Reportagens

Barraginhas: a salvação da lavoura

O sistema de barraginhas revitaliza mananciais, recupera rios, ameniza enchentes e impede o êxodo rural


 



Em cada eixo de enxurrada, podem ser construídas três a cinco barraginhas seqüenciadas. O sistema vai produzir um eixo úmido e até um mini-oásis. A água das barraginhas vai se infiltrar na terra, enriquecendo o lençol freático, e depois brota em forma de nascentes nas baixadas.









O técnico Luciano Cordoval recebeu o troféu de primeiro lugar no 4o Prêmio Ouro Azul, de Furnas, na categoria empresa, pelo projeto Barraginhas. Em nome da Embrapa, Luciano, entre seu colega de trabalho Paulo Eduardo Aquino e a jornalista Maria Luiza Melo Ottoni, foi feliz ao deixar um recado para os presentes à solenidade: “tão ou mais importante do que dar prêmios é patrocinar a disseminação das tecnologias premiadas”.

Silvestre Gorgulho, de Brasília



Para uns, a idéia é um ovo de Colombo. Para outros, é a descoberta de um tesouro. Não é para menos: imagina alguém que numa região semi-árida vire produtor de água. Sim, produz água para ele, para sua família, para os córregos e até para os outros. Essa é a revolução que está acontecendo em mais de 300 municípios de Minas Gerais e já começa a ser expandida para o Piauí, Goiás e Distrito Federal. Quem tem a chave deste tesouro é o Centro de Pesquisa de Milho e Sorgo da Embrapa, situado em Sete Lagoas-MG. A revolução consiste no desenvolvimento de uma tecnologia simples, de baixo custo, eficiente e sustentável: criação de um sistema seqüencial de barraginhas para captação de água superficial de chuvas para recuperação de áreas degradadas e de mananciais. Esse projeto se iniciou em 1995. Nestes dez anos foi- se aperfeiçoando e tomou uma dimensão impressionante. Foram construídas mais de 80 mil barraginhas que estão recuperando áreas degradadas, evitando o êxodo de retirantes para os centros urbanos e promovendo uma forte inclusão social. A captação de água é uma prática milenar, mas a Embrapa conseguiu inovar e adaptar essa prática às condições brasileiras do semi-árido. O sistema de barraginhas coleta a água na abundância (as enxurradas) faz reserva para o período da seca e ainda força a recarga das reservas subterrâneas pela elevação do lençol freático. Um verdadeiro ovo de Colombo, como explica nesta entrevista o engenenheiro agrônomo Luciano Cordoval de Barros, pesquisasor da Embrapa, responsável principal pela inovação.


Luciano Cordoval – ENTREVISTA


FMA – Explique melhor a importância do sistema de barraginhas.
Luciano Cordoval –
O importante, primeiro, é entender que os desmatamentos desordenados das últimas décadas e o aproveitamento das terras para lavouras e principalmente para pastagens, sem tecnologias adequadas, provocaram uma terrível degradação dos solos. O pisoteamento por animais tornou o solo compactado e impermeabilizado, diminuindo a sua taxa de infiltração, acelerando o escorrimento superficial de água das chuvas, as enxurradas, provocando erosões, assoreamentos e enchentes. Foi justamente para amenizar essa situação que começamos a implantar o sistema barraginhas.


FMA – E no que consiste?
Luciano –
Consiste em construir mini-barramentos na frente de cada enxurrada, em forma de meia-lua com 15 metros de diâmetro por 1,5 a 2,0m de profundidade. Esses mini-barramentos, que chamamos de barraginhas, podem ser espalhados nas pastagens e beiras de estradas. Assim, as barraginhas vão recolher toda chuva que cai. Elas vão se encher d´água e a água vai infiltrar na terra. Daí, com uma nova frente de chuvas, elas voltam a encher. Isso vai se repetir 10 a 12 vezes durante o ciclo chuvoso. A vantagem é que as barraginhas, além de segurar as enxurradas e conter o processo erosivo, vão alimentar o lençol freático e os aquíferos.


FMA – Como é essa história de ser fazendeiro e até um agricultor que produz água?
Luciano –
Essa é uma boa história. E é possível mesmo, pois o agricultor pode produzir água. Como? Principalmente tirando proveito das enxurradas.
As enxurradas que eram antes, um problema, passam a ser parceiras do produtor. No caso, as barraginhas funcionarão como “covas de água”. É como se fosse uma plantação de água. A água “plantada” vai infiltrar na terra, enriquecendo o lençol freático. Depois vai brotar em forma de nascentes nas baixadas, favorecendo e umedecendo as plantações, revitalizando os córregos, rios e amenizando enchentes. Isso tudo vai criar a sustentabilidade agrícola e familiar.


FMA – Numa região de chuvas normais, quanto de águas as barraginhas podem armazenar?
Luciano –
Olha, em um ano cada barraginha dessas pode transferir para o solo o equivalente a 150 caminhões-pipas. Vamos ao exemplo do vale do rio Jequitinhonha. Ali, em cada eixo de enxurrada, em que dá para construir de três a cinco barraginhas seqüenciadas, o sistema vai produzir um eixo úmido, um mini-oásis, onde é possível fazer inúmeras atividades agrícolas, como plantio de cana para tratar animais, fazer rapadura e cachaça, plantio de frutas, hortas, lavouras etc.
Essas atividades geram produção de alimentos para as famílias, comercialização de excedentes renda e empregos.


FMA – E onde e como se constróem as cisternas?
Luciano –
Veja bem, sequenciadas a água das barraginhas vai escorrer subterraneamente da parte de cima para a parte baixa do terreno. Abaixo das barraginhas inferiores se pode abrir cisternas e cacimbas, possibilitando o consumo humano e animal. Isso vai acabar com duas cenas muito tristes: a eliminação do caminhão-pipa e a de mulheres transportando água na cabeça.


FMA – E quais as conseqüências sociais e econômicas?
Luciano –
Olha, vou repetir o que disse pra mim dona Telma Wenceslau, ex-prefeita de Minas Novas: “Descobrimos um tesouro”. Minhas experiências de 10 anos provaram que com três a quatro barraginhas seqüenciadas, cria-se um mini-oásis. Sete a oito, forma-se um mini-pântano. Se implantarmos uma dezena delas, aí vamos poder revitalizar córregos e combater a desertificação. Este cenário já é freqüente em Minas Novas no vale do Jequitinhonha. A natureza é magnânima e só precisa de uma mãozinha do homem para revitalizar o solo.


FMA – No início da implantação deste sistema parece que houve alguns problemas. Hoje esses problemas estão resolvidos?
Luciano –
De fato ocorreram alguns problemas no início, pois tínhamos que fazer tudo sozinho, mobilização, palestras, treinamentos, viagens e, consequentemente, desgastes físicos e custos maiores. Hoje facilitou. Adquirimos conhecimento e confiança e temos os multiplicadores, reeditores treinados e mais de oito mil simpatizantes.
Só técnicos trabalhando no sistema são 1.200, sendo 400 deles da Emater e isso favorece nossa caminhada agora. Hoje podemos mostrar as quatros fases de implantação, sensibilizar mais as comunidades e ainda fazemos uma gestão descentralizada. Num instantinho a gente pode cortar o cordão umbilical e as comunidades começam a caminhar sozinhas, com os próprios pés.


FMA – Como funcionam os projetos-pilotos e as chamadas vitrines?
Luciano –
Nós aprendemos a motivar as comunidades. E elas sentem logo o resultado. Assim, quando eles constróem as primeiras 50 barraginhas com bastante esforço, vencendo as dificuldades naturais de uma gestão principiante, promovemos um dia de campo festivo. Aí comemoramos a conclusão da quarta fase, que é quando aquela comunidade passa a ser uma “vitrine” demonstrativa, descentralizada e bem espontânea.


FMA – Quantas barraginhas já foram implantadas nestes 10 anos?
Luciano –
Nestes 10 anos foram construídas cerca de 80 mil barraginhas. Só projetos-pilotos, hoje, temos mais de dois mil em três regionais: o pioneiro de Sete Lagoas, com 960 barraginhas implantadas em 60 fazendinhas (1998), o de Janaúba, no Norte de Minas, no Semi-árido, com 361 barraginhas (2002) e o de Minas Novas (2001 a 2004) com 2.500 barraginhas, no vale do Jequitinhonha. Na região pioneira de Sete Lagoas, em 26 municípios existem hoje 25.000 barraginhas.


FMA – Qual a imagem mais marcante que você guarda do programa Barraginhas?
Luciano –
É uma imagem muito forte de um pai de família do vale do Jequtinhonha que, há 20 anos, produzia tijolos. Sua argila era excelente, mas a água foi escasseando e acabou que tinha que buscá-la em carroção bem longe. A distância da água dificultou a produção de tijolos.
Ele desistiu e pegou um pau-de-arara para São Paulo. Todos os anos ia cortar cana como bóia-fria. Mas, nos últimos quatro anos construímos 2.500 barraginhas em 37 comunidades de Minas Novas e três no terreno desse retirante.
Quando ele voltou para casa, em dezembro de 2003, encontrou suas barraginhas cheias de água. Pronto! O ex-retirante começou a amassar barro, começou a produzir tijolos e foi empregando a mulher e filhos. E, o mais importante, se integrou ao seio da família e da comunidade.
Tem também a história de uma senhora que não tinha e nem precisava de barraginhas. E nem de terra. Ela produzia mel. Mas todos os seus vizinhos tinham barraginhas. Só que depois que os vizinhos construíram as barraginhas, sua produção de mel aumentou. Evidente, havia mais árvores, mais verde e mais flores. E também mais abelhas.
Casos de hortas, cacimbas, plantio de cana, pomares abaixo de duas a três barraginhas têm milhares de exemplos, inclusive de córregos que voltaram a correr, em regiões com densidade ideal de barraginhas, captando e segurando as águas das chuvas na propriedade. Até evitando enchentes nos córregos.


FMA – Vamos ao tema do momento: qual a opinião do senhor sobre a transposição e revitalização do São Francisco? E que relação as barraginhas podem ter com o rio?
Luciano –
Sou contra esta transposição. Se quiserem gastar os R$ 5 bilhões da transposição com mais eficiência e maior sustentabilidade, é só aplicar, gradativamente em milhares de captações diretas no rio, milhares de veias capilares dispersas ao longo de seu leito, mini-canais, criando-se uma mancha verde linear a um baixíssimo custo. Isso vai gerar mais alimento, mais renda e mais emprego para as famílias ribeirinhas.
As soluções ambientais estão sempre na simplicidade e na eficiência.
As barraginhas, como a colheita de água em telhados/cisternas e outras tecnologias, são complementares. O importante é criar um leque de alternativas, umas são melhores aqui, outras são mais eficientes ali. Poços artesianos, só no caso de abastecimento de comunidades isoladas e que não tenha outras alternativas. Assim é que se faz a revitalização ao longo de uma bacia hidrográfica.


Mais informações:
Embrapa Milho e Sorgo
Caixa Postal 285
Rod. MG 424 KM 45
35701-970 – Sete Lagoas – MG
Fone (31) 3779 1000
Fax (31) 3779 1088
www.cnpms.embrapa.br

Continue Lendo
Clique para comentar

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Reportagens

Brasil tem quase 4 milhões de casos prováveis de dengue

Dados indicam ainda 1.792 óbitos confirmados por dengue em 2024

Publicado

em

 

O Painel de Monitoramento das Arboviroses do Ministério da Saúde contabiliza nesta quinta-feira (25) 3.852.901 casos prováveis de dengue registrados em todo o país nos quatro primeiros meses de 2024. O número representa mais que o dobro de casos prováveis da doença identificados ao longo de todo o ano passado: 1.649.144.

Dados da pasta indicam ainda 1.792 óbitos confirmados por dengue em 2024, além de 2.216 mortes em investigação. O coeficiente de incidência da doença no país, neste momento, é 1.897,4 casos por cada 100 mil habitantes. A letalidade em casos prováveis é 0,05 e a letalidade em casos de dengue grave é 4,43.

A maioria dos casos prováveis segue concentrada na faixa dos 20 aos 29 anos, seguida pelas faixas dos 30 aos 39 anos, dos 40 aos 49 anos e dos 50 aos 59 anos. Já a faixa etária menos atingida é a de crianças menores de 1 ano, seguida por pessoas com 80 anos ou mais e por crianças de 1 a 4 anos.

Minas Gerais ainda responde pelo maior número de casos prováveis de dengue (1.167.056). Em seguida estão São Paulo (927.065), Paraná (391.031) e Distrito Federal (232.899). Já os estados com menor número de casos prováveis são Roraima (252), Sergipe (3.053), Amapá (4.480) e Rondônia (4.715).

Quando se considera o coeficiente de incidência da doença, o Distrito Federal aparece em primeiro lugar, com 8.267,4 casos para cada grupo de 100 mil habitantes. Em seguida estão Minas Gerais (5.682,2), Paraná (3.417,1) e Espírito Santo (2.994). Já as unidades federativas com menor coeficiente são Roraima (39,6), Ceará (109,3), Sergipe (138,2) e Maranhão (138,4).

Edição: Aécio Amado

ebc

Continue Lendo

Reportagens

Haddad entrega a Lira projeto de regulamentação da reforma tributária Fonte: Agência Câmara de Notícias

Foi entregue projeto que institui a Lei Geral do IBS, da CBS e do Imposto Seletivo; outra proposta ficou para o mês que vem

Publicado

em

 

Lira recebe de Haddad o principal projeto de regulamentação da reforma

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, entregou ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), o principal projeto de regulamentação da reforma tributária. O texto institui a Lei Geral do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), da Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto Seletivo (IS) e contém a maior parte das regras que regulamentam a reforma.

O segundo projeto sobre o tema será enviado ao Congresso na primeira quinzena de maio. A proposta vai tratar da atuação do Comitê Gestor do IBS e da distribuição das receitas do IBS entre os entes federativos. Na avaliação do ministro Fernando Haddad, o conjunto de benefícios da reforma para a economia brasileira é inestimável.

“Os investimentos serão desonerados, as exportações serão desoneradas, os produtos de consumo popular (alimentos, produtos industrializados) vão ter um preço melhor. Não haverá cumulatividade nos impostos e não vamos exportar impostos”, afirmou Haddad, em entrevisa coletiva após o encontro com Lira.

Fernando Haddad disse que o novo sistema tributário brasileiro será totalmente digital. Segundo ele, com o aumento da base de contribuintes, o País poderá ter uma alíquota mais razoável de imposto a ser paga. Atualmente, a média dos tributos brasileiros é de 34%. “O impacto é como se nosso PIB crescesse 20% diluído no tempo, em função do ganho de eficiência que nossa economia terá. Não se trata de pouca coisa”, disse.

Haddad destacou ainda que o projeto trazido à Câmara nesta quarta-feira foi acompanhado por representantes de estados e municípios, o que vai facilitar a negociação no Legislativo.

“Assim, não vai expressar o direito de ninguém individualmente, é um projeto que já é o resultado de uma negociação prévia que fizemos para facilitar o trabalho do Legislativo”, afirmou.

Os dois projetos são de lei complementar (PLPs), que exigem um quórum maior para aprovação (em vez da maioria simples, exige-se a maioria absoluta, ou seja 257 votos favoráveis).

 

Reportagem – Luiz Gustavo Xavier
Edição – Wilson Silveira

Fonte: Agência Câmara de Notícias

 

 

Continue Lendo

Reportagens

Dia Nacional de Libras: GDF investe em acessibilidade e autonomia

Comemorada neste dia 24 de abril, data reforça a importância das ferramentas de inclusão social e expressão da comunidade surda

Publicado

em

 

Por Ana Flávia Castro, da Agência Brasília | Edição: Saulo Moreno

 

Há 22 anos, a Língua Brasileira de Sinais (Libras) foi reconhecida pela Lei nº 10.436 como meio de comunicação legal em território brasileiro. Em homenagem ao marco, nesta quinta-feira (24) é celebrado o Dia Nacional de Libras, ferramenta de expressão e autonomia para a comunidade surda.

“Essa lei trouxe seguridade para nós enquanto comunidade surda, para a gente poder se comunicar usando essa língua. Antes, eu posso dizer que tínhamos muitas barreiras e dificuldades. Mas, com o poder da lei – que nasceu aqui em Brasília –, podemos dizer que vivemos muitos avanços. Ainda não estamos 100%, mas é preciso que a Libras seja cada vez mais divulgada e tenha apoio, para se difundir como linguagem”

Waldimar Carvalho da Silva, diretor de Acessibilidade Comunicacional da Sepd-DF

O Distrito Federal é uma das unidades da federação pioneiras na implementação de uma Central de Interpretação em Libras (CIL) – disponível para atendimento à comunidade surda, na Estação da 112 Sul –, bem como da criação de um sistema online para a assistência 24 horas a esse público, por meio de aplicativo.

As iniciativas do Governo do Distrito Federal (GDF) também incluem projetos educacionais implementados na rede pública de ensino. As propostas são voltadas para dignidade e independência das 10.774 pessoas que possuem algum tipo de deficiência auditiva no DF, segundo dados do Instituto de Pesquisa e Estatística do Distrito Federal (IPEDF).

“Essa lei trouxe seguridade para nós, enquanto comunidade surda, para a gente poder se comunicar usando essa língua. Antes, eu posso dizer que tínhamos muitas barreiras e dificuldades. Mas, com o poder da lei – que nasceu aqui em Brasília –, podemos dizer que vivemos muitos avanços. Ainda não estamos 100%, mas é preciso que a Libras seja cada vez mais divulgada e tenha apoio, para se difundir como linguagem”, frisa o diretor de Acessibilidade Comunicacional da Secretaria da Pessoa com Deficiência do DF (Sepd-DF), Waldimar Carvalho da Silva.

O Distrito Federal é uma das unidades da federação pioneiras na implementação de uma Central de Interpretação em Libras (CIL), disponível para atendimento à comunidade surda na Estação da 112 Sul | Foto: Geovana Albuquerque/Agência Brasília

Ex-professor da Escola Bilíngue de Taguatinga, o servidor ressalta que a data é importante para lembrar que o ensino voltado para a inclusão também precisa ser difundido entre as pessoas ouvintes, ou seja, aquelas que não possuem deficiência no aparelho auditivo.

“Os ouvintes têm que entender, ter a maturidade de aceitar a nossa comunicação. Eu, como pessoa surda, já tenho experienciado e percebido que muitas vezes as pessoas não recebem isso de forma positiva. Falta um aprendizado das pessoas, de nos respeitar como pessoas surdas, no lugar de dor que nós temos”, destaca.

Acessibilidade nas salas de aula

Desde as etapas iniciais do desenvolvimento, a rede pública de ensino do DF conta com uma série de iniciativas que promovem a inclusão e acessibilidade, em busca de oportunidades igualitárias para a comunidade surda. Segundo a Secretaria de Educação, 825 alunos com surdez estão matriculados nas instituições de ensino, dos quais 818 apresentam alguma deficiência auditiva e sete, surdocegueira.

Ainda de acordo com a pasta, 337 turmas realizam o atendimento aos estudantes com algum tipo de limitação no aparelho auditivo. Entre elas, 118 são classes bilíngues, 17 classes bilíngues diferenciadas, 182 classes bilíngues mediadas e outras 20 exclusivas para a Educação de Jovens e Adultos (EJA).

A paraibana Seliane Almeida Rocha descobriu o atendimento pelas redes sociais e celebra os avanços em termos de acessibilidade na capital da República

A Escola Bilíngue de Taguatinga (QNH 01/03 Área Especial 1 e 2) atende estudantes com deficiência auditiva e ouvintes filhos de pais com surdez, em aulas pensadas para pessoas com deficiência, e não adaptadas para elas.

“A língua de sinais é um direito adquirido pelo surdo, porque é sua via de comunicação e instrução. É por meio dela que o surdo consegue se expressar, e com o ensino pensado para ele, ele vai conseguir participar ativamente, se sentir incluso, entendendo o professor, conseguindo responder, participando. No futuro, irá se tornar um cidadão crítico e consciente, que é a proposta da Secretaria de Educação”, explica a supervisora da instituição de ensino, Adriana Reis.

A escola recebe estudantes de todos os segmentos – da educação infantil ao ensino médio e Educação de Jovens e Adultos (EJA), em período integral. Também há estimulação precoce para crianças entre seis meses e 3 anos, com atendimentos semanais. É uma maneira de preparar os pequenos para ingressarem na escola.

Além da CIL, o DF também é pioneiro na criação de um sistema online para a assistência 24 horas a esse público, por meio de aplicativo

Interessados em se matricular na Escola Bilíngue, ou os responsáveis, devem comparecer presencialmente à secretaria da unidade escolar, para requisitar uma vaga ou a transferência do aluno vindo de outra escola. Esse procedimento pode ser solicitado durante todo o ano.

Ferramentas de acessibilidade

Outra conquista recente dos brasilienses é o DF Libras CIL Online. Lançada em dezembro de 2023 pela Secretaria da Pessoa com Deficiência (Sepd-DF), a plataforma oferece atendimento gratuito em Língua Brasileira de Sinais garantindo a comunicação dos cidadãos com os órgãos públicos, de forma acessível e digital, em qualquer horário e em todos os dias da semana.

O acesso à ferramenta é feito por meio de um QR Code, que conecta o usuário a uma videochamada com um intérprete de Libras. O código está disponível em diversos equipamentos do Governo do Distrito Federal (GDF), como unidades básicas de saúde (UBSs), unidades de pronto atendimento (UPA), centros de referência de assistência social (Cras) e núcleos de assistência jurídica da Defensoria Pública (DPDF).

Ex-professor da Escola Bilíngue de Taguatinga, Waldimar Carvalho da Silva ressalta que a data é importante para lembrar que o ensino voltado para a inclusão também precisa ser difundido entre as pessoas ouvintes, ou seja, aquelas que não possuem deficiência no aparelho auditivo

Desde o lançamento, em 6 de dezembro de 2023, até o dia 4 de abril, o programa totalizou quase 90 horas de uso e chegou a 4.526 acessos. No período, que contabiliza quatro meses, foram registradas 37 ligações diárias em média.

Segundo o diretor da Central de Interpretação de Libras, Alexandre Castro, o sistema implementado pelo GDF é o mais rápido do país, com previsão de atendimento em até 90 segundos. “Ao longo dos últimos anos, tivemos conquistas importantes, como essa ferramenta 24 horas, e outras iniciativas para atender a população. Salvamos pessoas de situações críticas e contribuímos com o acesso a políticas do governo”, destaca o profissional.

Há ainda os cidadãos que prefiram visitar a central presencialmente para auxílio dos tradutores. É o caso da Ana Karoline Silva de Araújo, de 30 anos, que esteve no CIL nesta quarta-feira (24) em busca da assistência para uma avaliação no INSS.

“Eu fiquei sabendo desse atendimento aqui do CIL quando vim com a minha mãe, há muito tempo”, conta Ana Karoline, em Libras. “Então, eu descobri que eu não precisava depender dela, eu poderia resolver as coisas sozinha. Como eu sou maior de idade, é muito importante para mim essa autonomia para fazer as coisas, sem precisar de algum familiar”, segue.

Já Seliane Almeida Rocha, 36, descobriu o atendimento pelas redes sociais. Nascida em Pombal, no interior da Paraíba, a fiscal administrativa se mudou para o DF com a família, em busca de mais qualidade de vida, e celebra os avanços em termos de acessibilidade na capital. No entanto, ressalta que os estabelecimentos e cidadãos ainda precisam avançar nesse quesito.

“O CIL é muito importante, porque nos ajuda em termos de acessibilidade. Eu preciso de um atendimento médico, eu chamo um intérprete, eu preciso de uma informação sobre um programa do governo, eu venho aqui. A CIL é o nosso local de informação. É fundamental ter um espaço para nós, com esse cuidado”, avalia.

Continue Lendo

Reportagens

SRTV Sul, Quadra 701, Bloco A, Sala 719
Edifício Centro Empresarial Brasília
Brasília/DF
rodrigogorgulho@hotmail.com
(61) 98442-1010