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Cultura, meio ambiente e a felicidade

Ceará ganha primeiro Geopark das Américas na Chapada do Araripe

Silvestre Gorgulho


Meio ambiente é algo tão amplo e tão abrangente que dentro dele cabe tudo. Até a busca pela felicidade. Não há como ser feliz, num ambiente degradado, triste e caótico. Há tempos, fiz um projeto junto ao Ministério da Cultura para buscar, pela Lei Rouanet, algum suporte de incentivo para um empreendimento ambiental. Em vão. O projeto não foi aprovado sob a alegação de que meio ambiente não é cultura e sim educação. Não concordo.


Que me perdoem os burocratas, mas meio ambiente e cultura são conceitos indissociáveis. De nada vale investir em um, sem se considerar o outro. Abordo esse tema, a propósito da inauguração, agora dia 4 de dezembro, do Geopark do Araripe. Um parênteses: buscando uniformizar a nomenclatura, a Unesco universalizou o grafia Geopark com k. Existem apenas 37 geoparques no mundo e o Geopark do Araripe é o primeiro das Américas. Mas o que é um Geopark? É um novo conceito da Unesco para áreas protegidas, portadoras de pontos de interesse geológico, paleontológico e de importância científica e cultural. Está muito próximo ao conceito de paisagem cultural. Valorizar uma paisagem cultural significa valorizar o meio natural ao qual o ser humano imprimiu marcas de suas ações e formas de expressão.


É resultado de uma soma de todas as expressões resultantes da interação do homem com a natureza. E vice-versa. A Lei da Ação Civil Pública do Ministério Público considera e protege a paisagem cultural como bem difuso, equiparando-a ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. No conhecimento e na defesa deste fantástico patrimônio deve haver, também, uma postura de ética e solidariedade, pois ao conceito ambiental de diversidade biológica corresponde o conceito de pluralidade cultural.


A ética e a solidariedade estão, justamente, na convivência e no compartilhamento de oportunidades entre o ser humano e todos os outros seres vivos. Todos os recursos da natureza estão à disposição do ser humano, mas há uma postura – no mínimo racional – de somente se apropriar daqueles que sejam indiscutivelmente indispensáveis à sobrevivência. E mais: o ser humano depende não apenas desses recursos, mas também do conhecimento que a humanidade acumulou sobre seus usos. Daí a importância de se lutar pela preservação conjunta dos recursos naturais, pela proteção da memória e de todas as manifestações que formam o patrimônio cultural de um povo. São as paisagens, os saberes e folclores, criados e recriados através do tempo, que formam heranças e acervos de valor inatingível. É por força da ética e da solidariedade que a crise ambiental planetária está extremamente ligada à crise cultural. Mas por que a Chapada do Araripe foi incluída na rede de Geoparks da Unesco?


A etnóloga Olga Paiva, chefe do Iphan em Fortaleza – ela é prima do nosso B. de Paiva – explica: primeiro porque nas entranhas do Araripe estão os mistérios e segredos da vida na Terra. Segundo, porque nesta área de 10 mil km2 estão mais de 20 ordens diferentes de insetos fossilizados, com idade entre 70 e 120 milhões de anos, e um terço de todos os répteis alados (pterossauros) descritos no planeta. Amigo leitor, isto prova que as terras brasileiras são verdadeiramente sagradas. A exuberância da floresta amazônica ainda resiste a 506 anos de exploração e ocupação desordenada. O Brasil detém 12% da reserva mundial de água doce. E, agora, o mundo passou a admirar e estudar o maior depósito de fósseis do Planeta, justamente na bacia sedimentar do Araripe. Mas voltemos à questão inicial: o meio ambiente também pode gerar felicidade. Aqui vale lembrar a Prêmio Nobel, Pearl Buck, que bem resumiu tudo isso. Muita gente, diz a escritora, perde a oportunidade de ser feliz porque fica aguardando a grande felicidade e desperdiça as pequenas alegrias. Preservar o patrimônio cultural é preservar o meio ambiente. Mais: é dar oportunidades materiais a um povo e devolver-lhe a auto-estima. É fazê-lo feliz.

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Dia Mundial da Água

Cerrado pode perder quase 34% da água até 2050

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Cenário considera impacto do ritmo de exploração agropecuária no bioma

 

O Cerrado pode perder 33,9% dos fluxos dos rios até 2050, caso o ritmo da exploração agropecuária permaneça com os níveis atuais. Diante da situação, autoridades e especialistas devem dedicar a mesma atenção que reservam à Amazônia, uma vez que um bioma inexiste sem o outro. O alerta para situação é do fundador e diretor executivo do Instituto Cerrados, Yuri Botelho Salmona. Nesta terça-feira (22), é celebrado o Dia Mundial da Água, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Salmona mensurou o efeito da apropriação da terra para monoculturas e pasto, que resultou em artigo publicado na revista científica internacional Sustainability. A pesquisa contou com o apoio do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN).

Ao todo, foram analisadas 81 bacias hidrográficas do Cerrado, no período entre 1985 e 2022. Segundo o levantamento, a diminuição da vazão foi constatada em 88% delas em virtude do avanço da agropecuária.

A pesquisa indica que o cultivo de soja, milho e algodão, assim como a pecuária, têm influenciado o ciclo hidrológico. O estudo também evidencia que mudanças do uso do solo provocam a redução da água em 56% dos casos. O restante (44%) está associado a mudanças climáticas.

“Quando eu falo de mudança de uso de solo, a gente está, no final das contas, falando de desmatamento e o que você coloca em cima, depois que você desmata”, disse Saloma, em entrevista à Agência Brasil. Segundo o pesquisador, o oeste da Bahia é um dos locais onde o cenário tem mais se agravado.

Quanto às consequências climáticas, o pesquisador explica que se acentua a chamada evapotranspiração potencial. Salmona explicou ainda que esse é o estudo com maior amplitude já realizado sobre os rios do Cerrado.

“O que está aumentando é a radiação solar. Está ficando mais quente. Você tem mais incidência, está ficando mais quente e você tem maior evaporação do vapor, da água, e é aí em que a mudança climática está atuando, muito claramente, de forma generalizada, no Cerrado. Em algumas regiões, mais fortes, como o Maranhão, Piauí e o oeste da Bahia, mas é geral”, detalhou.

Chuvas

Outro fator que tem sofrido alterações é o padrão de chuvas. Conforme enfatizou Salmona, o que se observa não é necessariamente um menor nível pluviométrico.

“A gente viu que lugares onde está chovendo menos não é a regra, é a exceção. O que está acontecendo muito é a diminuição dos períodos de chuva. O mesmo volume de água que antes caía em quatro, cinco meses está caindo em dois, três. Com isso, você tem uma menor capacidade de filtrar essa água para um solo profundo e ele ficar disponível em um período seco”, comentou.

Uma das razões que explica o efeito de reação em cadeia ao se desmatar o cerrado está no fato de que a vegetação do bioma tem raízes que se parecem com buchas de banho, ou seja, capazes de armazenar água. É isso que permite, nos meses de estiagem, que a água retida no solo vaze pelos rios. Segundo o pesquisador, em torno de 80% a 90% da água dos rios do bioma tem como origem a água subterrânea.

Edição: Heloisa Cristaldo

EBC

 

 

 

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VENTO DA ARTE NOS CORREDORES DA ENGENHARIA

Lá se vão 9 anos. Março de 2014.

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No dia 19 de março, quando o Sinduscon – Sindicato das Indústrias da Construção Civil do DF completava 50 anos, um vendaval de Arte, Musica, Pintura adentrou a casa de engenheiros, arquitetos e empresários e escancarou suas portas e janelas para a Cultura.
Para que o vento da arte inundasse todos seus corredores e salões, o então presidente Júlio Peres conclamou o vice Jorge Salomão e toda diretoria para provar que Viver bem é viver com arte. E sempre sob as asas da Cultura, convocou o artista mineiro Carlos Bracher para criar um painel de 17 metros sobre vida e obra de JK e a construção de Brasília. Uma epopeia.
Diretores, funcionários, escolas e amigos ouviram e sentiram Bracher soprar o vento da Arte durante um mês na criação do Painel “DAS LETRAS ÀS ESTRELAS”. O mundo da engenharia, da lógica e dos números se transformou em poesia.
Uma transformação para sempre. Um divisor de águas nos 50 anos do Sinduscon.
O presidente Julio Peres no discurso que comemorou o Cinquentenário da entidade e a inauguração do painel foi didático e profético:
“A arte de Carlos Bracher traz para o este colégio de lideranças empreendedoras, a mensagem de Juscelino Kubitschek como apelo à solidariedade fraterna e à comunhão de esforços. Bracher é nosso intérprete emocionado das tangentes e das curvas de Oscar Niemeyer e Lucio Costa. Nos lances perfomáticos de seu ímpeto criador, Bracher provocou um espetáculo de emoções nas crianças, professores, convidados, jornalistas e em nossos funcionários.
Seus gestos e suas pinceladas de tintas vivas plantaram sementes de amor à arte. As colheitas já começaram.”
Aliás, as colheitas foram muitas nesses nove anos e serão ainda mais e melhor na vida do Sinduscon. O centenário da entidade está a caminho…
Sou feliz por ter ajudado nessa TRAVESSIA.
SG
Fotos: Carlos Bracher apresenta o projeto do Painel. Primeiro em Ouro Preto e depois visita as obras em Brasília.
Na foto: Evaristo Oliveira (de saudosa Memória) Jorge Salomão, Bracher, Julio Peres, Tadeu Filippelli e Silvestre Gorgulho
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METÁFORAS… AH! ESSAS METÁFORAS!

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Sou fascinado com uma bela metáfora. Até mesmo porque não há poesia sem metáfora. Clarice Lispector é a rainha das metáforas. Maravilhosa! Esta figura de linguagem é uma poderosa forma de comunicação. É como a luz do sol: bate n’alma e fica.
Incrível, mas uma das mais belas metáforas que já li é de um naturalista e geógrafo alemão chamado Alexander Von Humbolt, fundador da moderna geografia física e autor do conceito de meio ambiente geográfico. [As características da fauna e da flora de uma região estão intimamente relacionadas com a latitude, relevo e clima]
Olha a metáfora que Humbolt usou para expressar seu encantamento pelo espetáculo dos vagalumes numa várzea em terras brasileiras.
“OS VAGALUMES FAZEM CRER QUE, DURANTE UMA NOITE NOS TRÓPICOS, A ABÓBODA CELESTE ABATEU-SE SOBRE O PRADOS”.
Para continuar no mote dos vagalumes ou pirilampos tem a música do Jessé “Solidão de Amigos” com a seguinte estrofe:
Quando a cachoeira desce nos barrancos
Faz a várzea inteira se encolher de espanto
Lenha na fogueira, luz de pirilampos
Cinzas de saudades voam pelos campos.
Lindo demais! É a arte de vagalumear.
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