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Aeroporto de Brasília: Navegando pelos Capítulos de sua História

Entre Partidas e Chegadas: O Papel Significativo do Aeroporto de Brasília na História Candanga

 

Pode soar estranho dizer que o aeroporto estava incluso nos pontos de lazer de Brasília, mas ir à pista de pouso e decolagens ver os aviões foi, por muitos anos, um dos passeios favoritos dos moradores da capital recém-criada. O terminal, inaugurado em 3 de maio de 1957, também faz parte da história da construção da cidade de Juscelino Kubitschek e esse é o tema de mais uma matéria da série Brasília sexagenária.

Os visitantes ficavam a alguns metros das aeronaves em um terraço. Dali viam os aviões subirem e descerem, a tripulação embarcar e desembarcar. Entre os tchauzinhos e sorrisos de despedidas e reencontros, a servidora pública Juliana Campos, 44, à época com apenas 5 anos, encantava-se com o tamanho das aeronaves. “Quando íamos buscar meu pai no aeroporto, eu me animava. Tenho a cena guardada na minha memória, das pessoas olhando os aviões. Era muito bom. Às vezes, a gente ia só para passear mesmo. Era um local de passeio”, recorda.

As lembranças dos passeios ao terminal fazem Juliana sentir um carinho especial pelo lugar. “Fico tentando encontrar na planta do novo as partes do antigo. Ele era tão pequeno. Hoje, mesmo diferente, traz muito memória afetiva”, ressalta. Juliana recorda que o espaço era um dos points da cidade. “Muita gente ia só para tomar café da manhã. Muitos jovens saíam à noite (para a balada) e, de manhã, iam direto para lá”, diz.

Uma casa

Se para Juliana o Aeroporto de Brasília remete à diversão de infância, para Marcos Trindade, 59, o espaço é sinônimo de crescimento profissional. No terminal, o gerente de logística conseguiu o primeiro emprego na capital, há 41 anos. “Eu vim do Piauí para Brasília em 1979. Fiz um teste para trabalhar no estacionamento. Uma semana depois, me chamaram para trabalhar no setor de cargas”, relata. A função era de separador, apenas o início de uma carreira. À época, Marcos nem imaginava que chegaria ao cargo de gerência na área. “Eu sou responsável por toda carga que vem ou vai para o exterior. Todos os objetos importados ou exportados passam pela gente”, acrescenta.

No aeroporto, Marcos também conheceu a mulher, Maria Edileuza, 62, com quem é casado há 36 anos. “Ela trabalhava em uma companhia aérea. A gente começou a se falar no Parque da Cidade. Aqui a gente se via, mas não conversava”, lembra. No terminal, Marcos presenciou as regras da ditadura militar, com soldados vigiando os portões, e o vai e vem de autoridades quando o regime terminou. “Eu lembro da posse de Fernando Collor. Veio muito chefe de Estado. Aqui era pequeno, foi uma loucura”, recorda. O gerente de logística também lembra do aeroporto como um ponto de encontro. “As pessoas vinham bem arrumadas, salto alto, bem vestidas, maquiadas, como se fosse um passeio em shopping”, completa.

Oscar Niemeyer

Antes de ser instalado onde está hoje, o Aeroporto de Brasília funcionava na Base Aérea de Brasília, bem perto. Ali, construíram a primeira pista, onde pousavam e decolavam as grandes aviações. Em 3 de maio de 1957, o terminal foi oficialmente inaugurado com o primeiro voo comercial da companhia aérea Pan American, para Nova York. Na data, ocorria também a primeira missa da cidade, na Praça do Cruzeiro. Tempos depois, fizeram uma segunda pista, de 4 mil metros. À época, a estação de passageiros ainda era de madeira, assim como muitas outras coisas na cidade. Nos três primeiros meses, a movimentação era grande, com 268 pousos e decolagens, sendo 2,7 mil desembarques e 2,5 mil embarques.

Alguns anos depois da inauguração de Brasília, em 1971, vieram as pistas definitivas e a edificação de alvenaria. O historiador Adirson Vasconcelos lembra da polêmica sobre o projeto. “Todas as obras eram assinadas por Oscar Niemeyer, e ele era declaradamente comunista. O governo da época era militar. Por isso, ele foi colocado de escanteio, porque arquitetaram o aeroporto em uma área militar”, conta.

O nome também entrou em discussão anos depois. “Vários defendiam que o nome deveria ser Juscelino Kubitschek. Eu mesmo fiz alguns artigos defendendo isso. Passados alguns anos, o então senador José Roberto Arruda apresentou um projeto solicitando que o nome fosse em homenagem ao idealizador de Brasília e, assim, conseguimos”, relata Adirson.

Em 1999, batizaram o terminal como Aeroporto Internacional de Brasília Presidente Juscelino Kubitschek. “Tivemos uma solenidade linda, em homenagem ao fundador e aos construtores. Hoje, temos o melhor do Brasil”, avalia o historiador. Entre 1973 e 2013, a administração ficou sob a responsabilidade da Infraero. Atualmente, a gestão é da Inframerica.

Linha do tempo

  • Novembro de 1956 — Inicia-se a construção do aeroporto.
  • Maio de 1957 — Inauguração oficial do Aeroporto de Brasília com o 1º voo comercial para Nova York. Na data, foi celebrada a primeira missa da nova capital, na Praça do Cruzeiro.
  • Abril de 1959 — Presidente Juscelino Kubitschek pousa no Aeroporto de Brasília.
  • 1971 — O terminal de passageiros de madeira é desativado e é construído o novo terminal, onde está localizado até hoje.
  • Junho de 1980 — O papa João Paulo II visita o Brasil pela primeira vez e pousa no Aeroporto de Brasília.
  • 1999 — O aeroporto é batizado com o nome oficial: Aeroporto Internacional de Brasília Presidente Juscelino Kubitschek.

Fonte: Aeroporto de Brasília

 

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Fim de semana com música, teatro e algumas atrações gratuitas

Diversificada, programação inclui até um festival de flores, com palestras e estandes

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Jak Spies, da Agência Brasília | Edição: Chico Neto

 

O primeiro fim de semana do último mês do ano tem um pouco de tudo: flores, samba, cinema, teatro, música e arte circense. Tudo incentivado pelas secretarias de Turismo (Setur) e de Cultura e Economia Criativa (Secec), com eventos gratuitos para todas as idades. Confira, abaixo, a programação.

Festivais e feiras

Festflor Brasil apresenta diversos exemplares de plantas ornamentais, em programação que também inclui palestras | Foto: Geovana Albuquerque/Agência Brasília

O maior evento de flores e plantas ornamentais do Distrito Federal já começou e vai até este domingo (3), na sede da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), das 11h às 19h. A oitava edição do FestFlor Brasil tem programação gratuita e conta com palestras e oficinas sobre floricultura, além de estandes para expor e comercializar plantas das mais variadas espécies.

O festival é organizado pela Sempre Eventos em parceria com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-DF), a Setur, a Secretaria da Agricultura, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (Seagri), a Ceasa-DF e a Embrapa.

Outra atração deste fim de semana é a quinta edição do Festival Haynna e os Verdes, na Casa Akotirene, em Ceilândia Norte. Com entrada franca, o evento musical começa às 16h deste sábado (2), reunindo artistas do DF e do Brasil, como Maria Paula Andrade, DJ Kalectra, Mic Dias, Prethaís, Ane Êoketu, Haynna e os Verdes, Negra Eve, Lu Ferreira, Dj Lunary, Dark Style, Talíz, Marlene Souza Lima e Flor Furacão.

Já para quem aprecia a arte impressa, o Motim ocupará o Museu Nacional da República sábado e domingo, das 11h às 19h. O evento, gratuito, é uma feira colaborativa de talentos, com exposição de diversos artistas locais.

Samba e arte circense

Samba da Tia Zélia leva ritmos animados à praça central do Espaço Cultural Renato Russo | Foto: Divulgação

Como neste fim de semana é comemorado o Dia do Samba (2 de dezembro), o ritmo também compõe as atrações da agenda. No domingo, o Samba da Tia Zélia celebrará a data na praça central do Espaço Cultural Renato Russo, das 15h às 19h, em evento gratuito.

Samba da Tia Zélia virou o evento queridinho do público desde seu nascimento, em 2022. Diversos artistas reconhecidos passaram a frequentar a tenda da Vila Planalto, como os músicos do 7 na Roda, Goiabada Cascão, Samba na Comunidade, Teresa Lopes, Carol Nogueira, Cris Pereira e Litieh, entre outros.

Também neste sábado, o IFB Campus Gama será ocupado pela arte circense, com espetáculo Além das Palavras, às 19h, com entrada franca. O show é criado e estrelado pelo Intervenções de Circo Social, um grupo de educadoras que utiliza o circo como ferramenta para o desenvolvimento humano e social.

O coletivo utiliza as técnicas circenses, integrando-as com um projeto pedagógico inspirado na educação popular de Paulo Freire e trabalhando habilidades como malabares, equilíbrio, pirâmides humanas e acrobacias, além de abordar questões como melhora da autoestima, autossuperação, comunicação não violenta, coletividade e colaboração.

Cinema

Durante este fim de semana, o Cine Brasília exibirá, em parceria com a Embaixada da Rússia, uma sessão única do filme Khitrova, o Signo dos Quatro. A história se passa em Moscou, no ano de 1902, e segue o renomado diretor de teatro Konstantin Stanislavsky em sua busca por inspiração para uma nova peça. Com a ajuda de um especialista nas periferias da cidade, ele mergulha no lendário bairro dos bandidos, Khitrovka, para investigar o assassinato de um misterioso morador.

Clássico das chanchadas, ‘Carnaval Atlântida’ está em carta no Cine Brasília, em mostra gratuita | Foto: Divulgação

Ainda no Cine Brasília, segue em cartaz a mostra A Cinemateca é Brasileira. O projeto conta com a exibição dos filmes Carnaval Atlântida (1952), À Meia-Noite Levarei sua Alma (1964), São Paulo: A Sinfonia da Metrópole (1929), Bacurau (2019), Cabra Marcado para Morrer (1984), Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), Limite (1931), O Bandido da Luz Vermelha (1968), Central do Brasil (1998) e Dona Flor e Seus Dois Maridos (1979). Todas as sessões da mostra são gratuitas.

Além disso, a animação Trolls 3 – Juntos Novamente continua em cartaz no Cine Brasília. As sessões contam com com recursos de acessibilidade de libras, legendas e audiodescrição por meio do aplicativo Mobi LOAD. Para acessar a programação completa e assistir aos trailers, basta entrar no site do Cine Brasília.

Teatro

Sábado e domingo, o coletivo Casa Moringa estreia a brincadeira-espetáculo Tawá Tingá: o Rio, a Cidade e a Onça. Protagonizada por mulheres, a peça reconta a história do povoamento de Taguatinga e da construção de Brasília, demarcando o protagonismo feminino nas culturas populares.

‘Tawá Tingá: o Rio, a Cidade e a Onça’ evoca seres da floresta para contar a história do povoamento de Taguatinga | Foto: Divulgação/Cied Pereira

Na apresentação, 18 mulheres retomam a amarração de fios da história que foram cortados na formação do Distrito Federal. Elas reocupam o território ancestral de Tawá Tingá (barro branco, na língua tupi), com um mutirão de reflorestamento do imaginário e de limpeza das águas profundas do rio da memória. Na travessia, vida e morte se encontram para celebrar o nascimento de um povo e de uma brincadeira, sob a proteção da guardiã da floresta, a onça Yayá.

As duas sessões de estreia serão apresentadas na Ocupação Cultural Mercado Sul Vive, em Taguatinga, com interpretação em Libras e audiodescrição. No sábado, a peça começa às 20h; no domingo, às 17h. A entrada é franca, com classificação indicativa livre.

 

 

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Cine Brasília tem sessão exclusiva para série sobre Juscelino Kubitschek

Cinema mais tradicional da capital exibirá terceiro capítulo da obra ‘JK, o Reinventor do Brasil’, produzida pela TV Cultura

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Nesta terça (28), o Cine Brasília exibe, com exclusividade, o terceiro capítulo da minissérie documental JK, o Reinventor do Brasil. Produzida pela TV Cultura, a obra narra, de forma acessível e em ritmo de podcast, a história do ex-presidente Juscelino Kubitschek, desde o dia do nascimento até o momento da morte trágica e jamais esclarecida.

A série documental mostra momentos importantes da vida e da carreira política de Juscelino Kubitschek, uma referência histórica de Brasília e do Brasil | Fotos: Divulgação

“Queremos que as novas gerações conheçam a figura do ex-presidente e seu legado para o país”Fábio Chateaubriand Borba, autor da minissérie e diretor-executivo da TV Cultura

Com linguagem diferenciada e didática, a série conta, no total, com quatro episódios de 50 minutos cada. O primeiro retrata a infância de Juscelino em Diamantina (MG) e vai até a eleição ao Governo de Minas Gerais. O segundo episódio, por sua vez, narra a eleição de JK para a Presidência da República e os desafios que ele precisou enfrentar até tomar posse – inclusive o de aprovar a transferência da capital federal, que era o Rio de Janeiro (RJ), para Brasília.

Já o terceiro episódio, exibido com exclusividade no Cine Brasília, relata essencialmente a construção da nova capital. “A série tem como objetivo mostrar a história de um personagem brasileiro da importância de Juscelino; queremos que as novas gerações conheçam a figura do ex-presidente e seu legado para o país”, explica o autor da minissérie e diretor-executivo da TV Cultura, Fábio Chateaubriand Borba.

Nova abordagem

O quarto e último capítulo aborda desde a cassação de JK até a morte em um acidente automobilístico, na Rodovia Presidente Dutra. “Juscelino foi o brasileiro médio, que vem do interior com dificuldades financeiras, perde o pai cedo e é criado pela mãe, uma professora que lutou bastante pelos filhos”, pontua Fábio Borba. “É essa epopeia que queremos levar para os jovens, com abordagens modernas, muita tecnologia e música”.

JK (de terno) entre os célebres compositores mineiros Lô Borges, Fernando Brant, Márcio Borges e Milton Nascimento: trilha sonora do documentário também é diferenciada

O diretor classifica como única a oportunidade de poder exibir a obra no Cine Brasília: “É uma felicidade muito grande poder trazer essa série para Brasília. A forma como abordamos essa jovem cidade quebra paradigmas e estereótipos que muita gente tem da nossa capital. Poder lançar nossa série nessa obra arquitetônica de Oscar Niemeyer dá importância ao nosso trabalho”.

JK, o Reinventor do Brasil é uma produção voltada para todas as faixas etárias. A série documental configura o maior trabalho iconográfico já feito sobre a vida do ex-presidente, tendo sido produzida a várias mãos, com o apoio de dezenas de instituições de arquivo público nacionais e até internacionais.

A obra completa conta com mais de 50 mil fotografias, 80 horas de vídeos captados e mais de mil horas de edição. Outro diferencial é a trilha sonora,  com canções que marcaram as várias fases da vida de Juscelino.

Serviço

JK, o Reinventor do Brasil

→ Terça-feira (28), às 20h, no Cine Brasília – Entrequadra Sul 106/107, Asa Sul
→ Classificação indicativa livre. Entrada: presença deve ser confirmada por meio deste link.

 

Victor Fuzeira, da Agência Brasília | Edição: Chico Neto

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A CASA DOS ANIMAIS

Mesmo com os avanços científicos conquistados, o ser humano tem ainda muito a aprender com a natureza.

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É maravilhoso estudar o comportamento de cada animal, seja ele mamífero, peixe ou pássaro, em relação à sua casa. Cada espécie tem sua característica, tem sua habilidade e tem, sobretudo, um padrão de arquitetura às vezes complexa, às vezes simples, mas sempre criando técnicas e usos de materiais que lhes permite edificar suas moradias ao abrigo das mais severas condições climáticas. Alguns animais preferem viver em delicados e confortáveis casulos de pelo, paina, lã ou musgo e outros buscam cavidades em árvores, rochas ou solo e, até mesmo, labirintos com formas diversas e adaptadas para chuva, vento, calor ou frio.

 

O Pássaro Pavilhão macho faz grandes cabanas com

galhos de árvores, com uma característica interessante:

enfeita seus lares com flores, bagas e outros arranjos para

atrair as fêmeas.

 

 

O Pássaro Pavilhão macho tem olhos azuis e habilidades de arquiteto e decorador. É um pássaro sedutor. O pássaro pavilhão (bowerbird em

inglês) diversifica os rituais de namoro e exalta a natureza.

 

 

Mesmo com os avanços científicos conquistados, o ser humano tem ainda muito a aprender com a natureza. É verdade que alguns animais se contentam em achar refúgios pouco confortáveis ou seguros como tocas e troncos secos, mas existem outros que constroem casas perfeitamente adaptadas a seu peculiar estilo de vida e às necessidades de sobrevivência. Para falar e explicar essa diversidade de moradias na natureza, conversamos como o arquiteto-da-paisagem Carlos Fernando de Moura Delphim.

 

CARLOS FERNANDO DE MOURA DELPHIM –  ENTREVISTA

 

 

Arquiteto e paisagista formado pela UFMG, Carlos Fernando é técnico do Iphan e membro da Comissão de Patrimônio Mundial da Unesco. Moura Delphim trabalha com projetos e planejamento para manejo e preservação de sítios de valor paisagístico, histórico, natural, paleontológico e arqueológico. É discípulo de Burle Marx e foi o paisagista favorito do mestre Oscar Niemeyer. Moura Delphim é autor de várias publicações, entre elas JARDINS DO BRASIL.

 

 

Folha do Meio – É incrível o comportamento dos animais em relação às suas casas!

Carlos Fernando – De fato, é incrível e muito interessante. É justamente o comportamento construtivo de muitos animais que dá origem às mais curiosas formas de arquitetura, com construções muitas vezes escultóricas. Isto decorre de atividades adotadas por diferentes espécies que se utilizam dos recursos provenientes dos distintos ambientes nos quais habitam.

 

FMA – Tem animal que ganha sua casa da natureza e outros têm que construí-las, não é?

Carlos Fernando – Esse comportamento difere do surgimento espontâneo de abrigos como as conchas dos moluscos que crescem juntamente com o organismo dessas espécies. Alguns caracóis possuem conchas tão bonitas que sua captura para comercialização os coloca em risco de extinção, como o caracol de deslumbrante coloração de Cuba (Polymicta picta) do qual não existe nenhuma concha igual à outra. Já a arquitetura animal difere por não ocorrer espontaneamente. É consequência do trabalho do animal que não é apenas o arquiteto, mas também o mestre de obra e operário, atividades sem as quais não poderia fruir as vantagens de seu engenho.

 

FMA – Os humanos buscaram, de alguma forma, o ‘know-how’ com os animais para construírem suas casas?

Carlos Fernando – De certa forma, sim. Mas é evidente que a racionalidade e o conhecimento levaram o ser humano ao aperfeiçoamento e a uma sofisticação maior. A arquitetura bioclimática é, muitas vezes, inspirada em padrões da arquitetura animal. O fato é que alguns animais produzem estruturas extremamente complexas, com formas aparentemente mais racionais do que algumas soluções arquitetônicas humanas, como é o caso das abelhas da espécie Apis melifera, cujas edificações apresentam soluções tão ou mais lógicas do que as humanas. Os favos das colmeias são estruturas extremamente leves, compostas de uma sequência de compartimentos ocos e de forma perfeitamente hexagonal. As formigas, cupins, vespas e ninhos de aves são ou podem ser uma fonte de inspiração.

 

 

O fato é que alguns animais produzem estruturas extremamente complexas, com formas aparentemente mais racionais do que algumas soluções arquitetônicas humanas, como é o caso das abelhas da espécie Apis melifera, cujas edificações apresentam soluções tão ou mais lógicas do que as humanas.

 

 

FMA – Há casos em que os animais foram mais eficazes?

Carlos Fernando – Interessante, mas há um exemplo fantástico. Nenhuma obra humana pode ser comparada pela leveza, pela perfeição, despojamento e pela capacidade de cumprir suas funções com tanta eficiência como a casa da aranha. A teia de aranha serve não apenas de abrigo como também para capturar as presas nas quais são depositados os ovos que irão alimentar as pequenas aranhas recém-nascidas. Essas construções levíssimas, quase imateriais, cuja empreitada segue uma disposição rigorosa com cada passo de construção dependendo do anterior, resistem à ventania e chuvas. Sua criação segue em ordem rigorosa, não havendo nenhuma arquitetura humana que possa a ela se comparar. É residência, armadilha, despensa ou depósito de alimento, tudo da forma mais etérea e despojada possível.

 

 

Exemplo da solução térmica adotada pelos cupins. Um cupinzeiro permite que seus moradores, mesmo durante um incêndio, permaneçam vivos. (foto: José Raul Valério)

 

 

FMA – E existem outras tecnologias animais que o ser humano ainda não conseguiu copiar?

Carlos Fernando – Existem sim. Veja o caso da solução térmica adotada pelos cupins. Um cupinzeiro ou um termiteiro permite que seus moradores, os cupins, mesmo durante um incêndio, permaneçam vivos. Nos meios rurais há um costume de se cavar um cupinzeiro para em seu interior se construir fornos com a finalidade de assar alimentos. Quando não se retiram os cupins, o forno continua a crescer, mesmo sendo usado, o que se pode observar em um museu rural existente em Goiânia. Se a arquitetura erudita se utilizasse deste exemplo, mais conhecido pelas técnicas vernaculares, muito se economizaria em refrigeração doméstica. Muito também contribuiria para reduzir o aquecimento global que é acelerado pelo uso de condicionadores de ar.

 

 

 

 

 

Existem tecnologia que o ser humano poderiam copiar. É o caso da solução térmica adotada pelos cupins. Um cupinzeiro ou um termiteiro permite que seus moradores, mesmo durante um incêndio, permaneçam vivos.

 

 

FMA – E o que mais o surpreende nestes casos?

Carlos Fernando – Muitas coisas me surpreendem. Veja, por exemplo, como é surpreendente que, sem possuir ou manejar qualquer forma de ferramenta, sem ser dotados de habilidade como são as mãos, os animais bem adaptados a seu habitat puderam aprender ou criar técnicas e usos de materiais de construção. Isto lhes permitiu edificar suas moradias ao abrigo das mais severas condições climáticas. Muitas espécies, quando não dispõem de cavidades naturais das quais se aproveitem, constroem ninhos furando troncos, escavando o solo ou mesmo rochas, como é o caso de mamíferos como a toupeira e o texugo. Alguns insetos e pássaros criam labirintos de peças rigorosamente idênticas entre si, como ocorre com as admiráveis obras das abelhas e dos cupins.

 

FMA – Há outros exemplos?

Carlos Fernando – Sim. Há animais que optam por uma arquitetura que edifica o vazio das cavidades por eles esculpidas. Outros criam obras fazendo maciços com tecidos de fibras e galhos emaranhados como o guache, as cegonhas, águias e abutres. Outros preferem viver em delicados e confortáveis casulos de pelo, paina, lã ou musgo, de forma quase esféricas, como certos beija-flores.

 

FMA – O ser humano busca reciclar suas matérias primas para a construção. E os animais?

Carlos Fernando – Esta é outra característica interessante e muito curiosa em ver como certos animais reciclam também materiais e construções alheias. Aves, como a coruja, se instalam em buracos escavados nas casas de outras espécies, como os cupinzeiros.

 

FMA – Na verdade o sistema de construção pode ser bem diferente…

Carlos Fernando – É, cada um se baseia em um diferente sistema construtivo e na disponibilidade de materiais que encontram em seus habitats. Os ninhos das aves são construídos das formas mais engenhosas e intricadas. Enquanto o pica-pau e o martim-pescador escavam os troncos, o joão-de-barro, um hábil construtor, constrói um domo em barro com uma planta-baixa de desenho simples, mas com funções complexas. Uma forma espiralada na qual uma pequena abertura dá acesso ao túnel curvo que conduz à câmara central.

 

FMA – Enfim, os animais são mais engenheiros ou mais arquitetos?

Carlos Fernando – É verdade, alguns animais, mais do que arquitetos, são habilidosos engenheiros ao definir tipos de estruturas, suas formas e funções. Os castores são arquitetos e engenheiros construtores de barragens altamente resistentes. Constroem represas para conter as águas, utilizando-se de seus dentes de roedor e juntando galhos e troncos nas margens dos rios, com efeitos mais positivos menos danosos do que muitas barragens humanas em concreto armado.

 

As formas de arquitetura variam de animal para animal porque as funções referem-se à necessidade de abrigo e defesa, de acordo com o ecossistema. Sobretudo contra os predadores e contra as tempestades. E cada construtor tem suas necessidades e suas habilidades.

 

 

FMA – Por que pássaros da mesma ordem, do mesmo tamanho variam tanto o tipo de seus ninhos?

Carlos Fernando – É porque a arquitetura é forma, função e técnica. As formas de arquitetura variam de animal para animal porque as funções referem-se à necessidade de abrigo e defesa, de acordo com o ecossistema. Sobretudo contra os predadores e contra as tempestades. E cada construtor tem suas necessidades, suas habilidades e busca a melhor forma de proteger os ovos e filhotes. Protegem-se contra flutuações climáticas e mudanças ambientais, regulando temperatura, nível de umidade, danos mecânicos, troca de gases e ventilação. As técnicas dependem das funções e dos materiais, que variam tanto quanto as formas e funções, incluindo materiais naturais como barro, argila, areia, pedras, galhos, palha e fibras. Suas casas não obstruem a comunicação entre o interior e o exterior, permitindo-lhes observar tudo o que acontece à sua volta. Estudos mais acurados e uma observação mais atenta da vida e do comportamento dos pássaros e de outros animais, podem contribuir com novas e valiosas técnicas para o enriquecimento da arquitetura contemporânea. Integrar o projeto arquitetônico à simplicidade e despojamento das formas sustentáveis animais, pode ser uma alternativa à complexidade das construções modernas.

 

 

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