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Paixão & Cor

Prefácio do livro de Carlos Bracher sobre série Brasília de pintura

Silvestre Gorgulho


Vida sem paixão é vida que se vai. Sem graça e sem luz. Vida com paixão é vida de prazer e de conquistas. Quem quiser mergulhar na força da arte e nos mistérios da paixão deve percorrer, docemente, as 224 páginas deste livro. Ele conta histórias de muitos amigos, de muitas obras primas e de uma relação emocionada com o símbolo maior da capacidade criativa e de realização do povo brasileiro: a construção de Brasília.


 Aos 13 anos, quando deixou Juiz de Fora, Carlos teve a oportunidade de apertar a mão de um governador mineiro em pleno Palácio da Liberdade. Desse encontro nasceu a reciprocidade e a admiração mútua. Um sentimento perpetuado por mais de 50 anos.


 O menino ganhou idade e o mundo. Viveu experiências em um universo cercado de cores e paixões. Bracher teve sobrenome estampado em telas que correram galerias, ganharam fama e foram abençoadas até por João Paulo II, quando o Papa recebeu, como presente oficial do governo brasileiro, em 1991, um quadro seu.  Já aquele governador mineiro ganhou ares de estadista. Tornou-se Presidente da República e as duas letras que simbolizam seu nome foram cravadas definitivamente na História do Brasil e no coração de várias gerações.


 Como um ciclo que se fecha, a cidade criada por JK recebe agora uma oferenda do artista, na forma de 66 criações. São afagos e declarações de amor, na forma de 66 telas, como que sonetos coloridos de paixão à Capital. Uma para cada ano de vida de Bracher.


 De um lado da tela, as tintas jorraram suaves e alucinadas formando imagens. No verso, o pincel crayon – emotivo e revelador – relatava o momento mágico do findar de cada criação, registrando, inclusive, nomes e sentimentos dos que estavam à sua volta. Um verdadeiro espetáculo de sedução.


 A Série Brasília tem essa riqueza de emoções. Carlos Bracher sabe o que faz. Pintor, desenhista e escultor, ele imortalizou igrejas e ladeiras de Ouro Preto; sob o som freneticamente amplificado de grandes compositores, retratou personagens vários da vida brasileira. Ainda em 1991, produziu cem telas em homenagem ao centenário da morte de Van Gogh. E agora, em terras candangas, o surto criativo se repete. É a explosão de arte no meio século alcançado por uma cidade que se ergue dia-a-dia, mas já carrega em seu DNA o título de Patrimônio Cultural da Humanidade. O meio século da primeira estaca fincada, marcando o início de construção da nova Capital, se confunde com a primeira exposição de Bracher, em Juiz de Fora, em maio de 1957.


    Brasília assistiu comovida, neste desenrolar do primeiro semestre, às criações de Bracher. Embaixadores, jornalistas, simples transeuntes, diplomatas, índios, reivindicantes do MST, artistas de circo, enfim, a cidade compartilhou com o artista seu momento de criação sempre ao ar livre. Assistir, do início ao fim, ao pulsar de cada pincelada, sentir o artista em transe, ofegante, abraçando o espaço era como assistir a um maestro de batuta em punho regendo em plena Esplanada.


 Vivi muitas vezes esses momentos. Emocionei-me com as imagens que lentamente nasciam. Testemunhei a intensidade e a vibração de Bracher que, intempestivo, injetava ainda mais emoção e paixão nas pessoas ao seu redor. Compartilhei com senhoras como que hipnotizadas, rezando o Terço à sua volta, enquanto ele riscava sua tela no interior da Catedral. Guardei na memória comentários dos que registravam em vídeo e fotos e se deliciavam com as imagens que brotavam das mãos revoltas e multicoloridamente “sujas” do astro principal. Emudeci-me diante de discursos improvisados durante as pinturas.


 A transfiguração era constante nos presentes. A começar pela dedicação extrema de Fani Bracher, esposa e artista, que além de acolher convidados e curiosos, recolheu todo material descartável. Fani deu um exemplo socioambiental ao reciclar artisticamente tudo o que sobrou das 66 pinturas e criar um belíssimo projeto que não podia ter outro nome mais solene: “Testemunho e Memória”.


 Como não se comover diante da emoção da embaixatriz italiana Elena Valensise ao ver a fachada de sua bela Embaixada, projetada por Pierluigi Nervi, sendo imortalizada nas telas do artista? Como não abrir um sorriso diante do angelical comentário de Gabriela Ribeiro Siqueira, de quatro anos, pedindo ao artista para colocar mais “tinta vermelha” numa sombra da tela da Catedral? Como não marejar os olhos ao assistir à participação de Augusto dos Mares Guia Correa, seis anos, e de Sophia Fortes Rodrigues, sete anos, ambos portadores de necessidades especiais? Enquanto Augusto tocava os pombos para aparecerem na tela da Praça dos Três Poderes, Sophia pegou o pincel e ajudou o artista terminar o quadro do Espaço Cultural Renato Russo, na 508 Sul.


Os jornalistas tinham matéria prima abundante. Imagens, declarações, vida e arte nos textos de Carlos Monforte, da Globo; de Adriano Lopes, de Angélica Torres e de Cristiano Torres, da Revista Roteiro; de Karina Gomes Barbosa, do Caderno Brasília do HOJE em Dia; de Heloísa Torres, do programa Almanaque, da Globo News; a força de Flávio Lara Resende da TV Bandeirantes e de Toninho Drumond, da TV Globo; e a dedicação de Blima Bracher, de Armando Lacerda e de Sérgio Pereira Silva, na dobradinha para produção de filmes e fotos. Sempre com a cumplicidade mineira de Hebe Guimarães.


Até uma noiva, vestida a caráter, apareceu na Praça dos Três Poderes para ter um destes momentos registrados em seu álbum de casamento.


O arquiteto Carlos Magalhães, construtor da Catedral, participou de dupla magia: testemunhou o início da construção da Capital e, com o advogado e escritor Paulo Castelo Branco, acompanhou pessoalmente o final da Série Brasília.


Todos queriam viver essa epopéia. Larissa Bracher deixava suas gravações e seus teatros no Rio de Janeiro para compartilhar com o pai vários fins de semana de trabalho. Um transe de traços e olhares produzidos a partir de lugares, monumentos e edificações brasilienses. E se o centenário Oscar Niemeyer foi o mentor da maioria dos temas retratados, Carlos Bracher se transformou em mola propulsora da eternização de cores e amores pela cidade.


Sobram mineiridade e coincidências em cada uma das partes deste mosaico. Das mesmas Geraes de onde saiu JK, outros tantos se renderam ao trabalho do artista, como seu xará Drummond que deixou um recado de saudade: “Encontrei-me com Minas através da pintura de Carlos Bracher”.


O amor confesso do artista por Brasília está registrado em cada frase deste livro e em cada depoimento no reverso dos seus quadros. Mas, antes mesmo da impressão final, esta paixão está estampada na dedicatória feita por ele ao entregar uma prova do livro a outro mineiro, o governador José Roberto Arruda: “Governador, receba este livro de tanto amor a esta insigne e comovente cidade”.


 Se a vida vale pelas emoções, Carlos Bracher – sinônimo de paixão e cor – faz a vida valer.


 


 


 


 


 


 


 


 


 

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Dia do Turismo, 27 de setembro: Brasília, uma cidade de encanto e diversidade

De janeiro a julho deste ano 3.112.597 visitaram a capital do país, entre transportes aero nacional, internacional, rodoviário e CAT

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Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil

 

Brasília, a capital do Brasil, é um destino que oferece uma rica combinação de beleza, sabor e entretenimento para seus habitantes e visitantes em todas as estações do ano. De janeiro a julho deste ano, o Distrito Federal recebeu um total de 3.112.597 pessoas por meio de diversos meios de transporte, incluindo aéreo nacional, internacional, rodoviário e o Centro de Atendimento ao Turista (CAT). Em 2022, esse número alcançou 5.420.142 turistas. Desde sua inauguração em 1960, Brasília se destaca pela arquitetura moderna e icônica projetada por Oscar Niemeyer.

Entre os principais pontos turísticos visitados ao longo dos anos, destacam-se a Catedral Metropolitana Nossa Senhora Aparecida, o Memorial JK, o Pontão do Lago Sul, a Ponte Juscelino Kubitschek, o Museu Nacional da República, o Congresso Nacional, o Parque da Cidade Sarah Kubitschek, o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), o Santuário São João Bosco, o Palácio do Planalto, o Palácio da Alvorada, a Praça dos Três Poderes, o Estádio Mané Garrincha, o Museu do Catetinho, o Jardim Zoológico de Brasília, o Parque Nacional de Brasília – Água Mineral, a Torre de TV, o Planetário de Brasília e o Museu do Catetinho. A Fundação Jardim Zoológico de Brasília, considerada um patrimônio cultural, recebeu sozinha 335.839 visitantes até julho deste ano, enquanto em 2022 recebeu 922.547 pessoas.

O Estádio Mané Garrincha, sob a gestão da Arena BRB, não apenas hospeda jogos de futebol, mas também shows e outras atrações. Em 2023, cerca de 1 milhão de pessoas já passaram pelo Complexo, enquanto no ano anterior foram 1,5 milhão de visitantes.

O Congresso Nacional recebeu 61.246 convidados de janeiro a setembro deste ano, em comparação com 64.330 em 2022. O CCBB Brasília atraiu mais de 1 milhão de visitantes desde o ano passado. O Parque Nacional de Brasília – Água Mineral registrou 198.485 visitantes em 2023. O Museu do Catetinho recebeu 25.772 visitantes este ano, enquanto no ano passado foram 29.244.

Esses números demonstram a atratividade de Brasília como um destino turístico repleto de pontos de interesse e encanto. Ronaldo Martins, coordenador do Programa de Visitação Institucional e de Relacionamento com a Comunidade, destaca que o Palácio do Congresso Nacional é um dos locais mais visitados de Brasília, atraindo turistas de todo o Brasil e do exterior.

Wilson Nobre, superintendente de Educação e Uso Público do Zoológico, enfatiza a importância dos zoológicos como destinos turísticos que encantam visitantes de todo o mundo, proporcionando uma oportunidade única de interagir com animais selvagens majestosos e explorar seus habitats.

Richard Dubois, presidente da Arena BRB, destaca que mais de um milhão de pessoas passaram pelo complexo da Arena em 2023, impulsionando diversos setores da capital, incluindo a rede hoteleira, o turismo e eventos corporativos.

A Secretaria de Turismo do DF trabalha em parceria com representantes do setor para desenvolver ações e projetos que coloquem Brasília no centro do turismo. Entre essas iniciativas estão o desenvolvimento da Lei do Turismo, a regulamentação do espaço para o Motorhome, a implementação do calendário de eventos e o retorno do festival Festa dos Estados. A cidade também está destacando novas tendências do turismo local, como o Enoturismo, o Turismo Rural, o Turismo de Aventura e o Ecoturismo.

Cristiano Araújo, secretário de Turismo, enfatiza a transformação de Brasília em uma cidade vibrante, com diversas opções para atender às expectativas de seus visitantes, desde sua cena gastronômica até a oferta de atividades de lazer e entretenimento.

Neste Dia do Turismo, 27 de setembro, e durante todo o ano, Brasília oferece inúmeras oportunidades para conhecer ou revisitar seus pontos turísticos. Até mesmo os moradores locais, como o professor Anderson José e a secretária Keyla Freitas, encontram motivos para explorar a cidade, seja pelos museus que contam a história da capital ou pelos parques que proporcionam momentos de paz e beleza. Brasília é verdadeiramente um tesouro a ser explorado.

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Em Brasília, mulheres indígenas celebram diversidade cultural e marcham por lutas comuns

Na III Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, representantes de todos os biomas do Brasil celebram sua diversidade, denunciam violência de gênero e dizem não ao Marco Temporal.

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Marcha das Mulheres Indígenas de 2023, em Brasília — Foto: Amanda Magnani

 

O som de cantos e dos maracás ecoa de todos os lados do acampamento à medida que grupos de mulheres dos mais diferentes cantos do Brasil se aproximam da tenda principal na concentração para a III Marcha Nacional de Mulheres Indígenas. São 8h00 e o sol seco de Brasília parece realçar as cores dos mais variados trajes tradicionais.

A marcha, que foi do Complexo Cultural da Funarte, onde estavam acampadas, até o Congresso, a cerca de 5km de distância, reuniu mais de 5 mil mulheres. Ela aconteceu no último dia de um evento que, ao longo de três dias, foi marcado por celebrações e denúncias.

Sob o tema “Mulheres Biomas em Defesa da Biodiversidade pelas Raízes Ancestrais”, indígenas de diferentes partes do Brasil tiveram a oportunidade de dar voz às demandas específicas vividas pelos povos de seus biomas.

Para o povo Kiriri, da Caatinga, a cerca de 300 km de Salvador, um dos maiores problemas é a seca e a consequente falta de segurança alimentar. “Nossa região é muito seca, e as mudanças climáticas aumentam o impacto na insegurança alimentar”, diz Fabiana Kiriri.

Ela conta que o trabalho coletivo na comunidade e a reserva de alimentos vêm como uma forma de tentar contornar o problema. Mas uma colheita suficiente depende de muitos elementos, que vão da quantidade de chuvas à presença de pragas.

“O que realmente precisamos é de um olhar especial do governo, que proponha projetos para ajudar as comunidades a terem autonomia”, defende.

Já para o povo Kaingang do Pampa, no Rio Grande do Sul, as demandas passam principalmente pelos enfrentamentos com o agronegócio e pelos arrendamentos de áreas dentro das terras indígenas, que acabam levando monoculturas e agrotóxicos para dentro a terra.

“Nós precisamos dar visibilidade às nossas lutas e sensibilizar a nossa comunidade, para que possamos encontrar estratégias para atender as demandas dos nossos territórios”, diz Priscila Gore Emílio, psicóloga do povo Kaingang.

Enquanto isso, em Santa Catarina, os Xokleng são protagonistas no debate sobre o Marco Temporal. “Nossa região foi tradicionalmente ocupada pelos povos indígenas e o nosso território já foi muito maior. Hoje, vivemos em uma área muito reduzida, mas continuamos vivendo muitas tensões e conflitos”, diz Txulunh Gakran.

Contudo, embora povos dos diferentes biomas tenham suas demandas específicas, são muitas as lutas comuns às mulheres indígenas do Brasil como um todo. Grande parte delas gira ao redor da garantia do direito ao território e ao fim da violência de gênero.

 

 

 

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HOJE, 21 DE SETEMBRO, É DIA DA ÁRVORE.

PRIMEIRA ÁRVORE PLANTADA EM BRASÍLIA

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A primeira árvore plantada, em Brasília, foi um pé de Canjerana. O presidente Juscelino Kubitschek a plantou quando da inauguração da Escola Júlia Kubitschek, a primeira de Brasília, em 1957.
Um ano depois, em 1958, JK plantou outra canjerana (cabrália canjerana), ao iniciar o trabalho de arborização de Brasília, nas casas da W3 Sul.
Agora, em 2023, temos uma cidade belamente arborizada com ipês, pequizeiros, jacarandás, jatobás, sucupiras, paineiras… Uma floresta de árvores do Cerrado, da Mata Atlântica e da Amazônia.
Até no que diz respeito a plantas, árvores e flores, Brasília é pedacinho muito representativo do Brasil. Tem tudo da flora brasileira.
Para não dizer que só falei de árvores, é bom lembrar que em julho de 1957, praticamente três anos antes da inauguração, foi feito um censo em Brasília. Era o início da epopeia da construção.
Brasília tinha 6.823 habitantes, sendo 4.600 homens e 1.683 mulheres.
Para ler a Folha do Meio Ambiente:
foto: Canjerana
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Reportagens

SRTV Sul, Quadra 701, Bloco A, Sala 719
Edifício Centro Empresarial Brasília
Brasília/DF
rodrigogorgulho@hotmail.com
(61) 98442-1010