Entrevistas

Andreza Amaral – Entrevista sobre o risco de colisões entre aves e aviões

O perigo está no ar. E a polêmica também.


Risco de Colisões: Aves e Aeronaves


Andreza Amaral – Entrevista


Silvestre Gorgulho, de Brasília


O perigo está no ar. E a polêmica também. Existe um problema sério no Brasil e no mundo inteiro que é o risco de colisões entre aves e aeronaves. Em alguns aeroportos, o problema é maior porque existem focos de atração das aves, como lixões e aterros sanitários. Envolvidos neste debate e buscando soluções, estão vários órgãos como o Ibama, Infraero, DAC, sindicatos e as próprias companhias aéreas. Várias comissões trabalham constantemente para encontrar soluções e evitar – segundo os pilotos – essa “roleta russa” a cada decolagem e aterrissagem. Diante do problema, foi criado em 2002, o Centro de Pesquisa de Avifauna em Aeroportos – CPAA para buscar uma solução. O CPAA trabalha em parceria com o Laboratório Interdisciplinar de Meio Ambiente – Lima/Coppe/UFRJ, e com a Superintendência do Meio Ambiente da Infraero. Em novembro, o Brasil vai sediar uma Conferência Internacional de Perigo Aviário, no Rio de Janeiro.


Folha do Meio – Há conflito entre o Ibama, a Aeronáutica e a Infraero quanto abater as aves próximas às pistas de pouso?
Andreza Amaral –
Para o Ibama, o abate seria o último recurso, apenas no caso de todas as outras alternativas terem se esgotado. Há casos que sou favorável ao controle da população, mas aí seria pela retirada de ninhos e ovos. É um controle menos violento. Claro que o abate é uma forma imediatista de acabar com um problema.
A forma correta de se acabar com este problema é atuando nas suas causas, não na sua conseqüência! Tem-se que acabar ou controlar os focos de atração das aves. Até porque, o nicho disponibilizado pelo abate tende a ser momentâneo, pois outras aves possivelmente virão ocupá-lo.


FMA – Os riscos que os aviões correm são, na verdade, pelo problema da má disposição dos resíduos sólidos das cidades. Enquanto houver lixões, haverá aves. Enquanto os lixões permanecerem próximos aos aeroportos, haverá esta polêmica. Como resolver o problema?
Andreza –
Este é um problema que compete mais à administração pública dos Estados e dos Municípios. Eles são mais responsáveis do que o próprio Ibama, ou a Infraero ou a Aeronáutica. Apesar de existir toda uma legislação que rege o uso do solo na Área de Segurança Aeroportuária, raramente ela é cumprida, seja por negligência ou por conveniência. Pois, infelizmente, as coisas não são tão bem conduzidas no nosso país.
É possível haver a liberação de uma construção inadequada numa área, sendo seu embargo muito mais complicado após a obra ter início. A única forma de resolver este problema, a meu ver seria, primeiro, o cumprimento da legislação. Depois, há que ter uma campanha de conscientização da própria sociedade e das populações sobre os riscos de se colocar o lixo no entorno dos aeródromos.


FMA – Quais os aeroportos que mais preocupam o Ibama?
Andreza –
O Cemave/Ibama atende demandas de todo o Brasil. E evidente, em defesa da sociedade, seja na segurança dos vôos, seja na defesa da natureza. De um modo geral, os aeroportos que têm mais problemas são os que têm lixões na Área de Segurança Aeroportuária. O Cemave já participou de atividade nos aeroportos do Rio de Janeiro, Salvador, Manaus, Imperatriz, Cuiabá, Paulo Afonso, Petrolina, João Pessoa, Natal, Fernando de Noronha, Porto Alegre, Aracajú e Teresina, tanto como colaborador na emissão de pareceres e sugestões de soluções, como implantando ações de manejo da avifauna, principalmente de urubus-de-cabeça-preta. Essa é uma das espécies mais populosas no entorno de aeroportos, justamente por causa dos lixões.
Existem, também, problemas nos aeroportos de Manaus, Guarulhos, Florianópolis e Joinville.

FMA – Será que o governo como um todo (Aeronáutica, Ibama, Infraero, Prefeituras, etc) não pode dar prioridade ao tema e resolver de vez esse problema dos lixões?
Andreza –
Questões que envolvem mais de uma instituição sempre são mais difíceis de serem resolvidas. Cada órgão tem suas prioridades, suas características administrativas, seus objetivos específicos e sua cultura. Mas sempre há a posição política, o desejo do governo como um todo. A única coisa que sei é que a parte mais fraca nesta demanda são as próprias aves.
O Cemave busca atender da melhor forma esta demanda. Os técnicos do Ibama acompanham os problemas, emitem parecerem e sugestões buscam soluções compartilhadas. Existe também em alguns casos, a necessidade da intervenção do Ministério Público.


FMA – Existe uma legislação para tratar deste problema?
Andreza –
Não existe uma legislação própria para nortear a solução do problema já instalado. A ausência desta legislação torna o andamento das soluções mais difícil e mais lento.


FMA – Quais os aeroportos brasileiros que tiveram licença ambiental para serem construídos?
Andreza –
Teoricamente, um empreendimento como o de um aeroporto só deve ser realizado após análise e emissão de licença. No entanto, algumas regrinhas óbvias não foram obedecidas, o que pode gerar problemas. É evidente que construir um aeroporto ao lado de um lixão, de um rio, do mar ou até mesmo de um porto ou marina onde atracam barcos pesqueiros é saber que vai ter problema. De uma forma geral, são poucos os aeroportos que não apresentam problemas com a avifauna. Justamente pelo adensamento das cidades, pelo mau uso do solo e porque as cidades vão crescendo em direção aos aeroportos.


Polêmica no ar


Risco de colisão entre aves e aeronaves
Na decolagem e aterrissagem, pilotos continuam enfrentando
uma “roleta russa” devido ao choque com urubus e quero-queros







Grandes jatos ou pequenas aeronaves, todos aviões correm risco e podem sofrer sérios danos quando atingidos por aves em pleno vôo.

Silvestre Gorgulho


O Centro de Pesquisa de Avifauna em Aeroportos tem por objetivo avaliar o risco de colisão entre aeronaves e aves nos diferentes sítios aeroportuários do Brasil. O projeto, na quarta fase de pesquisa, se chama “Ave como fator de risco para a aviação” e está na busca de soluções nas proximidades de aeroportos do Brasil. A equipe de estudo é formada pelos pesquisadores Giovannini Luigi, Fernando Moura e Mônica Magnani.


Segundo Mônica Magnani, bióloga da UFRJ, todo o esforço é no sentido de minimizar as chances de ocorrência de incidentes e acidentes aéreos que resultem da colisão entre aves e aeronaves civis e militares, no solo ou no ar. “Para isso – diz ela – estamos identificando os focos de atração das aves, avaliando, tratando, gerenciando e propondo soluções de casos, além de um estudo de ações necessárias a serem feitas no meio ambiente natural e antrópico. Sempre buscando desestimular a presença de aves nos aeroportos e entorno”.


Focos de atração
Para Mônica Magnani, os principais empecilhos encontrados são do conhecimento de todos: os lixões a céu aberto. “O lixo urbano é foco de atração para as aves que buscam alimentos em processo de decomposição. Também áreas alagadas, próximas aos aeroportos, atraem as aves. Além de serem fonte de alimento, servem para saciar a sede ou, até mesmo, para se refrescarem”, explica a bióloga.


A verdade é que, com o crescimento urbano desordenado, com as políticas de saneamento lentas e inadequadas e com o aumento do número de vôos, o número de incidentes e acidentes vem aumentando. E não é só no Brasil. É no mundo todo.


No Brasil, salienta Mônica Magnani, o tema ganha cada dia mais importância, sobretudo depois que o Cenipa – Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos – disponibilizou um banco de dados atualizado com base em relatos de colisões ocorridas.


Manual de Perigo Viário
Só no ano de 2004, as empresas aéreas brasileiras contabilizaram 2,5 milhões de dólares em prejuízos provenientes de colisões. Informa a bióloga que o próprio CPAA está hoje comprometido a elaboração do Manual de Perigo Aviário para Aeroportos da Rede Infraero e com uma revisão bibliográfica do Manual de Perigo Aviário para Aeroportos da Rede Infraero. “É importante fazer a quantificação e discriminação das espécies de aves e o mapeamento dos diversos ambientes relacionados à ocorrência de cada uma das espécies relatadas” diz ela. Mônica Magnani explica que os trabalhos de pesquisa em campo vem ocorrendo em diversos aeroportos do Brasil, como: Rio de Janeiro, Porto Alegre, Manaus, Maceió, Belo Horizonte e Salvador.


No Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, foram identificados cerca de 64 espécies de aves que se alimentam, nidificam ou apenas cruzam o espaço aéreo. As mais comuns são a garça-grande-branca (Casmerodius albus) o caracará (Caracara plancus), o quero-quero (Vanellus chilensis) e o urubu (Coragyps atratus).


Todos os estudos do CPAA e todas nossas parcerias são de fundamental importância – salienta Mônica Magnani. “Imagina – diz ela – que uma ave de aproximadamente um quilo e meio ao se chocar com uma aeronave a 600km/h gera um impacto de cerca de cinco toneladas. Sendo assim, os incidentes ou acidentes resultantes de colisão de aeronaves com aves representam um perigo real para a aviação. No caso do Brasil, para a vida de cinco milhões de passageiros que usam os aviões como meio de transporte”.


Evento internacional no RJ
Vale ressaltar que esses riscos de acidentes entre aves e aeronaves não estão restritos ao Brasil. “A situação é igual no mundo todo, lembra o Major-aviador Flávio Antônio Coimbra Mendonça, do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos – Cenipa. “É bom lembrar – diz Coimbra Mendonça – que nossos trabalhos vêm sendo reconhecidos e o Brasil foi até convidado para sediar a Conferência Internacional de Perigo Aviário, a ser realizado no Rio de Janeiro, de 28 de novembro a 2 de dezembro deste ano. Esse evento tem o aval da Organização de Aviação Civil Internacional, Nesta mesma ocasião ocorrerá, também, o Terceiro Seminário Internacional de Perigo Aviário, que terá a participação de palestrantes de todos os continentes.


Prejuízo das empresas aéreas


Só em Porto Alegre, cinco acidentes este ano


Empresas aéreas tiveram prejuízos de mais de US$ 7 milhões por colisão de pássaros nos aeroportos no ano passado, diz o major-aviador Flávio Antônio Coimbra Mendonça, Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos – Cenipa. Segundo Coimbra Mendonça, no Aeroporto Internacional Salgado Filho, em Porto Alegre, ocorreram pelo menos 15 acidentes, de 2003 a 2005. E de maio e junho deste ano foram cinco. Para o major-aviador, a desordenada ocupação de áreas vizinhas aos aeroportos brasileiros é um dos motivos das colisões, principalmente no que diz respeito ao uso inadequado do solo urbano.


“A deficiência na coleta, tratamento e destinação final do lixo dos municípios é o fator de atração dos urubus-da-cabeça-preta que são responsáveis por 56% das colisões no País em que a espécie de ave pode ser identificada”, explica.


Um pássaro que pese dois quilos gera um impacto de sete toneladas em uma aeronave cuja velocidade seja de 300 km/hora que é a média de aproximação para pouso. A colisão das aves com os aviões ocorre com freqüência na asa, motor e cabine do piloto”, acrescenta Mendonça.


Em Porto Alegre, a preocupação é com os quero-queros, além de garças e andorinhas. Este ano, a Infraero registrou a presença de 81 aves quero-quero, falcões e garças na região do aeroporto. Para o superintendente-adjunto da Infraero, Marco Aurélio Franceschi, a preocupação é com a cabeceira 29 da pista, onde residem os moradores das vilas Dique e Nazaré, que depositam lixo e atraem as aves. “Sempre recolhemos o lixo, para evitar uma tragédia”, acrescenta.


A Infraero espera a remoção das famílias por dois motivos: a ampliação da pista em mil metros e a eliminação do risco de acidentes.


Conama e Projeto de lei


Existe a resolução número 4 do Conama, de outubro de 1995, que proíbe a instalação de atividades atrativas de aves dentro da área de segurança aeroportuária. Porém não prevê punições. Existe, também, um projeto de lei em andamento na Câmara dos Deputados que é mais detalhado e prevê vários tipos de sanções.


Projeto de Lei 4464/2004


Autor: Deputado Deley (PV-RJ)


Ementa: Estabelece medidas para o controle de avifauna nas imediações de aeródromos.


Explicação: Estabelece normas para redução do risco de acidente ou incidente aeronáutico decorrente de colisão de aeronave com ave, dispondo que a exploração de aeródromo dar-se-á no âmbito da Área de Segurança Aeroportuária – ASA.


Despacho: Às Comissões de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável; Viação e Transportes e Constituição e Justiça e de Cidadania (Art. 54 RICD) – Art. 24, II.


Acidentes desde 1912 até 2005








Uma ave de um quilo e meio ao se chocar com uma aeronave a 600km/h gera
um impacto de cinco toneladas



As colisões das aves com aviões ocorrem com freqüência na asa, motor e cabine do piloto



Embora, na maioria das vezes, os impactos produzam danos leves às aeronaves, cerca de 11% dos incidentes geram conseqüências que podem afetar seriamente a segurança do vôo, diz o editor da Air on Line, Edmundo Ubiratan. Segundo ele, mesmo que o acidente não seja fatal, dado os novos materiais com que são feitos os motores, o custo de recuperação do motor de um grande avião muitas vezes ultrapassa os US$ 4 milhões. Alguns acidentes famosos de colisão de 1912 a 2005:


Em 1911, o americano Calbraith Rogers ganhou um prêmio de 20 mil dólares ao atravessar, a bordo do Vin Fiz Flyer, os Estados Unidos de costa a costa, Foram 5 mil km, 68 escalas e 16 acidentes em 49 dias.


Em abril de 1912, uma queda em Long Beach, na Califórnia, acabaria com seu sucesso. E com sua vida. Seu biplano caiu porque uma gaivota enroscou-se nos cabos de comando.


1960 (04/outubro) – Um Lockheed Electra [Eastern Airlines] atingiu um bando de aves após decolagem. Teve três dos quatro motores danificados, estolou e caiu. Morreram 62 pessoas.


1962 (23/novembro) – Um Viscount (United Airlines) colidiu com um bando de pássaros a seis mil pés. O impacto causou a separação do estabilizador horizontal. A aeronave caiu e morreram seus 18 ocupantes.


1993 a 2003 – Entre 1993 e 2003 foram registradas 244 colisões no Aeroporto de Guarulhos e 191 no Aeroporto do Galeão. Mas o Cenipa – Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos estima que apenas 20% das colisões são reportadas, o que elevaria para, aproximadamente, 1.500 o número de colisões anuais.


2003 a 2004 – Entre janeiro de 2003 e junho de 2004 foram reportados ao Cenipa 460 colisões, sendo que o número de ocorrências nos grandes aeroportos brasileiros vem crescendo a cada ano.


2005 – Só no aeroporto Salgado Filho, de Porto Alegre, foram cinco acidentes de maio e julho deste ano.


Aeronaves diferentes, riscos diferentes


Para a bióloga paulista Maria Martha Argel de Oliveira, as aves representam uma ameaça séria para as aeronaves. Entre 1912 e 1997, mais de 200 mortes no mundo todo foram atribuídas a acidentes ocorridos com aeronaves civis e militares, em decorrência de colisões com aves. “Aeronaves diferentes apresentam riscos diferentes de colisão – explica a bióloga. “E de forma geral, tanto os aviões modernos quanto os mais antigos têm características que tornam possível uma colisão. Por exemplo, muitas aeronaves antigas, ainda em serviço, não cumprem as exigências atuais quanto à resistência em caso de sucção de aves, mas continuam sendo usadas devido à expansão do mercado de viagens aéreas”, lembra Argel de Oliveira.


Segundo a bióloga, pelas exigências atuais, os jatos modernos de grande porte devem ser capazes de aterrissar em segurança após serem atingidos, em velocidades normais de operação e em qualquer ponto, por uma ave de 4 libras (cerca de 1,8 kg)


No entanto, os aviões a jato são rápidos e silenciosos. “Quanto mais veloz e silenciosa a aeronave, maior o risco de colisão”, diz a bióloga que é Ph. D. em Ecologia.


 

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CUBATÃO: Entrevista com Celma do Carmo de Souza Pinto

Em entrevista à Folha do Meio, Celma do Carmo de Souza Pinto fala sobre a paisagem de Cubatão e a história de uma cidade estigmatizada pela poluição.

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Historiadora, pesquisadora, Doutora em Teoria, História e Crítica, pela Universidade de Brasília, Celma de Souza Pinto é profunda conhecedora da realidade do patrimônio industrial e da paisagem cultural brasileira. Celma do Souza é autora de três livros sobre a memória da industrialização na Baixada Santista: “Anilinas” – “Meu lugar no mundo: Cubatão” – “Cubatão, história de uma cidade industrial” e uma dissertação de mestrado “A construção da paisagem industrial de Cubatão – o caso da Companhia Fabril e da Usina Henry Borden”. É ex-servidora da Prefeitura Municipal de Cubatão e trabalhou por mais de 10 anos no IPHAN Sede, em Brasília. Atualmente dirige o Instituto Base no desenvolvimento de projetos culturais.  Para Celma de Souza, mais do que resgatar a impactante história do desenvolvimento industrial de Cubatão é abrir possibilidades para novos olhares sobre a paisagem do município.

CELMA DO CARMO DE SOUZA PINTO – ENTREVISTA

“Somos humanos e a vida humana é inseparável da história, da natureza, do patrimônio. O reconhecimento da paisagem de Cubatão como bem cultural abre novas possibilidades de conhecimento, de projetos educacionais, de lazer e da percepção da memória social. Vivemos dentro ou junto às paisagens”.

 

FOLHA DO MEIO – Cubatão era símbolo de poluição. Cidade estigmatizado pela poluição e com um dos maiores parques industriais do Brasil. Qual a relação com as paisagens culturais?

CELMA – Cubatão está inserido em um território com as marcas de eventos históricos desde o início da ocupação portuguesa pela sua localização entre o litoral e o Planalto Paulista. A partir de princípios de fins do século XIX, o município testemunha a evolução técnica e tecnológica do País, em suas obras de infraestrutura viária fabris e industriais. Isso somado, é claro, ao ambiente natural no qual se destacam a Serra do Mar, a Mata Atlântica e os manguezais típicos da região costeira. Por isso, Cubatão, além de ter um dos maiores parques industriais do Brasil abriga monumentos históricos como a Calçada do Lorena, o Caminho do Mar, antigos testemunhos fabris, de infraestrutura e várias reservas ambientais como o Parque Estadual da Serra do Mar. Todos esses elementos compõem e influenciam, direta ou indiretamente, a vida dos moradores do município, configurando uma paisagem cultural.

 

FMA – Sim, a paisagem é emblemática, o esforço de despoluição foi grande, mas Cubatão já tem esse reconhecimento?

CELMA – Verdade, a paisagem de Cubatão é uma das mais emblemáticas do Brasil pela imbricação de todos esses elementos somados aos problemas ambientais que manteve a atenção. Mas ainda não tem o reconhecimento que merece no âmbito cultural. Minha pesquisa “O (In)visível patrimônio da industrialização – reconhecimento de paisagens em Cubatão”, procura rever essa paisagem, considerando seus paradoxos, defendendo a urgência de iniciativas para sua valorização e reconhecimento também pelos seus relevantes aspectos históricos, culturais, paisagísticos e até afetivos.

Celma de Souza Pinto: Paisagem industrial em Cubatão-SP: o caso da companhia fabril e da usina Henry Borden.

 

FMA – Mas, você poderia explicar melhor o que é uma paisagem cultural?

CELMA – O termo advém da geografia a partir da evolução dos estudos e da compreensão da noção de paisagem, que remonta ao século XIV no Ocidente. A Unesco, em 1994, inseriu a categoria de paisagem cultural em sua relação de bens culturais passíveis de serem declarados como Patrimônio Mundial. Paisagens culturais são as que foram afetadas, construídas ou resultantes do desenvolvimento humano e da sua ação e relação com a natureza. Como atualmente todo o planeta, e até o espaço sideral, é marcado pela ação humana, as paisagens culturais têm uma variedade muito grande. Tanto podem abarcar grandes territórios, quanto pequenas parcelas territoriais, como áreas industriais, locais de notável beleza, fazendas, jardins e outros. Isso abriu possibilidade para o reconhecimento e valorização também das paisagens industriais, como a de Cubatão, no campo do patrimônio cultural.

FMA – Quais os critérios para reconhecimento de uma paisagem cultural?

CELMA – Os critérios de reconhecimento de uma paisagem cultural variam conforme são estabelecidos pelos documentos de cada país, ou como definidos pela Unesco. No Brasil, por exemplo, a Chancela da Paisagem Cultural Brasileira, estabelecida pela Portaria IPHAN nº 127/2009, define a paisagem como “uma porção peculiar do território nacional, representativa do processo de interação do homem com o meio natural, à qual a vida e a ciência humana imprimiram marcas ou atribuíram valores”. Busca abranger a diversidade de lugares, costumes e paisagens brasileiras. O reconhecimento de uma paisagem cultural perpassa primeiro o Espaço, as pessoas que nele vivem ou interage.

FMA – Paisagem cultural é aquela constituída a partir da interferência humana na natureza…

CELMA – Sim, é o lugar onde se vive, o meio que reflete a interação entre as pessoas e a natureza. É o legado das culturas com o mundo natural, com o tempo: com os eventos do passado, a fruição do presente e as expectativas para o futuro, entre outros. As paisagens culturais são uma narrativa de expressões culturais e de identidade regional para grupos sociais, para comunidades e para a coletividade.

 

FMA – Então, qual a importância da paisagem de Cubatão?

CELMA – Aí que vamos chegar. A paisagem de Cubatão se distingue pelo forte caráter histórico, pela associação com o movimento de ocupação portuguesa desde o século XVII e pela vinculação ao processo industrial e de desenvolvimento técnico paulista e do Brasil, expresso nas vias de transporte já existentes antes da chegada do europeu e das construídas ao longo do tempo. Mas também ostenta um capítulo importante da história ambiental e do operariado brasileiro cuja memória está se perdendo e é parte fundamental da construção da paisagem que não se dá somente no município de Cubatão, mas em outros municípios da Baixada Santista, como Santos.  Enfim, é uma região que ostenta uma paisagem plena de história e, ao mesmo tempo, dotada de uma beleza natural, cênica, ecológica, educacional, contemplativa, de lazer… em suma, um incomparável patrimônio cultural a ser conhecido, divulgado e desfrutado.

 

FMA – Com toda essa importância, por que pouco se fala da paisagem cultural de Cubatão?

CELMA – Não é bem assim. Na verdade, desde a década de 1980, muito se tem falado de Cubatão e da sua paisagem. Sobretudo quando houve uma massiva divulgação na mídia sobre os altos índices de poluição industrial. A partir de 1950, após a construção da Refinaria Presidente Bernardes, até a década de 1970, Cubatão recebeu mais de vinte indústrias de base na área da petroquímica e siderurgia, tornando-se um dos mais importantes complexos industriais do País. Como o Brasil ainda não dispunha de uma legislação ambiental, as indústrias foram instaladas sem o devido cuidado com emissão de poluentes no ar, na água e no solo. Tais consequências nefastas ao meio ambiente e à saúde humana, valeram à cidade a alcunha de Vale da Morte. Mesmo com o trabalho bem-sucedido da Cetesb no controle da poluição ambiental, a imagem negativa de Cubatão ficou no imaginário. Não queremos que essa história seja esquecida, apenas mostrar outros aspectos.

 

FMA – Como é a atual relação dos moradores de Cubatão com a chamada paisagem cultural?

CELMA – Boa questão. Em entrevistas que fiz com moradores de Cubatão, ficou evidente que consideram a paisagem como seu patrimônio cultural. Demonstraram também inquietação com a preservação dos testemunhos da industrialização e da infraestrutura. Eles se preocupam com a natureza, a Serra do Mar, que constitui o envoltório cênico que emoldura a cidade e é o elemento visual mais relevante da região. Mas eles se afligem com o descaso pelos remanescentes de antigas fábricas, pelos antigos caminhos e pela ferrovia. Também evidenciaram que, apesar da carência de políticas de preservação, educacionais, de lazer, entre outros, existe uma relação de identidade com a paisagem local e uma consciência sobre a necessidade de preservação dos testemunhos materiais remanescentes.

 

FMA – Por que é importante o reconhecimento dessa paisagem?

CELMA – Primeiro, porque somos humanos e a vida humana é inseparável da história, da natureza, do patrimônio. O reconhecimento da paisagem como bem cultural abre novas possibilidades de conhecimento, projetos educacionais, lazer e percepção da memória social. Vivemos dentro ou junto às paisagens. Nesse sentido, pode contribuir para que a cidade se torne mais humanizada com melhoria na qualidade de vida, proporcionando um sentido de lugar e de identidade às gerações futuras, assim como propiciar à comunidade uma melhor compreensão sobre o lugar onde vivem e a como buscar uma maior fruição dos testemunhos arquitetônicos e bens tombados da região. Além de possibilitar a novas atividades econômicas ligadas ao potencial histórico e paisagístico que insira a população local.  

A pesquisa de Celma do Carmo, “O (In)visível patrimônio da industrialização – reconhecimento de paisagens em Cubatão”, procura rever essa paisagem, considerando seus paradoxos, defendendo a urgência de iniciativas para sua valorização e reconhecimento também pelos seus relevantes aspectos históricos, culturais, paisagísticos e até afetivos.

 

FMA – Como preservar os elementos arquitetônicos e outros que tornam essa paisagem tão importante?

CELMA – Para isso é imprescindível a atuação séria e isenta dos órgãos de preservação locais e estadual. A preservação do patrimônio cultural exige uma ação conjunta da população com o governo municipal não só no âmbito do patrimônio, mas também para desenvolvimento de projetos de valorização, reabilitação, revitalização ou mesmo requalificação urbana de sítios de valor histórico reconhecidos pela população, como por exemplo, a orla do rio Cubatão, que atravessa a cidade. Ou com a recuperação de locais degradados que remontam à história ferroviária na região. A paisagem pode ser também um meio para criação de mecanismos de reparação que pode incluir também a preservação da memória do trabalhador e fortalecimento da identidade local como museus, centros culturais, projetos educativos, enfim…

 

FMA – Fico imaginando o tamanho desse desafio: Cubatão está entre o maior complexo industrial do Brasil e o maior porto do Brasil?

CELMA – E põe desafio nisso. De fato, como Cubatão situa-se entre um complexo industrial e o Porto de Santos gera um desafio que é conciliar as necessidades de modernização desses setores com as aspirações da população, que almeja o indispensável respeito ao patrimônio cultural e à história. As paisagens estão em constante transformação. Quando relacionadas à indústria isso fica ainda mais evidente, pois a principal característica da indústria é o dinamismo por processos de mudança no modo de produção, de estruturação econômica, entre outros. Por isso é urgente a revisão do atual modelo de desenvolvimento excludente e pautado em projetos que atendem somente às necessidades industriais e portuárias, sem considerar os interesses dos moradores. Não é possível manter o conceito de desenvolvimento da década de 1950 no qual somente a ampliação industrial irá trazer benefícios para a cidade.

 

FMA – Mas o IDH de Cubatão é bem alto…

CELMA – É verdade. O IDH de Cubatão é bem alto, se comparado aos outros municípios da Baixada Santista. No entanto, os moradores não estão imunes aos mesmos problemas de seus vizinhos, cujo IDH e arrecadação tributária é perceptivelmente inferior. Donde se vê que o desenvolvimento e o progresso alardeados pela industrialização não se concretizaram. Então, fica claro que ali os efeitos negativos da industrialização se fazem sentir de modo muito mais adverso do que os benefícios.

A superação desses desafios exige, dentre outros, mecanismos de reconhecimento da paisagem, de forma conjunta com as propostas de gestão compartilhada, com apoio de todos os setores envolvidos e do poder público. Sem isso, é possível que em poucos anos a cidade de Cubatão desapareça como local de vida e convivência humana, vindo a se tornar um mero depósito de contêineres ou um grande pátio de estacionamento de caminhões. Não podemos esquecer que ali vivem pessoas.

 

 

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Entrevistas

John Elkington: A Vanguarda da Sustentabilidade Empresarial e Global

Explorando a Vida e o Legado do Arquiteto da Tripla Linha de Base e Defensor Incansável da Responsabilidade Corporativa

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Na arena global da sustentabilidade, poucos nomes ressoam com a mesma reverência que o de John Elkington. Conhecido como o arquiteto da “Tripla Linha de Base”, Elkington emergiu como um pioneiro na integração de preocupações ambientais, sociais e financeiras no mundo dos negócios. Sua jornada como defensor incansável de práticas sustentáveis e responsáveis ​​é um testemunho vivo de sua influência e impacto duradouro.

As Raízes da Visão de Elkington

Nascido com uma consciência intrínseca do poder transformador da sustentabilidade, John Elkington começou sua jornada na Universidade de Londres, onde se formou em Economia e Estudos de Engenharia. Desde o início, seu interesse abrangente pelas interseções entre o mundo dos negócios e as questões ambientais e sociais o levou a explorar novos paradigmas de desenvolvimento econômico que priorizassem não apenas o lucro, mas também o bem-estar coletivo.

A Tripla Linha de Base e Seu Legado Duradouro

É inegável que o maior legado de John Elkington é a popularização do conceito de “Tripla Linha de Base”. Sua inovadora abordagem de avaliação de desempenho empresarial não apenas com base em lucros financeiros, mas também em impactos ambientais e sociais, foi revolucionária. Essa estrutura conceitual permitiu que as empresas repensassem suas práticas e redefinissem o sucesso empresarial, levando em consideração não apenas os resultados financeiros, mas também o impacto em comunidades e ecossistemas.

O Compromisso Contínuo com a Mudança Sistêmica

Além de suas contribuições teóricas, Elkington é conhecido por seu compromisso contínuo com a mudança sistêmica. Ele trabalhou incansavelmente para influenciar políticas e práticas corporativas, promovendo a sustentabilidade como um imperativo central para o crescimento econômico e o bem-estar social. Sua atuação como autor prolífico e palestrante renomado ampliou ainda mais o alcance de suas ideias e inspirou uma geração de líderes a repensar o papel das empresas na sociedade.

O Legado Duradouro e o Caminho à Frente

À medida que o mundo enfrenta desafios cada vez mais complexos, o legado de Elkington permanece como um farol de esperança e um lembrete constante de que a sustentabilidade não é apenas uma opção, mas uma necessidade urgente. Sua visão e dedicação incansável continuam a orientar não apenas empresas, mas também formuladores de políticas e defensores da sustentabilidade em direção a um futuro mais equitativo e próspero.

John Elkington personifica a noção de que a sustentabilidade não é apenas um conceito acadêmico, mas uma filosofia de vida e uma abordagem essencial para moldar um mundo mais resiliente e sustentável. Sua jornada continua a inspirar e a moldar a narrativa global da responsabilidade empresarial e do ativismo sustentável.

 

Entrevista

John Elkington: Bem, ao longo das últimas décadas, testemunhamos um crescente reconhecimento da importância da sustentabilidade, tanto a nível empresarial quanto global. As empresas estão percebendo que devem abordar não apenas suas operações, mas também sua cadeia de suprimentos e impacto social. Vemos um movimento contínuo em direção a práticas mais responsáveis e transparentes, mas ainda há muito trabalho a ser feito.

Com certeza. Quais são os principais desafios que você identifica atualmente em termos de implementação de práticas sustentáveis em larga escala?

John Elkington: Um dos principais desafios é a integração da sustentabilidade no cerne dos modelos de negócios. Muitas empresas ainda veem a sustentabilidade como uma iniciativa isolada, em vez de uma parte fundamental de sua estratégia. Além disso, a falta de regulamentações e políticas sólidas em muitas partes do mundo dificulta a adoção generalizada de práticas sustentáveis. Também é fundamental envolver os consumidores e criar uma demanda por produtos e serviços mais sustentáveis.

Concordo plenamente. Considerando o cenário atual, como você visualiza a importância da inovação e da tecnologia na promoção da sustentabilidade?

John Elkington: A inovação e a tecnologia desempenham um papel crucial na transição para práticas mais sustentáveis. Novas tecnologias podem aumentar a eficiência, reduzir desperdícios e permitir o uso mais inteligente dos recursos. Da energia renovável aos avanços na agricultura sustentável e na gestão de resíduos, a tecnologia tem o potencial de impulsionar mudanças positivas significativas. No entanto, é importante garantir que essas inovações sejam acessíveis e amplamente adotadas, especialmente em comunidades com recursos limitados.

Definitivamente. Quais conselhos você daria para os líderes empresariais e os formuladores de políticas que desejam impulsionar práticas mais sustentáveis?

John Elkington: Para os líderes empresariais, eu enfatizaria a importância de incorporar a sustentabilidade em toda a cadeia de valor, desde a concepção do produto até o descarte responsável. Isso não apenas beneficia o planeta, mas também pode gerar eficiências operacionais e melhorar a reputação da marca. Para os formuladores de políticas, é fundamental criar um ambiente regulatório favorável e incentivar a inovação e o investimento em práticas sustentáveis. Além disso, é crucial promover a conscientização e a educação sobre a importância da sustentabilidade em todas as esferas da sociedade.

 

 

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Entrevistas

Kátia Queiroz Fenyves fala a respeito de sustentabilidade e meio ambiente

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Kátia Fenyves é Mestre em Políticas Públicas e Governança pela Sciences Po Paris e formada em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo. Ao longo de sua trajetória profissional, acumulou experiências em cooperação internacional para o desenvolvimento sustentável no terceiro setor e na filantropia. Atualmente é Gerente do Programa de Finanças Verdes da Missão Diplomática do Reino Unido no Brasil.

 

1. Você estudou e tem trabalhado com a questão de sustentabilidade e o meio ambiente. Pode nos falar um pouco a respeito desses temas?
Meio ambiente é um tema basilar. Toda a vida do planeta depende de seu equilíbrio. A economia, da mesma forma, só se sustenta a partir dos recursos naturais e de como são utilizados. Sustentabilidade, portanto, foi o conceito que integrou as considerações aos aspectos ambientais, sociais e econômicos, revelando de forma mais sistêmica esta inter-relação e, sobretudo, colocando o meio ambiente como eixo estratégico do desenvolvimento, para além de seu valor intrínseco.

2. Quando se fala em sustentabilidade, pensa-se no tripé social, ambiental e econômico. Como você definiria esses princípios? Qual deles merece maior atenção, ou todos são interligados e afetam nossa qualidade de vida integralmente?
Exatamente, sustentabilidade é o conceito que revela as interligações entre os três pilares – social, ambiental e econômico e, portanto, são princípios interdependentes e insuficientes se tomados individualmente. Talvez, o ambiental seja realmente o único que escapa a isso. A natureza não depende da economia ou da sociedade para subsistir, mas, por outro lado, é impactada por ambos. Por isso, sustentabilidade é um conceito antrópico, ou seja, é uma noção que tem como referencial a presença humana no planeta.

3. Questões relacionadas à sustentabilidade, preservação do meio ambiente e consumo consciente são discutidas nas escolas e universidades?
Há entre as Diretrizes Curriculares Nacionais estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação, que são normas obrigatórias, as específicas para Educação Ambiental que devem ser observadas pelos sistemas de ensino e suas instituições de Educação Básica e de Educação Superior a partir da Política Nacional de Educação Ambiental. Estas contemplam todos os temas citados na pergunta. Não sou especialista na área então é mais difícil avaliar a implementação, mas em termos de marco institucional o Brasil está bem posicionado.

4. Quando se fala em preservação do meio ambiente, pensa-se também nos modelos de descarte que causam tantos danos ao meio ambiente. Existe alguma política de incentivo ao descarte consciente?
Mais uma vez, o Brasil tem um marco legal bastante consistente para o incentivo ao descarte consciente que é a Política Nacional de Resíduos Sólidos de 2010, que é inclusive uma referência internacionalmente. Na verdade, mais que um incentivo ela é um desincentivo ao descarte inconsciente por meio do estabelecimento da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos e a logística reversa. Isso significa que a PNRS obriga as empresas a aceitarem o retorno de seus produtos descartados, além de as responsabilizar pelo destino ambientalmente adequado destes. A inovação fica sobretudo na inclusão de catadoras e catadores de materiais recicláveis e reutilizáveis tanto na logística reversa como na coleta seletiva, algo essencial para um país com nosso contexto social.

5. Você acha que os modelos de descarte atuais serão substituídos por novos modelos no pós-pandemia? O que fazer, por exemplo, para incentivar as pessoas a descartar de forma consciente as máscaras antivírus?
Sempre é preciso se repensar e certamente a pandemia deu destaque a certas fragilidades da implementação da PNRS. Grande parte dos hospitais brasileiros ainda não praticam efetivamente a separação e adequada destinação de seus resíduos e, na pandemia, este problema é agravado tanto pela maior quantidade de resíduos de serviços de saúde gerados como por uma maior quantidade de geradores, uma vez que a população também começa a produzir este tipo de resíduo em escala. Falta ainda muita circulação da informação, então talvez este seja o primeiro passo: uma campanha de conscientização séria que jogue luz nesta questão.

6. Na sua opinião, o mundo está mais consciente das necessidades de preservação do meio ambiente e dos recursos naturais para que gerações futuras possam deles usufruir?
Acredito que tenhamos passado do ponto em que estas necessidades de preservação eram uma questão de consciência e chegamos a um patamar de sobrevivência. Também não se trata apenas das gerações futuras, já estamos sofrendo as consequências do desequilíbrio ambiental provocado pela ação humana e do esgotamento dos recursos naturais desde já. A própria pandemia é resultado de relações danosas entre o ser humano e o meio ambiente e os conflitos por fontes de água, por exemplo, são uma realidade.

7. Quais as ações que mais comprometem e degradam o meio ambiente?
Nosso modelo produtivo e de consumo como um todo é baseado em uma relação predatória com o meio ambiente: retiramos mais do que necessitamos, sem respeitar os ciclos naturais de reposição e, além disso, quando descartamos os resíduos e rejeitos não cumprimos com os padrões adequados estabelecidos. Já temos conhecimento suficiente para evitar grande parte dos problemas, mas ainda não conseguimos integrá-lo nas nossas práticas efetiva e definitivamente.

8. O que na sua opinião precisa ser feito para que as sociedades conheçam mais a respeito de sustentabilidade, preservação do meio ambiente e consumo consciente?
Acredito que para avançarmos como sociedade precisamos tratar a questão das desigualdades socioeconômicas que estão intrinsicamente relacionadas a desigualdades ambientais, inclusive no que diz respeito às informações, ao conhecimento. A educação é, portanto, um componente estratégico para este avanço, mas é preciso ter um entendimento amplo que traga também os saberes tradicionais para esta equação. Além disso é preciso cada dia mais abordar o tema da perspectiva das oportunidades, pois a transição para modos de vida mais sustentáveis, que preservam o meio ambiente e que se baseiem em consumo conscientes alavancam inúmeras delas; por exemplo, um maior potencial de geração de empregos de qualidade e menos gastos com saúde.

9. A questão climática está relacionada com a sustentabilidade? Como?
A mudança do clima intensificada pela ação antrópica tem relação com nossos padrões de produção e consumo em desequilíbrio com o meio ambiente: por um lado, vimos emitindo uma quantidade de gases de efeito estufa muito significativa e, por outro, vimos degradando ecossistemas que absorvem estes gases, diminuindo a capacidade natural do planeta de equilibrar as emissões. Assim, a questão climática está relacionada com um modo de vida insustentável. A notícia boa é que práticas sustentáveis geram diretamente um impacto positivo no equilíbrio climático do planeta. Por exemplo, o Brasil tem potencial para gerar mais de 25 mil gigawatts em energia solar, aproveitando sua excelente localização geográfica com abundância de luz solar, uma medida sustentável que, ao mesmo tempo, é considerada uma das melhores alternativas para a diminuição das emissões de CO2 na atmosfera, que é um dos principais gases intensificadores do efeito estufa.

 

 

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