Entrevistas
JOSÉ CALDAS Entrevista
Fotografia & Natureza & Arte & Burocracia
A polêmica continua: fotógrafos de natureza
não abrem mão de seus direitos
Silvestre Gorgulho
O exercício da fotografia em inúmeros parques brasileiros tem sido dificultado e até proibido. O presidente do Instituto Chico Mendes, Rômulo Mello, em entrevista na edição de agosto da Folha do Meio foi claro: há necessidade de alguns ajustes será realizado um fórum para discutir com os fotógrafos o aperfeiçoamento da Instrução Normativa. Mas foi categórico: “Quando a fotografia ou a filmagem têm por objeto gerar lucros, não sendo meramente artística ou informativa, caracteriza o uso do meio ambiente, atividade que deve ser regulamentada e cobrada”. Nesta edição, uma entrevista com o primeiro presidente da Associação dos Fotógrafos de Natureza – AFNatura, José Caldas.
Vista do Alto do Couto, lá ao fundo podem-se ver as Agulhas Negras na última luz do dia no Parque Nacional do Itatiaia-RJ, na Serra da Mantiqueira.
Fotos: José Caldas
Típico ”serrote”, uma formação rochosa marcante na paisagem da Serra do Cipó, feita no Alto do Mirante da Estação Meteorológica em Santana do Riacho-MG no entorno do Parque Nacional da Serra do Cipó.
Sagui-da-cara-branca (Callithrix geoffroyi) na Mata Atlântica de SantaTeresa-ES
JOSÉ CALDAS – ENTREVISTA
Para o fotógrafo José Caldas, a profissão está em cheque. O Brasil é um país de dimensões continentais e com uma riquíssima, mas frágil biodiversidade. “Esta diversidade é o ponto de equilíbrio para a sobrevivência do planeta e a atividade fotográfica é importante na educação, preservação e conscientização das pessoas”. Caldas afirma que o ICMBio se apressa para aprovar uma resolução normativa que restringe e cria mecanismo de monitoramento da fotografia nos ambientes sob sua administração. A Instrução Normativa do ICMBio é polêmica. E a polêmica provocou uma mobilização inédita entre fotógrafos que se apressaram em criar uma entidade em defesa de sua atividade: a Associação dos Fotógrafos de Natureza – AFNatura. “Temos que garantir que o registro de imagens em ambientes naturais públicos não sofra restrições. O fotógrafo de natureza tem papel vital na defesa e divulgação do meio ambiente, e qualquer tentativa de controle sobre ele deve ser impedida, sob pena de termos num futuro breve uma censura direta sobre a liberdade de registrar o que de bom e de ruim ocorre no ambiente natural brasileiro”, garantiu o presidente da AFNatura, José Caldas.
Folha do Meio – A fotografia educa e ajuda preservar. Para a AFNatura, qual o interesse do ICMBio em restringir a ação de fotógrafos nas Unidades de Conservação?
José Caldas – Acreditamos que essa posição decorra de uma deturpação na interpretação do papel do fotógrafo e da própria esfera de atuação do órgão público em relação ao patrimônio que é de todos. Atualmente, mesmo com a nova regulamentação ainda em processo de tramitação, o exercício da fotografia em inúmeros parques tem sido dificultado e até proibido. Inclusive em áreas de livre acesso ao público. Confundir regramento de conduta com restrição de prática, nesse caso, é extremamente prejudicial para o próprio manejo sustentável do ambiente natural.
FMA – Entre as razões do ICMBio para justificar a resolução está a de que fotógrafos profissionais usam o meio ambiente, um bem público, e podem ter lucros com a atividade.
José Caldas – É preciso compreender o conceito de uso, considerando que se trata de registro de imagem de ambiente natural público. A Unidade de Conservação não é fonte de lucro para o fotógrafo, como o ICMBio quer fazer acreditar. No caso do fotógrafo profissional, a fonte do lucro é o seu trabalho, o seu esforço, a fotografia. Bens naturais são objeto da obra de arte do fotógrafo, mas biodiversidade e beleza cênica não geram lucros por si. Fazer a manutenção da biodiversidade e do cenário natural é obrigação do ICMBio, cumprida com o pagamento de ingressos nas unidades de conservação e nossos impostos.
FMA – Como você vê a questão da licença especial e da doação das imagens para o acervo do ICMBio?
José Caldas – A lei dos direitos autorais é clara, em seu artigo 22, ao definir que os direitos morais e patrimoniais sobre a obra pertencem ao seu criador. E, ainda, que conservar a obra é um direito moral do autor. Portanto, não cabe ao ICMBio exigir qualquer contrapartida ou exigência de cessão de uma obra protegida por direito autoral. Exigir ‘‘obrigatoriedade de doação’’ ou controlar o uso que daremos a nossa fotografia é um absurdo que o ICMBio não deve defender.
FMA – Mas, caso queira, o fotógrafo pode ceder imagens …
José Caldas – Claro! Como autor ele pode fazer o que achar conveniente com o produto de seu trabalho. Mas uma coisa é ceder por espírito de parceria e reconhecimento, como eu e muitos outros fotógrafos fazemos muitas vezes. Outra coisa é alguém impor a doação – aí vira confisco. Com isso não se pode concordar.
FMA – A AFNatura considera que a norma proposta é autoritária?
José Caldas – Da forma como está sim, sem dúvida. Os fotógrafos de natureza são responsáveis por registros históricos importantes, têm uma contribuição enorme para a divulgação das belezas naturais do País, para o desenvolvimento do turismo, da educação e da cultura. Fotografias são documentos, instrumentos poderosos que divulgam e protegem nossas riquezas naturais. Ao impor regras e restrições a essa atuação, o ICMBio age autoritariamente, cria barreiras para o livre exercício da fotografia e estabelece um filtro inadmissível à frente de nossas objetivas, que é o da coerção. Fotografia precisa continuar a ser um aliado na defesa do ambiente natural, parceira na construção da consciência ambiental deste País, e não ser considerada uma fonte de custeio para o ICMBio.
QUEM É JOSÉ CALDAS
Premiado internacionalmente, José Caldas – especializado em fotografia de natureza e documentação geográfica – é autor de vários livros que mostram a riqueza, as belezas e também as mazelas ambientais de todos ecossistemas brasileiros, especialmente do rio São Francisco, da Mata Atlântica, de Parque Nacionais como o da Serra do Cipó e da Serra dos Órgãos. Sergipano, com 45 anos, José Caldas tem trabalhos publicados em revistas e jornais do mundo inteiro. Hoje, presidente da AFNatura, José Caldas defende uma tese que já foi levada ao próprio ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc: liberdade para os fotógrafos de natureza trabalharem nas unidades de conservação.
LIVROS PUBLICADOS
O Baixo São Francisco, 1994, Editora Desenho.
Parque Nacional da Serra da Canastra,
1998, Paper Mill Editora.
Mata Atlântica –
Coração Verde do Brasil, 2001,
Paper Mill Editora.
Oparapitinga – Rio São Francisco, 2002,
Editora Casa da Palavra
Serra da Mantiqueira, 2003,
Zona internet Editora.
Serra do Cipó, 2006, Dois Editora
Serra dos Órgãos, 2007, Dois Editora
40 Peixes do Brasil, 2007 Dois Editora
Japoneses no Vale do aço, 2008, Ed.Olhares
TÍTULOS EM QUE TEVE PARTICIPAÇÃO
Enciclopédia da Brasileiridade –
Auto estima em verde e amarelo, 2005
Editora Casa da Palavra;
Ilha do Bananal: encontro de ecossistemas
e culturas, 2004 DBA Editora;
Artesanato no Brasil, 1999, Editora Reflexo;
O Lugar Onde a Terra Descansa,
2000, Eco Rio Editora;
O Rio São Francisco, 1998, Prêmio Editora;
Brasil Retratos Poéticos, 1996 (atualmente na 5ª edição), Escrituras Editora.

Entrevistas
Kátia Queiroz Fenyves fala a respeito de sustentabilidade e meio ambiente

Kátia Fenyves é Mestre em Políticas Públicas e Governança pela Sciences Po Paris e formada em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo. Ao longo de sua trajetória profissional, acumulou experiências em cooperação internacional para o desenvolvimento sustentável no terceiro setor e na filantropia. Atualmente é Gerente do Programa de Finanças Verdes da Missão Diplomática do Reino Unido no Brasil.
1. Você estudou e tem trabalhado com a questão de sustentabilidade e o meio ambiente. Pode nos falar um pouco a respeito desses temas?
Meio ambiente é um tema basilar. Toda a vida do planeta depende de seu equilíbrio. A economia, da mesma forma, só se sustenta a partir dos recursos naturais e de como são utilizados. Sustentabilidade, portanto, foi o conceito que integrou as considerações aos aspectos ambientais, sociais e econômicos, revelando de forma mais sistêmica esta inter-relação e, sobretudo, colocando o meio ambiente como eixo estratégico do desenvolvimento, para além de seu valor intrínseco.
2. Quando se fala em sustentabilidade, pensa-se no tripé social, ambiental e econômico. Como você definiria esses princípios? Qual deles merece maior atenção, ou todos são interligados e afetam nossa qualidade de vida integralmente?
Exatamente, sustentabilidade é o conceito que revela as interligações entre os três pilares – social, ambiental e econômico e, portanto, são princípios interdependentes e insuficientes se tomados individualmente. Talvez, o ambiental seja realmente o único que escapa a isso. A natureza não depende da economia ou da sociedade para subsistir, mas, por outro lado, é impactada por ambos. Por isso, sustentabilidade é um conceito antrópico, ou seja, é uma noção que tem como referencial a presença humana no planeta.
3. Questões relacionadas à sustentabilidade, preservação do meio ambiente e consumo consciente são discutidas nas escolas e universidades?
Há entre as Diretrizes Curriculares Nacionais estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação, que são normas obrigatórias, as específicas para Educação Ambiental que devem ser observadas pelos sistemas de ensino e suas instituições de Educação Básica e de Educação Superior a partir da Política Nacional de Educação Ambiental. Estas contemplam todos os temas citados na pergunta. Não sou especialista na área então é mais difícil avaliar a implementação, mas em termos de marco institucional o Brasil está bem posicionado.
4. Quando se fala em preservação do meio ambiente, pensa-se também nos modelos de descarte que causam tantos danos ao meio ambiente. Existe alguma política de incentivo ao descarte consciente?
Mais uma vez, o Brasil tem um marco legal bastante consistente para o incentivo ao descarte consciente que é a Política Nacional de Resíduos Sólidos de 2010, que é inclusive uma referência internacionalmente. Na verdade, mais que um incentivo ela é um desincentivo ao descarte inconsciente por meio do estabelecimento da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos e a logística reversa. Isso significa que a PNRS obriga as empresas a aceitarem o retorno de seus produtos descartados, além de as responsabilizar pelo destino ambientalmente adequado destes. A inovação fica sobretudo na inclusão de catadoras e catadores de materiais recicláveis e reutilizáveis tanto na logística reversa como na coleta seletiva, algo essencial para um país com nosso contexto social.
5. Você acha que os modelos de descarte atuais serão substituídos por novos modelos no pós-pandemia? O que fazer, por exemplo, para incentivar as pessoas a descartar de forma consciente as máscaras antivírus?
Sempre é preciso se repensar e certamente a pandemia deu destaque a certas fragilidades da implementação da PNRS. Grande parte dos hospitais brasileiros ainda não praticam efetivamente a separação e adequada destinação de seus resíduos e, na pandemia, este problema é agravado tanto pela maior quantidade de resíduos de serviços de saúde gerados como por uma maior quantidade de geradores, uma vez que a população também começa a produzir este tipo de resíduo em escala. Falta ainda muita circulação da informação, então talvez este seja o primeiro passo: uma campanha de conscientização séria que jogue luz nesta questão.
6. Na sua opinião, o mundo está mais consciente das necessidades de preservação do meio ambiente e dos recursos naturais para que gerações futuras possam deles usufruir?
Acredito que tenhamos passado do ponto em que estas necessidades de preservação eram uma questão de consciência e chegamos a um patamar de sobrevivência. Também não se trata apenas das gerações futuras, já estamos sofrendo as consequências do desequilíbrio ambiental provocado pela ação humana e do esgotamento dos recursos naturais desde já. A própria pandemia é resultado de relações danosas entre o ser humano e o meio ambiente e os conflitos por fontes de água, por exemplo, são uma realidade.
7. Quais as ações que mais comprometem e degradam o meio ambiente?
Nosso modelo produtivo e de consumo como um todo é baseado em uma relação predatória com o meio ambiente: retiramos mais do que necessitamos, sem respeitar os ciclos naturais de reposição e, além disso, quando descartamos os resíduos e rejeitos não cumprimos com os padrões adequados estabelecidos. Já temos conhecimento suficiente para evitar grande parte dos problemas, mas ainda não conseguimos integrá-lo nas nossas práticas efetiva e definitivamente.
8. O que na sua opinião precisa ser feito para que as sociedades conheçam mais a respeito de sustentabilidade, preservação do meio ambiente e consumo consciente?
Acredito que para avançarmos como sociedade precisamos tratar a questão das desigualdades socioeconômicas que estão intrinsicamente relacionadas a desigualdades ambientais, inclusive no que diz respeito às informações, ao conhecimento. A educação é, portanto, um componente estratégico para este avanço, mas é preciso ter um entendimento amplo que traga também os saberes tradicionais para esta equação. Além disso é preciso cada dia mais abordar o tema da perspectiva das oportunidades, pois a transição para modos de vida mais sustentáveis, que preservam o meio ambiente e que se baseiem em consumo conscientes alavancam inúmeras delas; por exemplo, um maior potencial de geração de empregos de qualidade e menos gastos com saúde.
9. A questão climática está relacionada com a sustentabilidade? Como?
A mudança do clima intensificada pela ação antrópica tem relação com nossos padrões de produção e consumo em desequilíbrio com o meio ambiente: por um lado, vimos emitindo uma quantidade de gases de efeito estufa muito significativa e, por outro, vimos degradando ecossistemas que absorvem estes gases, diminuindo a capacidade natural do planeta de equilibrar as emissões. Assim, a questão climática está relacionada com um modo de vida insustentável. A notícia boa é que práticas sustentáveis geram diretamente um impacto positivo no equilíbrio climático do planeta. Por exemplo, o Brasil tem potencial para gerar mais de 25 mil gigawatts em energia solar, aproveitando sua excelente localização geográfica com abundância de luz solar, uma medida sustentável que, ao mesmo tempo, é considerada uma das melhores alternativas para a diminuição das emissões de CO2 na atmosfera, que é um dos principais gases intensificadores do efeito estufa.
Entrevistas
MARCOS TERENA

De filho pródigo à liderança internacional, o índio, piloto e cacique Marcos Terena, tornou-se um líder respeitado e o ponto de equilíbrio entre autoridades brancas e os povos indígenas.




Em relação aos compromissos assumidos na Rio 92 e não cumpridos, Kyoto foi um divisor de água?
Ministro – Sim. Em 92, os países desenvolvidos assumiram o compromisso voluntário de buscar atingir, por volta do ano 2000, os mesmos níveis de emissões de 1990 de gases de efeito estufa. O que não será cumprido por muitos dos países industrializados. Em Kyoto os países assumem o compromisso legal, e não mais voluntário, de redução de suas emissões. Neste aspecto, a Conferência de Kyoto marca o início de um processo irreversível, com a inclusão de um novo fator no ordenamento jurídico das relações internacionais, ou seja, o da necessidade de limitar as emissões dos chamados gases de efeito estufa, em especial gás carbônico, pelas atividades humanas sob pena de mudarmos o clima do planeta.
Os países em desenvolvimento vão ter acesso às tecnologias para um desenvolvimento limpo?
Ministro – A Convenção já estipula que os países em desenvolvimento devem procurar buscar trajetórias “mais limpas” de desenvolvimento social e econômico, ou seja, seguir desenvolvendo o país com menor emissão de gases de efeito estufa. A construção desta trajetória menos intensiva em gases de efeito estufa, entretanto, considerando que a maior prioridade dos países em desenvolvimento é o desenvolvimento sócio-econômico e, em especial, a erradicação da pobreza, está condicionada à obtenção de ajuda dos países desenvolvidos em termos de provisão de recursos e tecnologias adequados para este fim. A experiência obtida após 5 anos de implementação da Convenção nos mostra que esta ajuda não se materializou quer por dificuldades econômicas dos países desenvolvidos, quer pela falta de um mecanismo que acelerasse este processo. O Protocolo de Kyoto adotou como um de seus artigos, uma proposta, com modificações, que foi originalmente apresentada pelo Brasil e adotada por todo o bloco de países em desenvolvimento. Segundo esta proposta, será criado um Mecanismo de Desenvolvimento Limpo em que recursos dos países desenvolvidos poderão ser aplicados como “oportunidades para auxiliar no cumprimento dos seus tetos de emissão” em projetos que visem a redução de emissões de gases de efeito estufa em países em desenvolvimento. A entidade que operar este mecanismo também se encarregará de certificar que as reduções alcançadas por cada projeto produzam benefícios reais. Este mecanismo poderá ser uma maneira efetiva de produzir a necessária transferência de recursos e tecnologias para os países em desenvolvimento.
Quais os compromissos do Brasil?
Ministro – O Protocolo não estabelece metas de limitação de emissões para os países em desenvolvimento e, portanto, para o Brasil, porque estes países ainda se encontram em um estágio inicial de desenvolvimento com emissões crescentes. O compromisso do Brasil é o de avançar na implementação do compromisso inicial na Convenção, assumido na Conferência do Rio de Janeiro, em 92, por todos os países em desenvolvimento, ou seja, elaborar um diagnóstico da situação atual para apresentar às Nações Unidas. Neste diagnóstico serão estimadas nossas emissões dos principais gases de efeito estufa (em especial, gás carbônico, metano e óxido nitroso) em todos os setores de atividade humana que geram estes gases. É um esforço enorme se lembrarmos que as atividades humanas que geram gases de efeito estufa abrangem produção e uso de energia (termelétricas, refinarias, transporte, consumo nas residências etc.), produção de gases na indústria (cimento, química, papel e celulose, alumínio, uso de solventes, lubrificantes, vernizes e tintas etc.), uso da terra (desflorestamento, queimadas do cerrado, florestas plantadas), agricultura (pecuária, cultivo de arroz, uso de fertilizantes) e tratamento de lixo e esgoto. Neste esforço estamos envolvendo cerca de 60 instituições no Brasil dos diferentes níveis de governos, empresas públicas e privadas, universidades e organizações não-governamentais, com a ajuda dos maiores especialistas do assunto no país em cada um dos setores envolvidos.
Além do inventário de emissões, vamos apresentar o que o Brasil está fazendo no sentido de combater a mudança do clima. O Brasil tem feito muito em termos de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa. Iniciativas como o Pró-álcool, maior programa de energia renovável do mundo, o potencial instalado de 60 GW de hidrelétricas, os programas nacionais de conservação de energia, Procel (setor elétrico) e Conpet (setor petróleo e gás natural), o Prodeem (Programa de Desenvolvimento Energético de Estados e Municípios) são programas no setor energético que permitem que o Brasil apresente um dos menores índices, no mundo, de emissão de gases de efeito estufa por unidade de energia gerada. Na área de uso da terra, vamos apresentar o trabalho de combate e prevenção de queimadas, o Projeto Prevfogo. Também no combate ao desmatamento da floresta amazônica, o Brasil foi pioneiro em utilização de sensoreamento remoto por satélite para avaliar a área anual desmatada e as emissões de gases, e recente legislação busca retirar todos os incentivos que existiam no passado que originaram o quadro atual de desmatamento.
Pessoalmente, o senhor acha que a Conferência de Kyoto foi um avanço?
Ministro – Estou convencido de que a Conferência de Kyoto representa um novo passo no sentido de enfrentar o problema. A Convenção sobre Mudança do Clima, em 1992, estabeleceu o início do processo de discussão técnica, científica e política do problema de aquecimento global, um problema de longo prazo, assinado e ratificado por mais de 160 países. Em 1995, na 1º Conferência das Partes em Berlim, se verificou que os compromissos de estabilização das emissões contidos na Convenção não seriam atingidos e foi estabelecido o Mandato de Berlim para a elaboração de um protocolo que transformasse os compromissos voluntários em obrigação legais.
Berlim, depois Kyoto. O protocolo será cumprido?
Ministro – O Protocolo estabelecido em Kyoto em dezembro de 1997 é o fim do processo iniciado em Berlim. Mediante o Protocolo de Kyoto a Convenção segue aprofundando os compromissos dos países e, em especial, dos países desenvolvidos que agora se comprometem, em um documento com vínculos legais, a reduzirem seus níveis de emissões entre 2008 e 2012 em cerca de 5%, tomando como base as emissões de gases de efeito estufa realizadas em 1990. Apesar de ser considerada uma meta modesta por algumas entidades, deve-se reconhecer que alguns países, como os Estados Unidos, por exemplo, emitem atualmente gases de efeito estufa em níveis superiores a 10% acima dos níveis de 1990, o que mostra, por um lado, a dificuldade de definição de políticas voluntárias, como proposto originalmente na Convenção, que efetivamente controlem o nível de emissões geradas pelas atividades econômicas. Por outro lado, o esforço para o cumprimento das metas de Kyoto implica importantes mudanças nas sociedades daqueles países.
No entanto, o problema é de longo prazo e existem incertezas sobre os efeitos do aquecimento global ao nível regional e local. Os cenários do IPCC – Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima, que estimam aumentos da temperatura média da superfície terrestre entre 1 e 3,5 graus Celsius até o ano 2100; a dificuldade de separar os efeitos decorrentes da acumulação de gases de efeito estufa na atmosfera daqueles decorrentes da variabilidade natural do clima; os custos envolvidos ou o tempo necessário para a introdução de inovação tecnológica ou mudança de padrões de consumo são fatores que nos obrigam a planejar em um ambiente de incerteza e adotarmos a precaução como diretriz. A meta estabelecida em Kyoto, se cumprida, representa um primeiro passo na direção do desenvolvimento sustentável e na tentativa de combater o aquecimento global, ao mudarmos a tendência de interferência crescente das atividades humanas no sistema do clima.
Os países ricos vão cumprir o pouco que prometeram?
Ministro – As dificuldades da solução do problema de aquecimento global decorre basicamente do fato de que os gases de efeito estufa permanecem por longos períodos na atmosfera, sendo que o dióxido de carbono, o principal gás de efeito estufa, permanece por mais de um século na atmosfera. A proposta do Brasil, apresentada nas discussões preliminares para a elaboração do Protocolo, mostra que o problema do aquecimento global foi originado principalmente pelas emissões dos países industrializados após a revolução industrial. Cabe aos países industrializados tomarem a iniciativa de liderança no processo de combater a mudança de clima. Nesse sentido, todos esperamos o cumprimento do Protocolo e certamente haverá uma fiscalização e uma cobrança permanente das promessas feitas em Kyoto. Os países em desenvolvimento que tanto vêm fazendo, apesar de restrições financeiras e tecnológicas, continuarão na busca do desenvolvimento sustentado e estarão prontos para assumirem suas responsabilidades em relação a um regime universal e justo de repartição do ônus de evitar a mudança do clima no momento em que os países industrializados mostrarem que estão efetivamente reduzindo suas emissões em níveis inferiores aos de 1990.
SUMMARY
José Israel Vargas, 70 years of age, in addition to serving at the head of the Ministry of Science and Technology, presides over the Academy of Third World Sciences, with headquarters in Italy, and is vice-president of the World Independent Commission on the Oceans. He also lead the group of scientists and leaders of thought from Latin America in the elaboration of a document to be presented as a non-governmental proposal to the United Nations Assembly to be held this year in Lisbon to debate the question of the ocean environment. In his role of Minister, Vargas also headed the Brazilian delegation in international forums discussing the greenhouse effect. So who better than he to speak about the Kyoto Conference, where he played a most important part by virtue of his forthright and progressive positions.
In terms of the unfulfilled commitments made at Rio’92, was a watershed achieved at Kyoto?
Minister Vargas: Yes. In ’92, the developed countries made a voluntary commitment to seek, by the year 2000, to bring their emission of greenhouse gases back down to the same level as their 1990 emissions. Most of them have not fulfilled this promise. But in Kyoto these countries made a legally binding commitment, not a voluntary one, to reduce their emissions.
Do you personally feel that the Kyoto Conference was a move forward?
Minister Vargas: I am convinced that it represents a new step in the way we are confronting the problem. The Convention on Climate Change, signed and ratified in 1992 by over 160 countries, established the beginnings of the process of a technical, scientific and political discussion of the problem of global warming, a long-term problem. In 1995 the First Conference of the Parties in Berlin, it was verified that the commitment made in the Convention to stabilize emissions was not being met, leading to the formulation of the Berlin Mandate establishing the protocol for transforming the voluntary commitments into legal obligations.
Berlin, then Kyoto. Will these obligations be met?
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