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Preço da ingenuidade
Eleitores também deveriam ter direito a reclamar no Procon
Silvestre Gorgulho
Eu nunca vi um produto tão forte, com uma demanda tão ampla, com interesse além das fronteiras, consumido diretamente por toda população, que tem até reserva de mercado, mas que vem sem garantia de fábrica.
Eu nunca vi um produto tão sensível à sobrevivência e aos sonhos dos consumidores, tão desejado, tão cobiçado, tão cheio de charme, tão disputado e que chega ao mercado sem as mínimas recomendações de um programa de Qualidade Total.
Eu nunca vi um produto tão vendido, dado, emprestado, tão superfaturado, que use tanto dinheiro em propaganda, promoções e marketing e que, por cima, cada cidadão ainda tem a obrigação de adquiri-lo compulsoriamente, mas que não é regido por um Código de Defesa do Consumidor.
Eu nunca vi um produto tão pouco confiável, tão frágil, tão efêmero, tão fugaz, tão quebradiço, tão questionável, que pode lhe trazer tantos aborrecimentos, mas que não tem nenhuma cobertura de apólice de Seguro.
Eu nunca vi – acredite meu amigo – um produto que é tão importante, tão nobre e tão necessário, mas vale menos que um rádio-relógio comprado ali na Feira do Paraguai, onde o dono da barraca dá o seu cartão e diz: “Se o senhor não ficar satisfeito, pode trazer que eu troco”.
Eu nunca vi um produto cujo responsável promete maravilhas, perfeição, promete até a saúde, um produto que anuncia só trazer alegrias, mas que se adquire sem o direito, ao menos, de testá-lo.
E qual é esse produto super-utilizável, de mil e uma utilidades que não dá direito à reclamações no Procon, no Inmetro e nem ao Bispo? É o tal do candidato político.
Eu nunca vi uma avalanche tão grande de candidatos que entram na sua casa de todas as maneiras – pela televisão, pelo rádio, pelo jornal, pela correspondência postal, pelo telefone, batendo na porta – diz o que você quer ouvir, concorda com suas opiniões, promete o impossível, leva o seu voto e vai embora… para só voltar daí a quatro anos.
Tudo bem, o voto é livre. Mas o que não pode ficar livre é aquele que iludiu. Aquele que prometeu e não cumpriu. Aquele que aproveitou da mídia gratuita, da mídia paga, da reserva de mercado, da boa vontade e até ingenuidade dos outros para vender sonhos e ilusões.
Mais do que nunca, as candidaturas fazem parte de um jogo de mercado. Como uma Bolsa de Valores que às vezes cai, às vezes sobe, dependendo das promessas do FMI quanto ao dinheiro que vai entrar. A candidatura de um político requer hoje tanta propaganda, tanto jogo de marketing, tanto profissionalismo e ficou tão sofisticada que foi entregue aos marketeiros. Candidato virou produto de ocasião: é vendido bem embalado, pois as promessas (ou surpresas) virão quando desembalar. E quando será aberto? Na posse do mandato. Ai não dá mais para reclamar pela garantia de fábrica, exigir Qualidade Total e muito menos tentar uma devolução.
Sem um órgão de defesa do eleitor, o que fazer? Difícil, pois o Estado não protege candidatos contra os defeitos de fabricação e a Igreja nem condena os mentirosos de palanque. Depois de eleito, cada um vai tratar de seu mandato e está muito longe da promessa mais frinchim que qualquer boteco faz hoje para manter uma relação de confiança com sua clientela: satisfação garantida ou o dinheiro de volta. A venda de remédio falso para o corpo é crime hediondo, o que está certo. Imagina só, o que se vende de remédio falso para a alma numa eleição! Então, como se proteger? O mais simples é o próprio eleitor, abrir bem o olho, acreditar que um pequenino pássaro nas mãos ainda tem muito mais futuro, procurar dar o troco a cada eleição e criar seu código de defesa particular. E a base deste código é um só, anunciado várias vezes pelo argentino Jorge Luiz Borges: “Todo eleitor, como todo consumidor, deve deixar de viver na era da estupidez e da ingenuidade. É incrível, mas vive-se num tempo tão ingênuo que as pessoas compram produtos cuja excelência é anunciada somente por quem os vende”.





Cenário considera impacto do ritmo de exploração agropecuária no bioma
O Cerrado pode perder 33,9% dos fluxos dos rios até 2050, caso o ritmo da exploração agropecuária permaneça com os níveis atuais. Diante da situação, autoridades e especialistas devem dedicar a mesma atenção que reservam à Amazônia, uma vez que um bioma inexiste sem o outro. O alerta para situação é do fundador e diretor executivo do Instituto Cerrados, Yuri Botelho Salmona. Nesta terça-feira (22), é celebrado o Dia Mundial da Água, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Salmona mensurou o efeito da apropriação da terra para monoculturas e pasto, que resultou em artigo publicado na revista científica internacional Sustainability. A pesquisa contou com o apoio do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN).
Ao todo, foram analisadas 81 bacias hidrográficas do Cerrado, no período entre 1985 e 2022. Segundo o levantamento, a diminuição da vazão foi constatada em 88% delas em virtude do avanço da agropecuária.
A pesquisa indica que o cultivo de soja, milho e algodão, assim como a pecuária, têm influenciado o ciclo hidrológico. O estudo também evidencia que mudanças do uso do solo provocam a redução da água em 56% dos casos. O restante (44%) está associado a mudanças climáticas.
“Quando eu falo de mudança de uso de solo, a gente está, no final das contas, falando de desmatamento e o que você coloca em cima, depois que você desmata”, disse Saloma, em entrevista à Agência Brasil. Segundo o pesquisador, o oeste da Bahia é um dos locais onde o cenário tem mais se agravado.
Quanto às consequências climáticas, o pesquisador explica que se acentua a chamada evapotranspiração potencial. Salmona explicou ainda que esse é o estudo com maior amplitude já realizado sobre os rios do Cerrado.
“O que está aumentando é a radiação solar. Está ficando mais quente. Você tem mais incidência, está ficando mais quente e você tem maior evaporação do vapor, da água, e é aí em que a mudança climática está atuando, muito claramente, de forma generalizada, no Cerrado. Em algumas regiões, mais fortes, como o Maranhão, Piauí e o oeste da Bahia, mas é geral”, detalhou.
Chuvas
Outro fator que tem sofrido alterações é o padrão de chuvas. Conforme enfatizou Salmona, o que se observa não é necessariamente um menor nível pluviométrico.
“A gente viu que lugares onde está chovendo menos não é a regra, é a exceção. O que está acontecendo muito é a diminuição dos períodos de chuva. O mesmo volume de água que antes caía em quatro, cinco meses está caindo em dois, três. Com isso, você tem uma menor capacidade de filtrar essa água para um solo profundo e ele ficar disponível em um período seco”, comentou.
Uma das razões que explica o efeito de reação em cadeia ao se desmatar o cerrado está no fato de que a vegetação do bioma tem raízes que se parecem com buchas de banho, ou seja, capazes de armazenar água. É isso que permite, nos meses de estiagem, que a água retida no solo vaze pelos rios. Segundo o pesquisador, em torno de 80% a 90% da água dos rios do bioma tem como origem a água subterrânea.
Edição: Heloisa Cristaldo
EBC



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