desenvolvidos, estabelecendo mecanismos flexíveis de cooperação entre os países, para cumprir metas no sentido de diminuir o efeito estufa.

CÚPULA DA TERRA – É a representação política dos países associados à ONU. A expressão foi usada pela primeira vez por ocasião da RIO-92, quando se reuniu, então, a Cúpula da Terra, ou seja, os 114 chefes de Estado e 175 países representados na Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento.

CONFERÊNCIA DE ESTOCOLMO – Foi a primeira Conferência Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, promovida pela ONU, realizada em junho de 1972. Reuniu 110 países. Foi o primeiro grande movimento oficial, respaldado pela Assembléia Geral das Nações Unidas, que mostrou a necessidade urgente de conciliar meio ambiente com o desenvolvimento, mostrando a nossa responsabilidade com relação às futuras gerações.

RIO-92 – Foi a 2a Conferência Mundial para Meio Ambiente e Desenvolvimento, promovida pela ONU e realizada no Rio de Janeiro, que teve início em 3 de junho de 1992. Foi a maior reunião planetária, pois 175 países se comprometeram com a causa ambiental. Participaram dela 114 chefes de Estado, representantes de praticamente todos os países da Terra, 10 mil jornalistas e mais de 500 mil pessoas representantes de ONGs e etnias diversas.

AMAZÔNIA SOLIDÁRIA – É um programa que tem por objetivo promover à ascensão econômica e social dos seringueiros da Amazônia. Além de vários organismos do governo, atuam nesta parceria o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), o Conselho Nacional de Seringueiros, o Gabinete da senadora Marina Silva (PT/AC) e o Programa Comunidade Solidária, presidido pela Primeira-Dama, professora Ruth Cardoso.

SUMMARY

Environment, Development and Citizenship
According to the President of the Republic

In 1983, the teacher Fernando Henrique Cardoso left behind his books and ivory tower when he accepted the post of senator filling the vacancy left by Franco Montoro, who had been elected governor of São Paulo. Two years later Senator Fernando Henrique experienced the failure of his first real political test, losing the 1983 race for mayor of São Paulo to the ex-president Jânio Quadros. But FHC did not retreat to the classroom. He regathered his forces to take on the political challenge. In 1986 he set aside many theoretical positions, and in the wake of the success of the PIano Cruzado, he gained a seat in the Senate. Thus began a rising trajectory of political victories. The intellectual, successful both in and outside of Brazil, was replaced by the politician, successful both in and outside of Brazil. A rare bird! These are usually mutually exclusive vocations, so it is unusual to find someone so well adapted to both roles of intellect and politician. How has Fernando Henrique Cardoso, writer and professor, achieved this? This is one of the secrets which FHC shares with the readers of the Folha do Meio. Well, there are many other secrets. Some speak of the defeats, victories, advances and retreats in the struggle to preserve nature and improve the quality of life in Brazil. Other secrets are more personal. For example, why none of the intellect professor’s 24 internationally recognized books deals explicitly with the most important question at the end of this century: the relationship between man and his environment.

FMA – Mr. President, there is nothing more global than the environment.

FHC – It is impossible to mark political or even geographic boundaries when the subject is the environment. It does no good for me to take care of my own back yard if my neighbor does not care for his. It does no good for one country to perfect its environmental laws if its neighboring countries do not do the same.

FMA – Is it possible that the environment could affect the international commercial agreements?

FHC –  The conviction that commercial agreements among nations must take into account the interaction between the formulation of development policies and the environment is constantly gaining ground on the international scene. This is because these concerns over the environment have the potential to impact upon the policies of development and the flow of global commerce. The inclusion of the perspectives of sustainable development allows the joint consideration of the environment, the economy and human welfare in commercial affairs. And this constitutes a qualitative step up in regional and international debates. The environment is emerging as a key element in these relationships, as recognized by Gatt, by Nafta, and by the Treaty of Maastricht, among others. Brazil has defended the position, however, that environmental initiatives in the area of commerce should not be allowed to create additional obstacles to the flow of commerce in the developing countries. This in the sense that combating poverty is the essential vector towards sustainable development.

FMA – And how do you see the relationship of Brazil with the other countries of Mercosul since its environmental legislation is more advanced?

FHC: Mercosul has an environmental task force studying the problem. It has been seeking, within the quite different realities and with reference to the nations’ legal structures, to optimize the levels of environmental quality in the countries that comprise Mercosul. In this sense, the principles of sustainable development have been the basis for the entire process of cooperation among the four countries of the block, bearing upon the negotiating agendas and helping to overcome differences between the countries.

FMA – It has been 7 years since RIO-92, the so- called “Earth Summit”, was held to discuss the world’s environment and development. How do you interpret the delays in concluding the important discussions on global climate, biodiversity, and the allocation of resources from the developed countries to finance environmental projects in developing countries?

FHC: RIO-92 should be understood as an important institutional milestone, bringing in an integrated fashion all aspects of human action upon the planet’s environment to the forefront of international discussion. The Earth Summit defined a series of principles and concepts of international scope, emphasizing cooperation, which can be translated as financial support, the transfer of technologies and technical training, especially so that the developing countries can confront the environmental challenges of a global nature. Evidently, expectations were raised far beyond the realistic possibilities for material support from the developed countries. But this is not to say that relevant initiatives have not been undertaken. In the area of global climate change, for example, the commitments made by the developed countries are being reinforced. Nevertheless. the results of the Kyoto Conference art: relevant as a step forward in this process, especially with the approval of the Brazilian proposal for the Mechanism for Clean Development. In the area of biodiversity, in spite of difficulties along the way, we’ve come a long way toward defining clear areas for the ,sake of a just and equitable division in the use of genetic resources. This is an especially important topic for Brazil, for we arc the custodians of a mega biodiversity. In this regard, a law concerning access to these resources is under study in the National Congress. In the area of desertification, the United Nations Convention on Combating the Effects of Desertification and Drought will examine, this November in Recife, the financial mechanisms for giving pre-investment support to projects for combating desertification and drought. With all these advances, it cannot be said that the lasting effects of the Earth Summit have been negligible.

FMA – Mr. President, the environmental question seemed to explode on the scene some three decades ago. It was in May of 1968 (you your-self were at the heart of the student demonstrations, in Paris) that awareness of the global effects of large-scale deforestation, the use of nuclear energy, the burning of fossil fuels, and the formation of large urban centers gained the attention of the scientific community, intellectuals and public opinion. In your 24 books you dealt with every aspect of Man- industrialization, development, democratization, capital- ism, social mobility, dominance and dependence. Do you think that the environment has been left out of the agenda of the Twentieth Century?

FHC: It would be quite pretentious of- me to attempt a complete analysis of the “agenda of the century”‘. My academic writings, though encompasing complex topics such as you have mentioned, had a more modest aim. This is not to ,say, in the least. that the environment has not been one of my concerns. Indeed. ever Since the Stockholm Conference in 1972, tile subject really emerged on the international agenda. and the issue can no longer be dismissed by any attentive observer of the evolution of contemporary societies. In this process, in which environmental themes are taking on greater and greater importance and demanding greater and greater attention from the various sectors of society, one of the most fascinating aspects is the degree to which the right to a healthy environment has become an integral part of the concept of citizenship, becoming thereby a central element of what has been called the “radicalization” of democracy.

FMA – Mr. President, it is impressive how you have been able to adapt to the dual roles of intellectual and politician. These two vocations rarely co-exist. What is your secret?

FHC: The academic dimension was an essential part of my formation. It therefore has an enormous influence on my actions as a public figure. There is much to be said about the relation between the intellectual and the politician- -even more than the basic distinction between theory and practice, between conceptual and the day-to-day realities- but I will limit myself to one question I consider to be very important. To put it simply, it could be said that the correct approach to policy consists of collecting and analyzing society’s demands, then defining priorities and establishing lines of action. To a large measure, an intellectual training, although no substitute for political experience, complements it and contributes to a better comprehension of this array of social demands, among which is included, more and more, the protection of the environment.

 

 

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Entrevistas

José Carlos Pinheiro Neto – Entrevista sobre o carro e o meio ambiente

Presidente da Anfavea fala sobre a sustentabilidade da indústria automobilística

Publicado

em

 

A indústria, o automóvel e o meio ambiente

José Carlos Pinheiro Neto, vice-presidente da GM e presidente da Anfavea

Silvestre Gorgulho, de Brasília

 

Presidente da Anfavea mostra como as fábricas vão se tornando mais limpas e fala do desafio de continuar fazendo carros que gastem menos energia e sejam menos poluentes:

“Não há problemas tecnológicos com o carro a álcool. O problema é mercadológico. O consumidor brasileiro não reconquistou
a confiança na disponibilidade do álcool
na bomba de combustível”

Veículos com mais de 10 anos respondem por 77% das emissões de poluentes e por 60% dos acidentes com vítimas Há um mês a General Motors inaugurou sua mais nova planta industrial do mundo, em Gravatai-RS, para produção do carro compacto Celta, que acaba de chegar ao mercado. O próprio presidente da República e os centenas de convidados que visitaram a indústria puderam conhecer um complexo automotivo ecologicamente correto, desde sua implantação até sua gestão diária, seguindo as normas ambientais. Como? Minimizando os impactos ambientais, evitando perdas de energia, reduzindo desperdício, coletando os efluentes e dejetos tóxicos, promovendo um saneamento adequado e valorizando a área verde, com a construção até de uma estação ecológica onde foi construída uma escola para educação ambiental. Afinal de contas, é essa a receita para o desenvolvimento sustentável e não foi por outro motivo que, depois da inauguração, o presidente Fernando Henrique lembrou uma frase que disse numa entrevista à Folha do Meio: “Sem a adequada proteção ambiental, o próprio processo de desenvolvimento corre o risco de se tornar estéril”.Enfim, se as indústrias automotivas estão rezando na cartilha da gestão ambiental, o desafio agora é outro. E muito maior: tornar os automóveis menos poluentes, gastando menos energia. O fato é que os maiores danos ao ambiente ocorrem durante o tempo em que o veículo roda, pois durante sua vida útil, um carro gasta 70% de toda a energia e emite 80% de toda poluição envolvidos no processo, desde a fabricação. Mas, enquanto as indústrias pesquisam formas de gastarem menos energia e de seus produtos emitirem menos poluentes, o Brasil sequer regulamentou a lei de inspeção veicular para obrigar a regulagem dos escapamentos. Mais: engavetou a proposta de renovação de frota. É bom lembrar que metade dos 20 milhões de veículos que rodam hoje no Brasil tem mais de 10 anos e – incrível – respondem por mais de 77% das emissões de poluentes na atmosfera. Outro dado assustador: segundo a Anfavea, 60% dos acidentes com vítimas são provocados por veículos com mais de 10 anos.
Para falar como as novas fábricas estão “limpas” , como os carros enfrentam o desafio da poluição e até de renovação de frota, ninguém melhor do que o presidente da Anfavea e vice-presidente da GM, José Carlos Pinheiro Neto.

Uma grande empresa, uma grande planta industrial e um Estado muito politizado ambientalmente. Como foram os antecedentes e as primeiras articulações para a implementação do projeto?
José Carlos P. Neto –
Foi simples, mas não foi fácil. A GM seguiu todo o procedimento legislativo em vigor para a aprovação dos projetos industriais pelos órgãos ambientais. Submetemos às autoridades gaúchas o estudo de impacto ambiental e houve, inclusive, audiência pública para a formulação de perguntas por parte da sociedade. A GM cumpriu todos os quesitos exigidos pela legislação ambiental municipal, estadual e federal.

O que mais chamou a atenção dos executivos da GM quando das conversações e acertos com os órgãos ambientais e com os próprios ambientalistas?
José Carlos –
Não tivemos nenhuma situação inusitada e nem mantivemos contatos diretamente com ambientalistas, ONGs ou entidades privadas. Se houve contato com representantes do setor não-governamental, ele ocorreu anonimamente, no âmbito da audiência pública.

Em relação as muitas outras plantas industriais da GM no mundo inteiro, qual o grande diferencial da nova fábrica de Gravataí?
José Carlos –
O grande diferencial é o processo fabril. Contrariamente às plantas tradicionais, em Gravataí a GM monta subsistemas completos, que são alimentados por um seleto grupo de fornecedores chamados “sistemistas”. No complexo automotivo existem 17 sistemistas.

Meio ambiente caminha numa pista dupla: educação e tecnologia. Como, quando e onde os “pilotos” do board da GM encaram esse desafio?
José Carlos –
A GM tem políticas ambientais internas há mais de 40 anos. É uma empresa ambientalmente consciente, que zela por estar sempre em situação politicamente correta quando o assunto é o que modernamente é conhecido pelo nome de Responsabilidade Social Corporativa. A GM investe centenas de milhões de dólares a cada ano no desenvolvimento de tecnologia ambientalmente mais favorável. Foi o caso, por exemplo, de veículos elétricos, e atualmente, da tecnologia das células de combustível. Ainda para citar a planta de Gravataí, gostaria de salientar que a GM reservou 25% da área do Complexo Automotivo à preservação ambiental. Foi realizado um trabalho ambiental muito importante e operacionalmente complicado: transplantamos mais de 400 árvores da área que foi nivelada para abrigar os prédios industriais para a área de preservação. Foram principalmente figueiras – que são protegidas por lei no Rio Grande – algumas com até 49 ton. de peso. Essa área é uma estação ecológica que recebeu, ainda, mais 25 mil novas plantas e onde foi construída uma escola para educação ambiental.

A GM mostrou que gestão ambiental é quando a preservação do ambiente faz parte do negócio. Como a nova indústria administra a questão dos efluentes?
José Carlos –
Esse é um assunto essencial, hoje, numa planta industrial. Todos efluentes, produtos químicos, pintura, como aliás todos os dejetos, sobras, refugos gerados no processo fabril, são processados de acordo com a mais moderna tecnologia existente no mundo.

Qual a principal lição ambiental que a GM tirou depois da implantação da nova indústria automotiva de Gravataí?
José Carlos –
Não diria que é propriamente uma lição, mas a confirmação de que é possível ter plantas industriais moderníssimas em perfeita harmonia com o meio ambiente e com a expectativas da sociedade quanto à qualidade de vida.

Vamos falar agora de renovação da frota que também tem seu lado ambiental e de qualidade de vida, afinal de contas carro mais novo significa mais segurança e menos dióxido de carbono no ar. Como anda o programa?
José Carlos –
É de lamentar que o programa de Renovação da Frota Nacional de Veículos Automotores, concebido pela Anfavea, encampado por outras associações de classe e pelas organizações sindicais, não tenha sido apoiado pelo governo federal. Esse programa tem um evidente apelo ambiental, à medida que vai retirar de circulação veículos inseguros e poluidores, que seriam, ainda, destinados a modernos centros de reciclagem. Metade da frota em circulação, mais ou menos 10 milhões de veículos, têm os maiores índices de emissão média de monóxido de carbono, devido suas condições tecnológicas. E a própria reciclagem de materiais e componentes dos veículos seria uma importante ajuda para diminuir a poluição. Além de contribuir para dar uma dimensão de escala econômica à atividade da reciclagem.

Combustíveis limpos – esse é o grande desafio ambiental para a indústria automobilística. Como estão os projetos para carros elétricos e para maior agressividade na fabricação de carros a álcool?
José Carlos –
A GM foi a primeira montadora do mundo a produzir um veículo elétrico em série. É o EV1, movido a baterias ácido-chumbo. Atualmente, a tecnologia mais promissora é a da célula a combustível e todos os grandes fabricantes desenvolvem projetos de pesquisa nessa linha, inclusive a GM. Quanto ao álcool… bem, vamos repetir pela enésima vez a história que temos a contar. Em primeiro lugar, não há problemas tecnológicos para o relançamento do carro a álcool. O problema é unicamente mercadológico, porque até hoje o consumidor brasileiro não reconquistou a confiança na disponibilidade do álcool na bomba de combustível. Aliás, há poucas semanas vimos como isso funciona no Brasil. A safra de cana sofreu uma queda de 20% e o combustível ameaçou faltar. Qual foi a solução? O mix do álcool na gasolina baixou para 20%. Não questiono a decisão tomada pelo governo. O problema é a percepção do consumidor, que vê o álcool como combustível “não confiável”. Infelizmente, para a ecologia nacional, não vejo os consumidores fazendo fila para comprar carros a álcool…

Mas, e o carro?
José Carlos –
Bem, como eu disse, não há problemas tecnológicos para produzi-lo. Tanto que a partir de junho deste ano disponibilizamos os Corsa Wind e Wind Sedan 1.0 movidos a álcool. As vendas ainda estão tímidas, mas acredito que deslanchem uma vez que o consumidor se conscientize das vantagens do álcool ao se tratar de motores modernos, de injeção eletrônica. Dentre as vantagens, estão o desempenho superior e o menor custo por km em relação a um motor similar a gasolina. Além do lado ambiental: o álcool não polui e é um combustível renovável, ao contrário dos derivados de petróleo.
Célula de combustível – É um gerador de energia elétrica baseado na reação química de um combustível líquido ou gasoso com o oxigênio. Essa energia irá alimentar um motor elétrico para propulsionar o veículo. As pesquisas estão apontando o hidrogênio como o combustível ideal para a célula. Essas células foram utilizadas pela NASA, a partir de 1965, para produzir a energia elétrica para os sistemas de comunicação e computadores das cápsulas Gemini.

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