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Bicentenário é momento para Brasil encarar seus problemas, diz historiador

 

Ricardo Westin
Publicado em 12/8/2022

Rubens Ricupero estava lotado como diplomata em Washington quando os Estados Unidos celebraram os 200 anos da Independência, em 1976. Ele lembra que os eventos comemorativos, tanto os do governo quanto os da sociedade, se espalharam pelo país inteiro e puderam ser contados aos milhares.

Neste momento, o Brasil está às vésperas do bicentenário da separação de Portugal, mas Ricupero vê aqui um estado de ânimo bem diferente daquele dos americanos.

— O que eu vejo é uma imensa apatia, como se este aniversário não tivesse relação conosco, não dissesse respeito à nação. Há um vazio — afirma ele, que também é historiador, autor do livro A Diplomacia na Construção do Brasil, titular da Cátedra José Bonifácio, da Universidade de São Paulo (USP), e ex-ministro do Meio Ambiente (1993-1994) e da Fazenda (1994).

O historiador avalia que o aniversário da Independência seria a oportunidade perfeita para a sociedade brasileira fazer um balanço destes 200 anos e, a partir dele, corrigir os rumos para o futuro. Essa oportunidade, no entanto, está sendo perdida. Ele acrescenta:

— O povo não é indiferente. Quem é indiferente à história nacional é o governo, que não sabe ou não quer mobilizá-la em favor de uma reflexão sobre o país.

Leia, a seguir, a entrevista concedida por Ricupero à Agência Senado.

 

O historiador e diplomata Rubens Ricupero (foto: Roque de Sá/Agência Senado)

Por que o bicentenário da Independência precisa ser lembrado?

Por que se trata de uma oportunidade única para fazermos um balanço daquilo que realizamos ao longo destes 200 anos como país e sociedade. Em quais aspectos progredimos? Em quais regredimos? Em quais não saímos do lugar? A partir desse diagnóstico crítico baseado na história, poderemos então desenhar um programa de correção de rumos para o futuro, modificando aquilo que fizemos de errado, passando a agir naquelas questões que deixamos de lado.

Nesse balanço, há muitos aspectos que precisamos levar em conta. A desigualdade social é um deles. Passamos muito tempo fazendo vista grossa para os efeitos da escravidão sobre o presente. É verdade que nos últimos tempos tomamos algumas medidas para combater o racismo estrutural, mas ainda faltam muitas outras. Até hoje uma parcela diminuta da população controla uma grande parte da riqueza. Como podemos mudar essa situação e redistribuir a riqueza nacional? Propostas com esse fim estão há muito tempo engavetadas, como a correção do sistema brasileiro de tributos, que é altamente regressivo e cobra menos dos ricos e mais dos pobres. A democracia é outro aspecto que devemos analisar com atenção, ainda mais neste momento delicado que vivemos. Também devemos olhar o meio ambiente, a educação, a cultura.

Na comemoração do bicentenário, o importante não é lembrar um acontecimento isolado, como o grito do Ipiranga, o momento da separação de Portugal ou o reconhecimento pelo sistema internacional. O que realmente interessa é o que veio depois, estes dois séculos de idas e vindas, avanços e recuos, na formação e no crescimento da nação independente. Em outras palavras, precisamos ver o processo de construção do Brasil, uma obra ainda em andamento.

Esse balanço histórico e esse programa de correção de rumos não poderiam ser feitos em qualquer outro momento?

A vantagem de um aniversário como o da Independência é que se trata de um catalisador. Ele tem a rara capacidade de unir e mobilizar a sociedade inteira num mesmo momento. Já vimos isso em outros lugares. Nos 100 e nos 200 anos da Revolução Francesa, a França fez grandes debates sobre o passado, o presente e o futuro. Em 1889, a Exposição Universal de Paris, que se caracterizou pela construção da Torre Eiffel, foi vista por mais de 32 milhões de pessoas.

Quando os americanos comemoraram os 200 anos da Independência, em 1976, eu era diplomata nos Estados Unidos e me lembro que eles organizaram centenas ou até milhares de iniciativas no país inteiro. O planejamento havia começado dez anos antes, com a criação de uma comissão pelo Congresso. Como o 200º aniversário ocorreu um ano depois do fiasco da retirada americana da Guerra do Vietnã, o governo do presidente Gerald Ford soube instrumentalizar os festejos para reanimar o abatido espírito da nação com uma visão nostálgica e apologética do passado. Um século antes, os americanos haviam organizado na Filadélfia a Exposição do Centenário, em que ocorreu a famosa demonstração do telefone por Alexander Graham Bell ao imperador D. Pedro II. No Brasil de hoje, me espanta não haver nenhum movimento nesse sentido.

 

Sociedade compareceu em peso à Exposição Internacional do Centenário da Independência, em 1922, no Rio de Janeiro (foto: Augusto Malta/Instituto Moreira Salles)

 

O Brasil não está preocupado com os 200 anos da Independência?

Poucas iniciativas alusivas ao bicentenário me vêm à mente. O Senado e a Câmara dos Deputados, por exemplo, organizaram atividades e publicaram livros. A Universidade de São Paulo vai reinaugurar em setembro o Museu do Ipiranga, após anos em obras. Essas iniciativas são isoladas. A Presidência da República, que deveria ser a grande condutora das celebrações nacionais do bicentenário da Independência, praticamente não está se mobilizando. O que eu vejo no Palácio do Planalto é uma imensa apatia, como se este aniversário não tivesse relação conosco, não dissesse respeito à nação. Há um vazio.

Os brasileiros não se interessam pela história nacional?

Eu não diria isso. Há estudos que indicam que os brasileiros gostam da história e se interessam por ela. Uma pesquisa feita no fim de 2021 pelo Ipespe [Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas] por encomenda da Febraban [Federação Brasileira de Bancos] mostrou que a maior parte considera a abolição da escravidão [1888], a Independência [1822], a Proclamação da República [1889] e o fim da ditadura militar [1985] os episódios históricos mais importantes do Brasil. O povo não é indiferente. Quem é indiferente à história nacional é o governo, que não sabe ou não quer mobilizá-la em favor de uma reflexão sobre o país. Está preocupado apenas com o curto prazo. Nem mesmo o Ministério da Educação foi acionado como deveria, para estimular as escolas e universidades a entrar no debate.

O poder público agiu diferente em 1922, no centenário da Independência, não foi?

Sim. Vejo uma diferença brutal em comparação com o centenário. Em 1922, incontáveis atividades foram organizadas no país tanto pelo governo federal, como a Exposição Internacional do Centenário da Independência do Brasil, no Rio de Janeiro, quanto pela própria sociedade, como a Semana de Arte Moderna, em São Paulo. A Exposição do Centenário foi inaugurada pelo presidente Epitácio Pessoa e contou com a participação de 13 países. Além disso, anos antes de 1922 já se falava das comemorações. Para que a Exposição do Centenário pudesse ser montada, o poder público demoliu o Morro do Castelo e construiu os prédios do evento sobre a nova esplanada que se abriu no centro da capital federal. Isso exigiu antecipação, planejamento. Um século atrás, havia uma ansiedade generalizada pela chegada do aniversário do Brasil independente.

Aqueles livros clássicos da década de 1930 com análises revolucionárias sobre o Brasil e os brasileiros, como Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre, e Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda, nasceram das discussões iniciadas no centenário, na década anterior. A criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, também nos anos 1930, foi uma consequência prática daquela efervescência começada em 1922.

Até mesmo no ano 2000 tivemos uma movimentação por ocasião dos 500 anos do Descobrimento, ao contrário de hoje. No ano anterior, o governo criou o Parque Nacional do Descobrimento, no sul da Bahia, a região em que os portugueses desembarcaram em 1500. O Descobrimento foi o início da extinção de muitos dos povos originários e também o começo da escravidão comercial, mas o aniversário passou ao largo dessas questões. Não se incluíram os indígenas e os negros nas discussões e não se debateram transformações sociais para o presente. De qualquer forma, os 500 anos não passaram em branco. Hoje, às vésperas do bicentenário, o país parece estar completamente anestesiado.

 

Imprensa engajada: na edição de 7 de setembro de 1922, o jornal carioca A Noite dedica a primeira página ao centenário da Independência (imagem: reprodução/Biblioteca Nacional Digital)

 

O senhor atribui essa despreocupação com o bicentenário da Independência apenas à falta de liderança do governo?

A maior culpa é do governo, sem dúvida. Mas atribuo essa despreocupação também aos meios de comunicação e à crise que enfrentamos neste momento. Assim como o governo, a mídia tampouco se empenhou em torno do bicentenário. Quando não existe um esforço nacional de esclarecimento, não há como as pessoas comuns saberem do aniversário. Aquela mesma pesquisa de opinião encomendada pela Febraban mostrou que quase 60% da população brasileira não sabe que estamos às vésperas dos 200 anos da Independência.

Quando falo em crise, eu me refiro à política, à econômica e à social nas quais estamos mergulhados há algum tempo, tudo isso agravado pelo trauma da pandemia. O bicentenário coincide com um momento em que os brasileiros estão tomados pelo desalento, pela falta de esperança, e não encontram motivação para comemorar. A autoestima nacional está muito baixa. Além disso, o 7 de setembro cai algumas semanas antes da eleição de 2 de outubro, que é tão decisiva, e tem que concorrer com a reta final da campanha.

Em 1922, o Brasil também vivia uma crise. A eleição presidencial vencida por Artur Bernardes tinha sido tumultuada, havia explodido a primeira das rebeliões tenentistas, o sistema político da Primeira República entrava em colapso e os brasileiros sofriam com a inflação. Apesar de tudo, a sociedade estava esperançosa. Ela tinha consciência do atraso nacional e estava desejosa do progresso e da modernidade.

Em termos práticos, que tipo de consequência o Brasil pode sofrer por deixar o bicentenário da Independência passar em branco?

Quando afirmo que é preciso comemorar o bicentenário, não quero dizer “festejar”, mas sim “trazer à memória”, “recordar o passado”, conforme a origem etimológica da palavra “comemorar”. Atividades meramente ufanistas e autocongratulatórias não levam a lugar nenhum. Elas dão a entender que, como país e sociedade, estamos muito bem e não há nada que precisemos modificar. Esse não é, obviamente, o caso do Brasil. Essa concepção de “comemoração” à qual me refiro nos obriga a confrontar a história em geral como tragédia, a não omitir aniversários abomináveis, os abismos de iniquidade do nazismo, do fascismo, do stalinismo, da colonização, da escravidão, dos genocídios, dos massacres, das ditaduras e das repressões.

Podemos fazer uma comparação com a psicanálise. Como indivíduos, é importante que olhemos para o nosso passado, por mais doloroso que seja, encontremos nele a origem dos traumas que nos perturbam hoje e, partir disso, trabalhemos para superá-los e ter uma vida melhor. Como nação, é a mesma coisa. Se não analisarmos o nosso passado coletivo, não vamos ter consciência crítica dos nossos problemas e, como consequência, nunca vamos superá-los. O bicentenário será, infelizmente, uma oportunidade perdida.

Fonte: Agência Senado

 

 

 

 

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Definidas ações de segurança pública para o Morro da Capelinha

Nesta sexta-feira (29), a partir das 19h, ocorre a encenação da Paixão de Cristo; efetivo das forças estará de prontidão desde o início do dia

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Por Agência Brasília* | Edição: Saulo Moreno

 

O Protocolo de Operações Integradas (POI) para segurança dos participantes e fluidez no trânsito durante a encenação da Paixão de Cristo, nesta sexta-feira (29) em Planaltina, foi concluído, após reuniões de alinhamento.

“Preparamos uma série de medidas necessárias para que a população possa participar com tranquilidade dessa festa religiosa, tão importante para a cultura e economia de Planaltina e de todo o DF. Nos reunimos diversas vezes com os representantes dos órgãos com antecedência, como sempre ocorre nos mais diversos eventos coordenados pela SSP”

Sandro Avelar, secretário de Segurança Pública

O documento foi elaborado sob a coordenação da Secretaria de Segurança do Distrito Federal (SSP), com a participação de representantes das forças de segurança e demais órgãos do Governo do Distrito Federal (GDF) envolvidos, como Administração Regional de Planaltina, SLU, secretarias de Mobilidade (Semob) e de Saúde (SES), Novacap, CEB, Conselho Tutelar, DF Legal e Departamento de Estradas de Rodagem (DER-DF), além de Polícia Rodoviária Federal (PRF).

“Preparamos uma série de medidas necessárias para que a população possa participar com tranquilidade dessa festa religiosa, tão importante para a cultura e economia de Planaltina e de todo o DF. Nos reunimos diversas vezes com os representantes dos órgãos com antecedência, como sempre ocorre nos mais diversos eventos coordenados pela SSP”, ressalta o secretário de Segurança Pública, Sandro Avelar.

Artes: SSP-DF

Para o secretário de Turismo, Cristiano Araújo, a atuação da segurança pública é de extrema importância para a festa religiosa. “A Via Sacra receberá cerca de 100 mil pessoas”, aponta. “São fiéis vindos de todas as regiões administrativas e, até mesmo, de outros estados para a celebração de uma das maiores manifestações religiosas de Brasília. O público conta com todo o apoio da segurança pública para ter uma experiência de paz e tranquilidade. Tenho certeza de que será um espetáculo seguro”.

Cidade Policial

A ação contará com a Cidade da Segurança Pública, estrutura que será montada para abrigar viaturas e equipamentos e servirá como base para o efetivo empregado no dia. Os policiais militares estarão no local a partir das 6h de sexta-feira (30).

Com cerca de 100 mil pessoas presentes no evento, o secretário de Turismo, Cristiano Araújo, considera de extrema importância a atuação da segurança pública para a festa religiosa | Foto: Lúcio Bernardo Jr/Agência Brasília

Haverá um comando móvel da PMDF na Cidade Policial e outro no alto do morro, próximo ao local onde ocorrerá a encenação. Os comandos terão central de rádio e monitoramento, com auxílio de imagens de drones para possíveis intervenções de segurança e melhor emprego do policiamento. Não será permitido o uso de drones particulares no espaço aéreo da celebração.

“O 14º Batalhão, responsável pela área, atuará com apoio de policiais de outras unidades policiais e também as especializadas da corporação, como os batalhões de Trânsito, Cavalaria, Aviação e Rural, BPCães e BPChoque”, explica o chefe do Departamento de Operações (DOP) da PMDF, coronel Wesley Santos.

Postos de atendimento pré-hospitalar

O CBMDF atuará de forma conjunta com a Secretaria de Saúde (SES) em postos de atendimento pré-hospitalar que serão instalados na Cidade da Segurança Pública e distribuídos no local da encenação. Os militares estarão posicionados em guarnições no local da encenação para atendimento e encaminhamento rápido aos postos de atendimento médico, caso necessário. O Corpo de Bombeiros também poderá ser acionado por meio do telefone 193.

Em caso de sol forte e temperaturas elevadas, o CBMDF orienta o uso de roupas leves, protetor solar, bonés ou chapéus. Também é aconselhável ingerir bastante água. A atenção com idosos e crianças deve ser redobrada.

Haverá, ainda, viaturas de salvamento em altura, devido ao local ser muito íngreme, e viaturas de combate a incêndio.

A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) disponibilizará reforço policial nas delegacias de Planaltina e Sobradinho.

Mudanças no trânsito

Para melhor fluidez do trânsito e segurança dos pedestres, serão realizadas intervenções pelos órgãos de trânsito. Todo o local estará sinalizado a partir das 6h. A divisão de ações é importante para que toda a região esteja organizada.

A DF-230, principal via de acesso ao morro, terá sentido único a partir das 12h, no trecho entre a DF-128 seguindo pela DF-230 até a DF-130. Ao término, por volta das 21h, a rodovia terá sentido único do Morro da Capelinha até a DF-130 e duplo sentido na DF-128/BR-020.

A PMDF ficará responsável pela DF-230 e atuará para garantir a fluidez do trânsito nas vias externas ao Morro da Capelinha, junto ao DER. A PRF ficará responsável pela BR-020. Devido ao grande número de veículos e à proximidade do local do evento com a rodovia federal, a atuação da PRF será essencial.

O primeiro acesso ao Morro da Capelinha será destinado aos pedestres, que seguirão uma rota própria, e a veículos credenciados. Já no segundo acesso será permitida a entrada de ônibus e demais veículos. Nesse ponto, os agentes de trânsito vão orientar os condutores a seguirem para um dos três locais de estacionamento – o geral, o destinado à produção e a figurantes, e o reservado, para pessoas com mobilidade reduzida e idosos, que deverão apresentar a credencial especial. No segundo acesso ao morro também haverá uma rota de emergência.

“O Detran fará a sinalização e o controle de veículos e de pedestres nas quatro vias internas de acesso ao morro. Uma delas será exclusiva para pedestres. As demais serão destinadas ao trânsito de veículos, situações de emergência e para a produção do evento. É importante que os condutores observem a sinalização e fiquem atentos à presença de pedestres nas vias para evitar riscos de sinistros de trânsito”, ressalta o diretor de Policiamento e Fiscalização do Detran-DF, Clever Farias.

Os órgãos de trânsito recomendam que os motoristas cheguem com antecedência e observem a sinalização, o direcionamento dos agentes e estacionem em locais permitidos, para não comprometer o fluxo de pedestres e, principalmente, de veículos de emergência.

*Com informações da SSP-DF

 

 

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Nascimentos no país atingem em 2022 menor patamar em 45 anos

Segundo o IBGE, foram registrados 2,54 milhões de nascimentos

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O Brasil registrou 2.542.298 nascimentos em 2022, segundo dados das Estatísticas de Registro Civil divulgadas nesta quarta-feira (27) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O número é 3,5% menor do que o registrado em 2021 (2.635.854) e 10,8% abaixo da média dos dez anos antes da pandemia de covid-19, de 2010 a 2019 (2.850.430). Essa é a quarta redução consecutiva nos nascimentos registrados, que atingiram o menor patamar desde 1977, ou seja, em 45 anos.

“A redução da natalidade e da fecundidade no país, já sinalizada pelos últimos censos demográficos, somada, em alguma medida, aos efeitos da pandemia, são elementos a serem considerados no estudo sobre a evolução dos nascimentos ocorridos no Brasil nos últimos anos”, afirma a pesquisadora do IBGE Klívia Brayner

Foram observadas quedas, de 2021 para 2022, em todas as regiões do país, com destaques para as regiões Nordeste (-6,7%) e Norte (-3,8%). Entre as 25 unidades da Federação, as principais reduções ocorreram na Paraíba (-9,9%), no Maranhão (-8,5%), em Sergipe (-7,8%) e no Rio Grande do Norte (-7,3%).

Os únicos estados com aumento no número de nascimentos no período foram Santa Catarina (2,0%) e Mato Grosso (1,8%).

Os meses com maiores números de nascimentos registrados em 2022 foram março (233.177) e maio (230.798). Outubro registrou o menor número: 189.003.

O IBGE também constatou que houve recuo na participação das mães com até 29 anos entre o total de nascimentos, entre 2000 e 2022. Por outro lado, as mães com 30 anos ou mais aumentaram sua participação.

De acordo com os dados apresentados nesta quarta-feira, as mães com menos de 20 anos respondiam por 21,6% dos nascimentos em 2000, passando para 18,5% em 2010 e para 12,1% em 2022. A mesma tendência ocorreu com as mães entre 20 e 29 anos, que passaram de 54,5% em 2000, para 53,1% em 2010 e 49,2% em 2022.

A parcela das mães com 30 a 39 anos, por outro lado, subiu de 22% em 2000 para 26,1% em 2010 e 34,5% em 2022. As mães com 40 anos ou mais respondiam por 2% dos nascimentos em 2000, passando para 2,3% em 2010 e 4,2% em 2022.

O total de nascimentos ocorridos e não registrados no Brasil em 2021 foi estimado em 55.511, ou seja, 2,1% do total.

Óbitos

A pesquisa também revelou que o Brasil registrou 1,5 milhão de mortes em 2022, uma queda de 15,8%, ou seja, 281,5 mil a menos em relação ao ano anterior. A queda das mortes é um efeito da imunização da população contra a covid-19.

O ano de 2021 tinha registrado recorde de mortes (1,78 milhão), na série histórica da pesquisa, iniciada em 1974. Ainda assim, 2022 teve aumento dos óbitos em relação a 2019, ano pré-pandemia (1,31 milhão de mortes).

No início de 2022, a covid-19 ainda afetou o número de mortes, devido à variante ômicron. Janeiro teve um total de 161,18 mil óbitos, o quinto mês com maior mortalidade da pandemia, ficando atrás apenas do período de março a junho de 2021.

Um dado que chama a atenção em relação a 2022 é o aumento do número de mortes para a população com menos de 15 anos. O crescimento chegou a 7,8% em relação a 2021 para as pessoas com até 14 anos. Entre as crianças de 1 a 4 anos, a alta foi ainda maior (27,7%).

Para Klívia, o aumento das mortes nessa faixa etária pode ter relação com a vacinação tardia de crianças e adolescentes contra a covid-19, já que entre as principais causas dos óbitos estão doenças respiratórias como gripe, pneumonia, bronquiolite e asma.

Edição: Graça Adjuto

ebc

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Câmara aprova projeto que altera a Lei de Falências

Texto segue para o Senado

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Dani Cunha: a proposta vai garantir celeridade no processo falimentar

A Câmara dos Deputados aprovou proposta que muda a Lei de Falências para incluir a formulação de um plano de falência, a figura do gestor fiduciário e agilizar a venda dos bens da massa falida. O texto será enviado ao Senado.

Foi aprovado o substitutivo da relatora, deputada Dani Cunha (União-RJ), para o Projeto de Lei 3/24, do Poder Executivo. Ela afirmou que a proposta vai garantir celeridade, desburocratizar e moralizar o processo falimentar. “Posso citar o exemplo de famosas falências que estão em curso há mais de 20 anos”, disse.

A relatora fez novas alterações no texto depois de reunião na residência oficial da Presidência da Câmara com líderes partidários e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Dani Cunha explicou que o texto foi feito a muitas mãos, com muitos acordos que revelam o espírito da democracia. “A gente consegue ver um consenso: a necessidade de moralizar a pauta da falência no Brasil.”

O texto da relatora faz diversas mudanças na proposta do governo e na Lei de Falências, tratando de tópicos como mandato do administrador judicial, sua remuneração e uso de créditos de precatórios.

Créditos trabalhistas
A proposta determina ainda que os valores de créditos de natureza trabalhista, apurados pela Justiça trabalhista, terão seu pedido de pagamento processado apenas no juízo falimentar, proibindo qualquer ato de execução, cobrança, penhora ou arresto de bens por parte da vara trabalhista.

Por outro lado, aumenta de 150 para 200 salários mínimos por credor o limite de créditos que o trabalhador poderá receber da massa falida em primeiro lugar.

Créditos da Fazenda Pública
Em relação aos créditos da Fazenda Pública, a serem apresentados junto aos pendentes de definição (exigibilidade suspensa, por exemplo), o governo credor deverá informar ao devedor memória de cálculo com o maior desconto possível que poderia ser obtido em programas de incentivo à regularização ou de transação tributária vigentes.

Caberá à assembleia-geral de credores escolher o gestor fiduciário, com atribuições de elaborar o plano de falência e levar adiante a venda de bens para satisfazer as despesas com o processo falimentar e pagar os credores segundo suas classes de preferência. O administrador judicial da falência somente atuará se a assembleia de credores não eleger um gestor.

Debate em Plenário
O líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE), afirmou que o projeto aperfeiçoa o sistema tributário e de gestão fiscal do Executivo. “Estamos dando condições ao País para dar sustentabilidade ao crescimento da economia brasileira com gestão eficiente e compromisso republicano do governo”, disse.

A deputada Erika Kokay (PT-DF) afirmou que a proposta agiliza o processo de falências e as condições de os credores serem atendidos. “Hoje a empresa entra em falência e não honra com seus compromissos. As dívidas precisam ser pagas para se fazer valer os direitos.”

Para a líder da Minoria, deputada Bia Kicis (PL-DF), “o projeto tem o potencial para abreviar as falências”. Segundo ela, o texto propõe algo melhor que os processos falimentares atuais, prolongados por décadas.

Para o deputado Merlong Solano (PT-PI), o texto desburocratiza o processo de falência, diminui a judicialização, aumenta a participação dos credores nas decisões e preserva a prioridade dos créditos trabalhistas. “Os salários dos trabalhadores eventualmente prejudicados ficam na linha de frente do processo de recebimento dos valores dos credores”, ressaltou.

Já o deputado Gilson Daniel (Pode-ES) foi contra o texto por acreditar que a mudança não beneficia os trabalhadores. “Muitas empresas que poderiam ser recuperadas, com essa nova lei, vão abrir falência, pois os credores vão querer a falência dela”, disse.

Ele também reclamou da falta de discussão da proposta em relação a outras mudanças de anos anteriores sobre a Lei de Falências.

Plano de falência
Nos atos de avaliação dos bens, o gestor ou administrador judicial poderá contratar avaliadores para bens de valor igual ou superior a mil salários mínimos (cerca de R$ 1,4 milhão). Será permitido ainda vender os bens em prazo diferente dos 180 dias atuais se aprovado no plano de falência.

Mário Agra/Câmara dos Deputados
Discussão e votação de propostas.
Deputados aprovaram o projeto na sessão do Plenário desta terça-feira

Esse plano deverá conter proposta de gestão dos recursos da massa falida, detalhes da estratégia de venda dos bens encontrados e ações a tomar quanto aos processos judiciais, administrativos ou arbitrais em andamento.

O plano poderá tratar ainda de pontos como:

  • a compra dos bens da massa falida com os créditos dos credores;
  • a transferência dos bens da massa falida a uma nova sociedade com participação dos credores; e
  • a sugestão de descontos para receber os créditos, desde que aprovados pela respectiva classe de credores, exceto quanto aos créditos fiscais e do FGTS.

Entretanto, o plano não poderá prever a concessão automática ou discricionária de descontos em relação aos devedores, seja em juízo ou fora dele.

Outro plano
Credores que representem, no mínimo, 10% do total de créditos contra a massa falida poderão se opor ao plano de falência. Nesse caso, ele terá de ser deliberado pela assembleia-geral de credores, e a classe para a qual não haja expectativa de recebimento de valores não terá direito a voto.

O plano de falência não dependerá do consentimento do falido e poderá ser alterado na assembleia por iniciativa do gestor ou administrador judicial ou por propostas alternativas apresentadas por credores que detenham, no mínimo, 15% dos créditos presentes na reunião.

Remuneração do gestor
Sobre a remuneração desses administradores judiciais e dos gestores, em vez do máximo de 5% dos créditos envolvidos, como a lei prevê atualmente, o texto de Dani Cunha propõe três limites diferentes a serem levados em conta pelo juiz.

Um deles prevê um escalonamento do percentual dos créditos envolvidos:

  • 2% para valores totais acima de 400 mil salários mínimos;
  • 3% se maior que 100 mil salários e menor que 400 mil;
  • 4% quando entre 50 mil e 100 mil salários; e
  • 5% no caso de créditos abaixo de 50 mil salários mínimos.

Outro limite será um teto de 10 mil salários mínimos (R$ 14,12 milhões) para a totalidade das remunerações devidas à administração judicial, incluindo substituições e pessoal da equipe.

O terceiro será o teto do funcionalismo federal, atualmente em R$ 44 mil, quando a remuneração for destinada a administrador pessoa física.

O administrador que tiver as contas desaprovadas não terá direito à remuneração.

Mandato do administrador
O texto aprovado prevê mandato de três anos para o administrador judicial nomeado pelo juiz para conduzir o processo falimentar. Esse administrador, seja na falência ou na recuperação judicial, não poderá assumir mais de um processo com dívidas de 100 mil salários mínimos ou mais em até dois anos do término de seu mandato anterior perante o mesmo juízo.

Essa proibição de acúmulo de funções em diferentes processos não se aplica caso o administrador judicial conclua os trabalhos em três anos.

O administrador judicial ou gestor fiduciário que já tenha exercido anteriormente essa função na recuperação judicial de determinada empresa não poderá atuar na condução do processo de falência dessa empresa.

Ele não poderá contratar parentes ou familiares até o 3º grau, sejam seus ou de magistrados e membros do Ministério Público atuantes em varas de falência.

Comitê de credores
Quanto ao comitê de credores, o projeto prevê a inclusão de um representante da Fazenda Pública. Esse comitê examinará o plano de falência, emitindo parecer; examinará propostas de acordo; e avaliará a necessidade de substituição do gestor.

A fiscalização das atividades do devedor e dos atos do gestor fiduciário ou administrador judicial poderá ser realizada individualmente por qualquer membro do comitê, com acesso amplo e irrestrito a documentos e informações.

Se a assembleia-geral assim decidir, o comitê poderá assumir função deliberativa para garantir maior rapidez na elaboração e execução do plano de falência.

Quórum
Para a realização das assembleias de credores, a relatora diminuiu o intervalo entre duas convocações sucessivas, passando de cinco dias para uma hora.

Já o quórum será de mais da metade do valor dos créditos presentes e mais da metade da maioria numérica de credores presentes.

No caso permitido pela lei, de substituição das deliberações da assembleia-geral por documento de adesão assinado pelos credores, o quórum passa de mais da metade dos créditos para metade desses créditos e a maioria numérica de credores.

No entanto, na autorização de forma alternativa de realização de ativo na falência, como a transformação de dívida em participação no capital, o quórum passa de 2/3 dos créditos para mais da metade dos créditos e maioria numérica dos credores.

Recuperação judicial
Na recuperação judicial, o texto muda de cinco para dois anos o intervalo mínimo entre duas recuperações judiciais sucessivas pedidas pela mesma empresa. O prazo poderá ser dispensado se todos os credores sujeitos ao procedimento anterior tiverem seus créditos totalmente liquidados.

O texto proíbe a inclusão em nova recuperação judicial de créditos vindos de recuperação judicial anterior do mesmo devedor.

Os contratos e as obrigações decorrentes de atos cooperativos estarão excluídos da recuperação judicial.

Isenção de imposto
No caso de liquidação judicial, extrajudicial ou falência, a proposta prevê a isenção do imposto de renda sobre o capital no lucro obtido com a venda de bens e direitos do ativo da empresa (como prédios, por exemplo) a fim de pagar os credores.

Bens pessoais do devedor
Sobre a desconsideração da personalidade jurídica, mecanismo usado para buscar, em certas circunstâncias, bens pessoais dos proprietários e administradores da empresa falida para pagar as dívidas, o projeto prevê que seu uso favorecerá a todos os credores. Entretanto, não serão permitidas a extensão da falência a outras empresas ou a ampliação dos beneficiários ou mesmo a ampliação da responsabilidade pela dívida a pessoas que não tenham promovido o incidente que motivou o uso desse mecanismo.

A mudança atinge os casos previstos inclusive no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor.

Uso de precatórios
O texto aprovado permite ainda o uso de qualquer direito creditório contra o poder público, como precatórios, para pagar os credores, contanto que seja pelo seu valor de face.

Um desconto poderá ser aplicado se aprovado por ¾ do número de presentes em assembleia e por igual fração dos créditos devidos pela massa falida.

Depois de deduzidas todas as dívidas de credores perante os Fiscos, os direitos creditórios poderão ser cedidos aos credores por valor aceito em assembleia.

Essa cessão obedecerá a seguinte ordem:

  • créditos trabalhistas;
  • créditos com garantia real, se o credor liberar o bem para venda;
  • créditos tributários, exceto extraconcursais e multas tributárias;
  • demais créditos.

De maneira semelhante, Dani Cunha propôs o uso de direitos creditórios privados, como debêntures emitidas por outras empresas e em posse da massa falida. Nesse caso, o valor a ser usado será o da última avaliação do título, se ela tiver ocorrida há menos de dois anos, valendo a decisão da assembleia com igual quórum dos precatórios para a aceitação de desconto.

Os direitos creditórios, sejam contra o setor público ou privado, poderão fazer parte de fundo ou outro tipo de investimento na conversão de dívida em participação no capital.

Leilão
Em relação aos procedimentos de leilão de bens da massa falida, o texto permite a credores com valores a receber inferiores ao valor da avaliação se unirem para a compra do bem ou mesmo inteirar o restante com outros recursos de que disponham.

Falências em andamento
Para as falências ou recuperações judiciais em curso, o projeto permite soluções diferentes, com os limites de remuneração dos administradores judiciais valendo imediatamente.

Nas recuperações judiciais, o juiz deverá confirmar ou substituir o administrador atual, que terá mandato de três anos a partir de então.

Em falências com processos de menos de três anos, o administrador ficará na função até se completar esse tempo. Naquelas com mais de três anos e menos de seis anos de processo, a assembleia de credores deverá decidir pela continuidade ou não do administrador pelo período restante até se alcançar os seis anos.

Finalmente, para aqueles processos com mais de seis anos e ainda em andamento, o juiz deverá nomear novo administrador.

Lei de transação
O substitutivo de Dani Cunha muda ainda a Lei das Transações (Lei 13.988/20) para aplicar descontos máximos aos créditos devidos ao Fisco e considerados sem controvérsia no âmbito de processos de recuperação judicial, liquidação judicial ou extrajudicial e falência. As regras se aplicam ainda às sociedades em recuperação extrajudicial.

Assim, valerão nessas situações:

  • desconto de 65% do valor total dos créditos objeto da transação ou de 70% se for microempresa ou empresa de pequeno porte quando a dívida ativa decorrer de processo administrativo encerrado ou ação judicial transitada em julgado;
  • possibilidade de uso de direitos creditórios contra a União (como precatórios cedidos por terceiros) para antecipar a liquidação do crédito e abater do total apurado;
  • uso de prejuízo fiscal e de base negativa da CSLL para abater 70% do saldo remanescente da dívida após aplicados os descontos.

Outros pontos
Confira outros pontos do Projeto de Lei 3/24:

  • o falido não terá mais direito a acompanhar a avaliação dos bens;
  • credores não precisarão mais seguir valor de avaliação para comprar bens da massa falida com seus créditos no processo falimentar;
  • acaba com a necessidade de avaliação para a venda antecipada de bens perecíveis, deterioráveis ou sujeitos a considerável desvalorização;
  • o falido poderá fiscalizar a administração da massa falida de forma ampla, requerer providências para conservar direitos e bens da empresa e apresentar recursos.

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Reportagem – Eduardo Piovesan e Tiago Miranda
Edição – Pierre Triboli

Fonte: Agência Câmara de Notícias

 

 

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