Entrevistas

Monica Gorgulho – Desafio das drogas

Drogas: problemas e soluções














Maio de 2008


Mônica Gorgulho fala sobre o desafio das drogas, seus problemas e soluções
Mônica Gorgulho explica que diferentes drogas provocam diferentes resultados, em diferentes pessoas e em diferentes momentos da vida.



Silvestre Gorgulho


Mônica Gorgulho faz uma revolução silenciosa no Brasil. Aliás, nem tão silenciosa assim, pois sua tese dá o que falar. Para esta psicóloga clínica, Mestre em Psicologia Social, ex-colaboradora do Programa de Orientação e Assistência a Dependentes, fica muito mais caro para a sociedade combater a droga e o tráfico do que ter uma tolerância assistida para com os dependentes. Mônica Gorgulho é Diretora Executiva da International Harm Reduction Association, representante do Conselho Federal de Psicologia junto ao Conselho Nacional Anti-Drogas e fundadora e coordenadora da Dínamo – ONG que se preocupa com a informação responsável sobre drogas e afins. Sua tese é tão simples quanto polêmica: se não é possível livrar os homens da droga, é melhor, então, que os homens aprendam a conviver com elas. Como? Simplesmente ensinando os usuários a usar essas substâncias com o máximo de segurança possível. E educando os dependentes a buscar o máximo de controle sobre sua patologia.





“É importante garantir todo o espaço necessário para que o adolescente se expresse. Só então, junto com ele, se buscará uma solução. Cada um, isoladamente, não é capaz de encontrar a melhor solução”. Mônica Gorgulho




MÔNICA GORGULHO – ENTREVISTA 


Toda substância que altera as funções orgânicas ou psíquicas de alguém é considerada psicoativa. Se for para o bem, com acompanhamento médico, é remédio. Se for para o mal, é droga. Em entrevista exclusiva, a psicóloga Mônica Gorgulho diz que diferentes drogas provocam diferentes resultados, em diferentes pessoas, em diferentes momentos da vida. E explica como pais e professores devem agir com filhos e alunos que entraram no mundo da droga. Para Mônica, no Brasil fatos e dados são interpretados de forma muito particular por aqueles que defendem uma postura conservadora. “A verdade –  diz ela –  é que fica muito mais caro para a sociedade combater a droga e o tráfico do que ter uma tolerância assistida para com os dependentes”.


 


Folha do Meio – Gostaria que você fizesse, para começar, um ranking das drogas pelo mal que fazem às pessoas. Qual é a pior e qual a tolerável?
Mônica Gorgulho – Bom, devemos começar lembrando uma coisa importante: qualquer substância psicoativa, chamada de SPA (*1) pode ser mais ou menos maléfica para diferentes pessoas ou em diferentes momentos da vida de um mesmo indivíduo.
Outra coisa: depende de alterações momentâneas nas características básicas de uma mesma substância, ou seja, grau de pureza, possível adulteração etc. Assim, considerando tudo isto, podemos entender que qualquer droga pode ocupar, em um dado momento, o posto de maior ou menor periculosidade para um indivíduo. Vale destacar que o maior ou menor risco nada tem a ver com legalidade ou ilegalidade de uma droga.


FMA – Mas não existe o conceito de droga mais leve ou mais pesada…
Mônica – É verdade, durante algum tempo se costumou referir-se a algumas drogas como leves, por exemplo, a maconha, haxixe. E a outras, como pesadas, como a cocaína e heroína.
Hoje já não se usa mais essa terminologia. É certo, porém, que o consumo de maconha, no geral, preocupa menos os especialistas do que o uso de crack ou ácido. Essa postura é fruto de observação sobre os resultados provocados nos consumidores de uma ou outra substância. Daí, a tendência atual de se considerar a maconha como uma droga de consumo tolerável, mas que necessitaria, caso fosse legalizada, da mesma atenção que deveríamos conceder ao consumo de álcool, por exemplo.    


FMA – País rico ou país pobre. Família rica ou família pobre. Por que é tão difícil para todos lidar com a questão droga no que diz respeito ao combate e à educação?
Mônica – Porque o consumo de SPAs está relacionado a um dos aspectos mais subjetivos da condição humana.
Há algumas décadas, quando o consumo de SPAs definidas como ilícitas começou a crescer, ainda se podia falar do consumo de drogas como um comportamento rebelde ou de contestação. Essa não é mais a realidade atual. Hoje cada indivíduo pode apresentar uma justificativa diferente para consumir drogas. Inclusive, porque hoje, as substâncias também são muitas e se multiplicam a cada dia.
Se na década de 60 falávamos de drogas naturais, hoje existe um mercado enorme para drogas sintéticas, aquelas manipuladas em laboratórios.
Então, as abordagens necessárias são também inúmeras. Nós continuamos falando de “combate”, como se fosse possível combater às drogas.
Na verdade, o que se pode tentar é batalhar por uma vida melhor para cada indivíduo, de modo que as pessoas possam prescindir de uma substância alteradora de seu estado de consciência. Nossa tarefa, como profissionais, como psicólogos, não é erradicar a presença de SPAs das vidas das pessoas.
O ser humano sempre usou e sempre buscará usar drogas naturais
ou sintéticas para ajudá-lo a suportar a sua própria fragilidade.



FMA – Como assim?
Mônica – Em primeiro lugar, não devemos apontar toda nossa munição para a abstinência. Simplesmente porque isso não é possível para a espécie humana. O ser humano sempre usou e sempre vai buscar usar drogas naturais ou sintéticas para ajudá-lo a suportar sua própria fragilidade. 
É bom lembrar que nem toda pessoa que se relaciona com substâncias proibidas tem ou terá problemas relativos a esta prática. E mais: temos que entender que o contrário de dependência é independência e não, abstinência.
Temos que entender bem esta lição para depois pensar em alternativas, verdadeiramente eficazes, para a diminuição do abuso de drogas e da patologia das dependências. Como? Por meio de uma educação consciente para a autonomia e responsabilidade do indivíduo.


FMA – Em relação à orientação, qual a maior dificuldade encontrada pelos pais, em casa, e pelos professores?
Mônica – O que vemos, em geral, é uma tentativa de enquadrar o adolescente a um padrão previamente estabelecido. Geralmente, este padrão favorece os adultos, ou seja, os pais e professores.
Somente a partir do compromisso desses educadores com a formação plena do adolescente, por meio da oferta de um espaço seguro para seu crescimento físico, emocional, em que possa exercer de fato sua cidadania, é que os adultos passarão a ser considerados merecedores do respeito deles ou dignos de sua confiança.
É uma tarefa muito delicada acompanhar a travessia de um adolescente para a vida adulta.


FMA – Existe uma orientação básica ou uma dica importante tanto para os pais ou professores que têm um problema pela frente com filhos ou alunos?
Mônica – Olha, o melhor mesmo é escutá-los. Dialogar com eles. Buscar, honestamente, entender o que o adolescente está tentando dizer, para então ajudá-lo a expressar o conflito contido naquele problema ora apresentado. Não se deve sentir segurança total sobre o conhecimento do processo pelo qual o adolescente passa. É bom lembrar que essa é uma vivência única para cada indivíduo, assim como foi também para você, pai ou professor.


FMA – Existe uma diretriz básica a seguir?
Mônica – É importante não confundir as diretrizes básicas do que é chamado de “processo normal da adolescência” com toda e qualquer experiência que aquele indivíduo em formação pode estar experimentando.
Os dependentes, sobretudo na adolescência, carecem de um sentido de identidade com o qual se sintam confortável. Ao se adiantar ao que o adolescente pode estar tentando anunciar, nada se faz além de reforçar sua ferida básica, ao negar-lhe um espaço de expressão próprio e pessoal.
É importante garantir todo o espaço necessário para que o adolescente se expresse. Só então, junto com ele, se buscará uma solução. A experiência mostra que cada um, isoladamente, não é capaz de encontrar.


FMA – Uma autoridade para entrar numa favela, tem que pedir licença ao tráfico. Favela virou sinônimo de comércio e disputa de pontos de drogas e seus moradores confundidos com criminosos. Há solução?
Mônica – Há, desde que as pessoas aceitem esse fenômeno com o menor preconceito possível. Em primeiro lugar, há que se entender que o comércio de substâncias ilícitas representa uma das maiores economias do mercado do mundo. Assim, não há como desconsiderar o apelo econômico dessa atividade. Ela exerce uma atração sobre todo e qualquer indivíduo que busque um ganho financeiro suficiente para atender suas expectativas materiais e sociais.
As populações menos atendidas socialmente, em geral estabelecidas em modelos habitacionais menos organizados e menos protegidos pelos governos, como são as favelas, buscam suas próprias formas de organização, de geração de riqueza e de atenção às suas mais variadas necessidades. O comércio de drogas é uma dessas formas.
Existem outros, por exemplo, o comércio clandestino de armas e de animais. Ficaríamos mais próximos da realidade se entendêssemos as favelas como ponto de sobrevivência. Ou como sinônimo de alternativa ao abandono material, ético e social a que a maioria dos brasileiros se encontra. Ficaríamos mais próximos da realidade se entendêssemos as favelas como sinônimo de alternativas ao abandono material, ético e social a que a maioria dos brasileiros se encontra.



FMA – Você defende uma estratégia diferente que é justamente a Redução de Danos, ou seja, uma tolerância assistida. Como funciona isto?
Mônica – Primeiro, vamos entender bem o que significa esta proposta. A Redução de Danos, comumente chamada de RD, teve início da década de 80. Foi uma resposta de saúde pública à epidemia da Aids e Hepatite C que se alastrava em alguns países da Europa. Atingia o que se costuma chamar de “grupos de risco”, entre eles os usuários de drogas injetáveis. Ao se perceber a impossibilidade de algumas pessoas em interromper o uso de drogas, foram defendidas medidas para que, ao quadro de consumo de SPAs, não se sobrepusessem problemas relacionados a outras esferas da saúde como a infecção pelo HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis. Ou ainda, a doenças transmitidas pelo compartilhamento de apetrechos utilizados no uso injetável de drogas.
Esta prática já havia sido experimentada na década de 20, quando o médico inglês, Humphrey Rolleston, defendeu o tratamento da dependência de heroína, muito comum na Inglaterra naqueles tempos.


FMA – E como funcionava?
Mônica – Funcionava com a administração de doses controladas da própria substância. Tanto a Inglaterra como a Holanda propuseram um acompanhamento do uso controlado de drogas injetáveis. Com isso, procurava-se estimular o contato entre os UDIs (usuários de drogas injetáveis) e agentes governamentais de saúde. Era uma forma de garantir o máximo de atenção possível aos agravos da prática do uso de drogas, sem a preocupação primordial de se interromper o próprio uso. 
Assim, de uma preocupação focada no controle da epidemia de Aids, a Redução de Danos acabou disseminando o debate mundial sobre a necessidade de se rediscutir a política internacional de drogas, chamada de proibicionista.


FMA – Proibicionista?
Mônica – Sim, o nome proibicionista nasceu na Convenção de 1961 das Nações Unidas que vetou qualquer padrão de consumo das substâncias definidas como ilegais. A RD se apresentou, então, como uma alternativa, justamente por reconhecer que a abordagem praticada nas últimas décadas, desde a Convenção de 61, produzia mais problemas e agravos à saúde e ao bem-estar social dos usuários de drogas do que o próprio consumo das substâncias proscritas.


FMA – E quais as principais medidas na política de Redução de Danos?
Mônica – A RD defende a diminuição dos riscos associados ao consumo de substâncias psicoativas, tanto para o indivíduo quanto para o grupo social onde ele se insere. São quatro pontos fundamentais:
1 – Usos não injetáveis são defendidos onde o uso injetável é a norma;
2 – Drogas menos danosas são estimuladas em lugar daquelas de maior risco para diferentes indivíduos;
3 – Quantidades menores são preferíveis às maiores;
4 – Usos em locais seguros, controlados por equipes de saúde, são preferíveis a usos feitos em locais públicos, sem qualquer controle.


FMA – Essa tolerância assistida não estimularia mais o uso de drogas?
Mônica – A prática da RD, pela polêmica que suscita, acabou sendo uma das abordagens mais estudadas dentre os modelos de atenção aos usuários de drogas.
Em nenhum estudo, conduzido por organizações particulares ou por agências das Nações Unidas, foi detectado qualquer aumento do uso problemático de substâncias psicoativas. Um aumento nos usos recreativos ou ocasionais, ambos não problemáticos, pode até ser observado em alguns casos, mas em nenhum deles, essa situação reverteu para um aumento do consumo problemático ou sistemático de qualquer droga considerada ilícita.


FMA – Como vai este programa no mundo e também no Brasil? Tem apoio? Quais os obstáculos que encontra?
Mônica – A proposta da RD tem encontrado cada vez mais apoio tanto dentro quanto fora do Brasil. A entrada de agências das Nações Unidas como a OMS (Organização Mundial de Saúde)por exemplo, na defesa dessa abordagem selou, definitivamente, seu lugar entre as medidas de atenção a usuários e dependentes químicos defendidas e praticadas no mundo todo.
Existem, no entanto, países ou localidades que ainda tentam diminuir a influência da Redução de Danos no rol de estratégias de saúde pública adotadas no enfrentamento desse fenômeno.


FMA – Você tem explicação para isto?
Mônica – Entendemos essa resistência como expressão da dificuldade que algumas nações ainda apresentam em oferecer um espaço verdadeiramente democrático de direitos aos seus cidadãos.


FMA – Mas não é o caso dos Estados Unidos?
Mônica – No caso dos Estados Unidos é porque eles ainda defendem a guerra total às drogas como política pública. Isto apesar de um resultado bastante duvidoso que essa abordagem oferece para um encaminhamento eficaz da questão e da evidente interferência que essa prática representa nos direitos dos cidadãos estadunidenses. 
Países asiáticos, como a Tailândia, também tentam resistir à inexorabilidade dessa prática como alternativa aos métodos punitivos praticados, como regra, até o final do século passado.
Mas, cada vez mais, a pressão de organismos internacionais, da Human Rights Watch (Organização de Defesa dos Direitos), além de organizações nacionais, acaba por limitar as restrições que esses países tentam impor, fazendo da Redução de Danos uma realidade já praticada em todo o mundo.


FMA – Qual é o grande mal das drogas?
Mônica – É a perda do controle da pessoa sobre elas. É a inversão dos papéis a que se submetem pessoas que abusam ou dependem de substâncias psicoativas. Não é a pessoa que controla a substância consumida e nem a quantidade, o tipo e o momento. É a droga que acaba por controlar toda a vida da pessoa.


FMA – Mas isso acaba não sendo privilégio somente das drogas…
Mônica – É verdade. Hoje vivemos sociedades que estimulam e favorecem a perda da autonomia pessoal em várias situações. Por exemplo, quando confundem espaços físico e emocional públicos com privados. Quando definem os significados que as vidas todas devem perseguir. E quando tentam conformar todos os indivíduos em modelos estabelecidos, segundo normas de mercado. A enorme exposição a que se submetem muitos indivíduos, a impossibilidade de encontrar um significado em experiências particulares, únicas e pessoais, a necessidade de preencher um espaço interno com significados externos, tudo isso faz com que, sem perceber, as pessoas acabem por procurar refúgio nas drogas, na comida, no sexo, no trabalho, no jogo.
Por isso, mais uma vez, o antônimo de uso problemático de drogas não é a abstinência, mas sim, a independência, a autonomia, a personificação de buscas e projetos que trarão significado verdadeiro para a vida de cada um.




Nunca foi possível ao ser humano prescindir de substâncias que modifiquem seu estado de consciência.




 


Mônica Gorgulho lembra aos pais que os profissionais são excelentes assessores, mas não sabem tudo sobre os filhos dos outros e nem sobre a relação de uma família.


 


FMA – Em relação às drogas, em geral, uns usuários são mais tolerantes que outros?
Mônica – Sim, existe uma máxima da Redução de Danos que é reconhecer que diferentes substâncias provocam diferentes resultados, em diferentes pessoas, em diferentes momentos da vida.
Esse é o resumo de toda a complexidade e plasticidade que o consumo de substâncias psicoativas apresenta.


FMA – É difícil para as crianças entender porque algumas drogas são ilegais e outras não…
Mônica – É verdade. É a sociedade que define o que é ser legal ou não. Aí existem as questões culturais, religiosas, políticas e econômicas. No fim do século XIX, o uso do ópio era considerado elegante. Mesmo nos EUA, usava-se essa substância em ocasiões sociais, assim como, hoje, fuma-se charuto ou bebe-se vinho.
 Não existe uma situação de tal forma específica que justifique a ilegalidade de uma substância. Isso é uma construção social. A verdade é que existem alguns estudos que mostram interesses econômicos em transformar algumas drogas e substâncias em ilegais.


FMA – Há, no mundo, várias experiências nesta questão. Os EUA gastam bilhões de dólares para combater o tráfico. A Holanda já tem uma política de tolerância. Ainda não deu para os especialistas tirarem uma conclusão?
Mônica – Talvez, a conclusão possa ser retirada das respostas anteriores. Não existirá nunca um modelo único que atenda a todas as necessidades de diferentes indivíduos, em diferentes países, em diferentes realidades.  Entendemos que uma política de drogas eficaz seria aquela que contemplasse quatro pilares básicos: a repressão, a prevenção, o tratamento e a Redução de Danos.
Só assim, um país poderia dizer que busca, verdadeiramente, uma resposta eficaz para os problemas de abuso e dependência de drogas de seus cidadãos.


FMA – O Brasil está no caminho certo no combate às drogas?
Mônica – Para falar a verdade, o Brasil tem tentado encontrar o melhor caminho para a questão do uso e abuso de drogas, dentro de nossa cultura. Tem havido revisões na legislação que recebem aprovação e críticas de especialistas das diferentes áreas envolvidas nesse debate.
Algumas resoluções são claramente acertadas. Por exemplo, a defesa de penas diferentes daquelas que focalizam somente a privação de liberdade, como prender usuários e dependentes.
 No âmbito da saúde, a criação dos Centros de Atenção Psico-social para pessoas com problemas de consumo de álcool e outras drogas é uma conquista importante.
Acho bom salientar que tanto a Secretaria Nacional Anti-drogas quanto o Ministério da Saúde divulgam muito pouco essas conquistas. Isto priva o público em geral de uma compreensão mais correta tanto do fenômeno em si – como a produção, comércio e consumo de substâncias psicoativas –  quanto das medidas defendidas em nossas políticas públicas.


FMA – Por que a implementação dos avanços já obtidos são tão lentos?
Mônica – Justamente por isto. Vou mais longe, diria até impossíveis. Infelizmente, interpretações muito particulares são feitas sobre dados e fatos por aqueles que defendem uma postura mais conservadora, de modo a manipular a percepção pública sobre esse fenômeno. Diante da falta de uma melhor compreensão, a opinião pública se vê diante de alternativas baseadas em falsos dilemas, atrasando medidas já implementadas em outros países, como a verdadeira descriminalização do uso da cannabis (2*), por exemplo.  


FMA – Uma mensagem para pais que têm este problema em casa?
Mônica – Não acreditem que outras pessoas fora de casa, por mais especialidades que possam ser, saberão melhor do que os pais em resolver qualquer problema referente ao consumo de substâncias psicoativas.  Profissionais são excelentes assessores, mas não sabem tudo sobre os filhos dos outros e nem sobre a relação de uma família.
Usos problemáticos de drogas, geralmente estão relacionados a um sentimento de confusão por parte dos adolescentes. Os pais devem ser os maiores responsáveis em ajudar os filhos a entenderem a fase que enfrentam.
Pode ser trabalhoso, assustador ou, ainda, desafiador. Mas, uma vez conseguido, a vitória será duradoura e fará com que pais e filhos passem a ser verdadeiros companheiros nessa aventura que é a vida.


FMA – E para professores que tem este problema na escola?
Mônica – Não tentem se afastar do problema, livrando-se do adolescente. Muitas vezes, a escola é o único lugar onde o jovem encontra um pouco de diálogo e informação. Aproximem-se mais de seus alunos. Busquem entender o que eles estão tentando dizer e ofereçam alternativas que faltam na vida deles. Sejam compatíveis com a realidade da instituição escolar.


FMA – Há possibilidade do mundo viver sem as drogas?
Mônica – Não acredito. Nunca foi possível ao ser humano prescindir de substâncias que modifiquem seu estado de consciência. Saber-se finito, ter inteligência suficiente para entender a imensidão do que não entendemos é condição muito angustiante, mesmo para os mais brilhantes dos Homens. Porque, apesar de sermos dos animais do planeta os mais fantásticos, somos humanos, demasiado humanos, como já disse Nietzsche.


 



* Uso não-médico de substâncias psicoativas
**  % de usuários que se tornam dependentes
*** Idade do primeiro uso, em anos


GLOSSÁRIO


(*1) Substância psicoativa (SPA) são drogas psicotrópicas que alteram o funcionamento temporário do sistema nervoso do indivíduo. São exemplos de substância psicoativa a maconha, o álcool, a cocaína, LSD etc. Uma substância psicoativa pode ser usada como remédio, ou seja,  com fins terapêuticos para solucionar um problema de saúde, com acompanhamento médico. Mas pode ser utilizada de forma indevida como droga, veneno ou tóxico.


(*2) Cannabis é o gênero botânico de algumas plantas, das quais a mais famosa é a cannabis sativa, da qual se produz o haxixe e a maconha. Cannabis é uma droga que está no centro do debate europeu. Na década de 1960, o seu consumo se tornou praticamente sinônimo de uma crescente contra-cultura juvenil. Historicamente, na Europa são comuns três formas principais de cannabis: a resina de cannabis, a cannabis herbácea e, menos frequente, o óleo de cannabis.


SUMMARY


Legalization of drugs: solution or problem


Mônica Gorgulho  INTERVIEW


Mônica Gorgulho is conducting a silent revolution in Brazil – but not quite so silent since everyone seems to be talking about her.  Clinical psychologist, holding a Masters in social psychology, former associate to the Drug Treatment and Guidance Program (Escola Paulista de Medicina/Universidade Federal de S. Paulo) member of the Executive Board of Directors of the International Harm Reduction Association, representative on the Federal Psychology Counsel and the National Anti-drug Counsel and founder and coordinator of the NGO, Dínamo, Mônica Gorgulho has said that it is much more expensive for society to combat drug use and traffic than to provide assisted tolerance for drug addicts.  The theory is as simple as it is controversial:  if it is not possible to free people from drugs, it would then be better for people to learn to live with them.


Marijuana For a long time drugs such as marijuana and hashish for example were referred to as light drugs, while others such as cocaine and heroine were deemed heavy.  Today this terminology is no longer used much.  However, the use of marijuana, in general, certainly concerns specialists less than the use of crack or acid.  This stance is the result of observations of the effects on consumers of one or another substance.  Thus, the current trend is to regard marijuana as a tolerable drug, but which would require, if legalized, the same attention that we should give the consumption of alcohol.         
Dependency or abstinence  We should not aim all our weapons toward abstinence, simply because a lifetime without using any psychoactive substance is not possible for human beings to achieve. People have always used and will always try to use natural or synthetic drugs to help them prop up their own fragile existence.  It also should be remembered that not everyone who uses prohibited substances has or will have drug use related problems.  Moreover, we need to understand that the opposite of dependence is independence and not abstinence. We need to learn this lesson well so that we can afterward think about truly effective alternatives to decrease drug abuse and the pathology of dependency.  How? This can be achieved by means of conscientious education for autonomy and responsibility of the individual.
Parent and teacher guidanceThe best way is to listen to them. Talk with them.  Honestly seek to understand what adolescents are trying to say, to help them express the conflict inherent to the problem being discussed.  I would say that you should not feel completely secure about the process through which adolescents go.  It is good to remember that this is a unique experience for each person, just as it was for the parent or the teacher. It is important not to confuse the basic guidelines for the so-called “normal adolescent process” with this or any other experience that individual in the growing process may be undergoing.  Drug dependents, especially when they are adolescents need to have a feeling of identity, with which they feel comfortable. If you try to explain the  problem the adolescent may be trying to convey, you are doing nothing more than stressing  the underlying pain and denying the child space for his own personal expression. It is important to assure all the space that an adolescent may need to express him/herself. Only then, together with the child, can you find a solution. Experience has shown that they are unable to find a solution on their own. 
   Favelas and drug trafficking Sales of drugs reflect one of the largest economies of the world market.  Therefore, the economic attraction of this activity should not be disregarded.  It casts a lure to any and all persons who are seeking enough financial gain to meet their material and social expectations. Populations whose social needs are the least fulfilled, in general those living in types of housing that are the least organized and protected by the governments, such as the favelas, endeavor to establish their own forms of organization and means to generate wealth and attention to their wide range of needs.  The drug trade is one way to accomplish this.  There are other means such as for example, the sale of illegal weapons and animals. We would be much closer to reality if we understood favelas from a survival point of view or as a synonym to the alternative to abandoning the material, ethical and social values which the majority of Brazilians already have.
  Harm Reduction – Harm Reduction, commonly referred to as HR, began in the 1980s, in response to the public health AIDS and Hepatitis C epidemic which had spread throughout some countries in Europe.  It afflicted those referred to as “risk groups,” including drug users who shoot up.  In view of the impossibility of some persons to give up drug use, measures were implemented so that the outlook of SPA consumption did not add to the problems related to other health areas such as HIV infection and other sexually transmitted diseases, as well as diseases transmitted by the use of shared drug paraphernalia used to inject them.    
   Measures for Harm Reduction HR defends the decrease in risks related to the consumption of psycho-active substances, in relation to individuals as well as the social group in which they are placed.  There are four fundamental points involved: 1 –  Use of non-injection drugs are defended when the use of injection drugs is the norm; 2 – Less harmful drugs are encouraged instead of those that pose a higher risk to different individuals;  3 – Smaller quantities are preferable to larger ones;  4 –  Use in safe locations, controlled by health workers are preferable to use conducted in public locations which offer no controls.
  The biggest threat of drugs – This is the loss of the person’s control of them.  It is contrary to the role that subjects persons who abuse or depend on psycho-active substances.  It is not the person who controls the substance used or the quantity, type or timing.  It is the drug that ends up controlling the person’s entire life.
   Policy model – There has never been one single model that meets all the needs of different individuals, in different countries and in different realities.  We believe that an effective drug policy would be one that included law enforcement, prevention, drug free oriented treatment and Harm Reduction.  Only then can a country state  that it has truly sought an effective response to the problems of drug use and dependency of its citizens.
Message to parents – Do not believe that other people outside the home, regardless of how specialized they may be, know more than the parents about solving any problem in relation to the consumption of psycho-active substances.  Professionals are excellent advisors, but do not know everything about a certain family’s children or about that family relationships.
Message to teachers – Do not try to distance yourselves from the problem or the adolescent.  Often the school is the only place that a young person has to find a little dialogue and information.  Get closer to your students.  Try to understand what they are attempting to say and offer them alternatives.
A world without drugs Do not believe it. It has never been possible for human beings to dispense with substances that modify their state of consciousness.  It is agonizing to know that we are finite and are intelligent enough to understand the immensity of what we do not understand, even for the most brilliant of us.  Although we are one of the most fantastic animals on the planet, we are overmuch human, as Nietzsche says. 


 

 
 

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Entrevistas

Kátia Queiroz Fenyves fala a respeito de sustentabilidade e meio ambiente

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Kátia Fenyves é Mestre em Políticas Públicas e Governança pela Sciences Po Paris e formada em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo. Ao longo de sua trajetória profissional, acumulou experiências em cooperação internacional para o desenvolvimento sustentável no terceiro setor e na filantropia. Atualmente é Gerente do Programa de Finanças Verdes da Missão Diplomática do Reino Unido no Brasil.

 

1. Você estudou e tem trabalhado com a questão de sustentabilidade e o meio ambiente. Pode nos falar um pouco a respeito desses temas?
Meio ambiente é um tema basilar. Toda a vida do planeta depende de seu equilíbrio. A economia, da mesma forma, só se sustenta a partir dos recursos naturais e de como são utilizados. Sustentabilidade, portanto, foi o conceito que integrou as considerações aos aspectos ambientais, sociais e econômicos, revelando de forma mais sistêmica esta inter-relação e, sobretudo, colocando o meio ambiente como eixo estratégico do desenvolvimento, para além de seu valor intrínseco.

2. Quando se fala em sustentabilidade, pensa-se no tripé social, ambiental e econômico. Como você definiria esses princípios? Qual deles merece maior atenção, ou todos são interligados e afetam nossa qualidade de vida integralmente?
Exatamente, sustentabilidade é o conceito que revela as interligações entre os três pilares – social, ambiental e econômico e, portanto, são princípios interdependentes e insuficientes se tomados individualmente. Talvez, o ambiental seja realmente o único que escapa a isso. A natureza não depende da economia ou da sociedade para subsistir, mas, por outro lado, é impactada por ambos. Por isso, sustentabilidade é um conceito antrópico, ou seja, é uma noção que tem como referencial a presença humana no planeta.

3. Questões relacionadas à sustentabilidade, preservação do meio ambiente e consumo consciente são discutidas nas escolas e universidades?
Há entre as Diretrizes Curriculares Nacionais estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação, que são normas obrigatórias, as específicas para Educação Ambiental que devem ser observadas pelos sistemas de ensino e suas instituições de Educação Básica e de Educação Superior a partir da Política Nacional de Educação Ambiental. Estas contemplam todos os temas citados na pergunta. Não sou especialista na área então é mais difícil avaliar a implementação, mas em termos de marco institucional o Brasil está bem posicionado.

4. Quando se fala em preservação do meio ambiente, pensa-se também nos modelos de descarte que causam tantos danos ao meio ambiente. Existe alguma política de incentivo ao descarte consciente?
Mais uma vez, o Brasil tem um marco legal bastante consistente para o incentivo ao descarte consciente que é a Política Nacional de Resíduos Sólidos de 2010, que é inclusive uma referência internacionalmente. Na verdade, mais que um incentivo ela é um desincentivo ao descarte inconsciente por meio do estabelecimento da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos e a logística reversa. Isso significa que a PNRS obriga as empresas a aceitarem o retorno de seus produtos descartados, além de as responsabilizar pelo destino ambientalmente adequado destes. A inovação fica sobretudo na inclusão de catadoras e catadores de materiais recicláveis e reutilizáveis tanto na logística reversa como na coleta seletiva, algo essencial para um país com nosso contexto social.

5. Você acha que os modelos de descarte atuais serão substituídos por novos modelos no pós-pandemia? O que fazer, por exemplo, para incentivar as pessoas a descartar de forma consciente as máscaras antivírus?
Sempre é preciso se repensar e certamente a pandemia deu destaque a certas fragilidades da implementação da PNRS. Grande parte dos hospitais brasileiros ainda não praticam efetivamente a separação e adequada destinação de seus resíduos e, na pandemia, este problema é agravado tanto pela maior quantidade de resíduos de serviços de saúde gerados como por uma maior quantidade de geradores, uma vez que a população também começa a produzir este tipo de resíduo em escala. Falta ainda muita circulação da informação, então talvez este seja o primeiro passo: uma campanha de conscientização séria que jogue luz nesta questão.

6. Na sua opinião, o mundo está mais consciente das necessidades de preservação do meio ambiente e dos recursos naturais para que gerações futuras possam deles usufruir?
Acredito que tenhamos passado do ponto em que estas necessidades de preservação eram uma questão de consciência e chegamos a um patamar de sobrevivência. Também não se trata apenas das gerações futuras, já estamos sofrendo as consequências do desequilíbrio ambiental provocado pela ação humana e do esgotamento dos recursos naturais desde já. A própria pandemia é resultado de relações danosas entre o ser humano e o meio ambiente e os conflitos por fontes de água, por exemplo, são uma realidade.

7. Quais as ações que mais comprometem e degradam o meio ambiente?
Nosso modelo produtivo e de consumo como um todo é baseado em uma relação predatória com o meio ambiente: retiramos mais do que necessitamos, sem respeitar os ciclos naturais de reposição e, além disso, quando descartamos os resíduos e rejeitos não cumprimos com os padrões adequados estabelecidos. Já temos conhecimento suficiente para evitar grande parte dos problemas, mas ainda não conseguimos integrá-lo nas nossas práticas efetiva e definitivamente.

8. O que na sua opinião precisa ser feito para que as sociedades conheçam mais a respeito de sustentabilidade, preservação do meio ambiente e consumo consciente?
Acredito que para avançarmos como sociedade precisamos tratar a questão das desigualdades socioeconômicas que estão intrinsicamente relacionadas a desigualdades ambientais, inclusive no que diz respeito às informações, ao conhecimento. A educação é, portanto, um componente estratégico para este avanço, mas é preciso ter um entendimento amplo que traga também os saberes tradicionais para esta equação. Além disso é preciso cada dia mais abordar o tema da perspectiva das oportunidades, pois a transição para modos de vida mais sustentáveis, que preservam o meio ambiente e que se baseiem em consumo conscientes alavancam inúmeras delas; por exemplo, um maior potencial de geração de empregos de qualidade e menos gastos com saúde.

9. A questão climática está relacionada com a sustentabilidade? Como?
A mudança do clima intensificada pela ação antrópica tem relação com nossos padrões de produção e consumo em desequilíbrio com o meio ambiente: por um lado, vimos emitindo uma quantidade de gases de efeito estufa muito significativa e, por outro, vimos degradando ecossistemas que absorvem estes gases, diminuindo a capacidade natural do planeta de equilibrar as emissões. Assim, a questão climática está relacionada com um modo de vida insustentável. A notícia boa é que práticas sustentáveis geram diretamente um impacto positivo no equilíbrio climático do planeta. Por exemplo, o Brasil tem potencial para gerar mais de 25 mil gigawatts em energia solar, aproveitando sua excelente localização geográfica com abundância de luz solar, uma medida sustentável que, ao mesmo tempo, é considerada uma das melhores alternativas para a diminuição das emissões de CO2 na atmosfera, que é um dos principais gases intensificadores do efeito estufa.

 

 

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Entrevistas

MARCOS TERENA

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De filho pródigo à liderança internacional, o índio, piloto e cacique Marcos Terena, tornou-se um líder respeitado e o ponto de equilíbrio entre autoridades brancas e os povos indígenas.

O índio, piloto e cacique Marcos Terena é uma liderança respeitada internacionalmente e o ponto de equilíbrio autoridades brancas e os povos indígenas. Terena tem uma de luta, de diálogos e de fé.
Voltemos no tempo. Em 1990, o jornalista Zózimo Barroso do Amaral deu em sua coluna do Jornal do Brasil uma nota, com o título “Procura-se” dizendo que o líder indígena Marcos Terena acabara de ser demitido da Funai, onde era piloto – mesmo tendo entrado em avião só como passageiro e morrendo de medo.
Foi na resposta de Marcos Terena ao JB, que se conheceu o valor, a grandeza, a altivez e a dignidade de um índio. Escreveu ele ao JB:
“Sou um dos 240 mil índios brasileiros e um dos seus interlocutores junto ao homem branco. Quando ainda tinha nove anos, fui levado a conhecer o mundo. Era preciso ler, escrever e falar o português. Um dia a professora me pôs de castigo, não sabia por quê, mas obedeci. Fiquei de frente para o quadro negro, de costas para a sala. Quando meus colegas entraram, morreram de rir. Não sabia o motivo, mas sentia-se orgulhoso por fazê-los rir. Eles riam porque descobriram meu segredo: meu sapato não tinha sola, apenas um buraco, amarrado por arame. Naquele momento, sem querer, acabei descobrindo o segredo do homem civilizado: suas crianças não eram apenas crianças. Apenas uma palavra as separava das outras crianças: pobreza.” 
E Terena continua sua carta:
“Um dia me chamaram de “japonês”. Decidi adotar essa identidade. E fiz isso por 14 anos.” 
Foi passando por japonês que Marcos Terena conseguiu estudar, entrar para a FAB, aprender a pilotar. Veio para Brasília. Deixou de ser japonês para voltar a ser índio. Ai descobriu que era “tutelado”. Mais: como tinha estudo, começou a explicar a lei para seus companheiros de selva. “Expliquei – diz ele – e fui acorrentado. Pelos índios, como irmãos. Pela Funai, como subversivo da ordem e dos costumes”. Veio o drama: continuar sendo branco-japonês e exercer sua profissão de piloto, ou voltar a ser índio, mesmo sendo subversivo. Marcos Terena era o próprio filho pródigo. Sabia ler, escrever, analisar o mundo, entender outras línguas. Mas, como índio, recebeu um castigo dos tutores da Funai: não podia exercer sua profissão, pilotar. Só depois de muita luta, recebeu seu brevê do Ministério da Aeronáutica. A carta de Terena ao JB continua. É linda. Uma lição! Quando publicada, mereceu uma crônica especial da Acadêmica Rachel de Queiroz.
E Terena, ao concluir sua carta, lembrou ao jornalista: “Não guardo rancores pela nota. Foi mais uma oportunidade de fazer valer a nossa voz como índio. Gostaria apenas que o jornalista inteirasse dessas informações todas e soubesse de minha vontade em tê-lo como amigo”. 
Respeitado por índios e brancos, sulmatogrossense de Taunay, Marcos Terena, 66 anos, maior líder do Movimento Indigenista Brasileiro – é um exemplo. Seu nome, sua obra e sua luta se confundem com a própria natureza: rica, dadivosa, exuberante, amiga e fiel.
CINCO BRANCOS E CINCO ÍNDIOS DE VALOR
1 – CINCO HOMENS BRANCOS QUE SOUBERAM OU SABEM VALORIZAR A CULTURA INDIGENISTA?
TERENA – O Marechal Cândido Rondon, o antropólogo Darcy Ribeiro, o escritor Antônio Callado, o cantor Milton Nascimento e o sertanista Orlando Villas Boas.
2 – QUAIS OS CINCO ÍNDIOS MAIS IMPORTANTES NA HISTÓRIA BRASILEIRA?
TERENA – Cacique Cunhambebe, da Conferência dos Tamoios; Cacique Mário Juruna, dos Xavantes; Cacique Raoni, dos Txucarramãe, Cacique Quitéria Pankararue; e Cacique Marcolino Lili, dos Terena.
3 – A POLÍTICA É UMA ARMA PARA SE FAZER JUSTIÇA OU UM CAMINHO MAIS FÁCIL PARA ENCOBRIR INJUSTIÇAS?
TERENA – O poder legislativo é um pêndulo necessário entre os três poderes. Mas a única participação que tivemos foi do Deputado Mario Juruna, eleito pelo voto do RJ. O ideal seria assegurar algumas cadeiras no Senado e na Câmara aos diversos setores sociais, como uma verdadeira “assembleia do povo brasileiro” e não somente aos sindicatos organizados ou aos cartéis dos ricos e poderosos.
POPULAÇÃO INDÍGENA HOJE
4 – NAS SUAS CONTAS, QUAL A POPULAÇÃO INDÍGENA HOJE NO BRASIL?
TERENA –  Já fomos mais de 5 milhões, com 900 povos. Hoje estamos em fase de reorganização e crescimento já beirando os 530 mil em aldeias, e depois dos eventos nacionais e internacionais de afirmação outros 500 mil em centros urbanos, com mais de 300 sociedades e 200 línguas vivas em todo o Brasil.
5 – AS MISSÕES RELIGIOSAS QUE ATUAM NAS ÁREAS INDÍGENAS SÃO BOAS OU RUINS?
TERENA – As missões religiosas sempre foram a parte a abençoar os primeiros contatos com os indígenas. Elas foram criadas para gerenciar os mandamentos bíblicos e cristãos, mas no caso indígena cometeram um grande pecado. Consideraram os índios como pecadores e sem almas por não usarem roupas e não terem a mesma fé dos brancos. Isso foi ruim pois sempre respeitamos de forma sagrado o Grande Espírito.
6 – OS ÍNDIOS JÁ SERVIRAM COMO MARKETING PARA OS PORTUGUESES (MOTIVO DE FINANCIAMENTO DE NOVAS EXPEDIÇÕES, POIS O MUNDO CATÓLICO TINHA QUE SALVAR ALMAS) JÁ SERVIRAM COMO MARKETING PARA CANTORES DE ROCK, PARA ONGS, PARA CANDIDATOS E PARA GOVERNOS. ÍNDIO É UM BOM MARKETING?
TERENA – Índio é uma marca muito boa, porque índio é terra, é ecologia, é bem viver. Isso não foi usado só por artistas da mídia, mas por fabricantes de joias, de produtos de beleza, de comida e medicina alternativas. Geralmente isso não traz nenhum retorno para nossa causa, basta ver o descaso como a Funai é tratada dentro do Governo e, com ela, os índios.
7 – QUEM PENSA GRANDE E QUEM PENSA PEQUENO NA FUNAI?
TERENA – Os índios pensam de forma ampla porque pensam nas suas terras, nos seus ecossistemas como fonte para o futuro do país. Em compensação os últimos presidentes da Funai foram passivos, paternalistas e incompetentes para a promoção dos valores indígenas e da própria instituição como empoderamento étnico, institucional e fonte de respostas para o País e para o mundo.
SONHO: DEMARCAÇÃO E CÁTEDRA ÍNDÍGENA
8 – JURUNA FOI UM LÍDER ELEITO PELO HOMEM BRANCO. VALEU, PARA OS ÍNDIOS, ESSA EXPERIÊNCIA PARLAMENTAR?
TERENA – A lembrança de Mário Juruna é um marco na história dos Povos Indígenas. Como Cacique foi o maior dos últimos tempos, sendo respeitado pelas autoridades brasileiras por sua forma de ser, mas como Parlamentar não foi bem assim. Houve falta de assessoria suficientemente hábil, para sua reeleição por exemplo, para abrir portas para novos valores indígenas, até hoje…
9 – QUAL O GRANDE SONHO DA FAMÍLIA INDIGENISTA PARA O ANO 2020?
TERENA – A demarcação de todas as terras. Cumprir a Constituição e não rasgá-la como querem alguns parlamentares como a bancada ruralista; eleger o maior número de vereadores e prefeitos índios; criar uma Cátedra Indígena com um perfil de Universidade Intercultural, e transformar a Funai num Ministério do Índio, e inovar nas relações com os poderes públicos, nomeando indígenas para esses cargos, pois eles existem.
10 – RELIGIÃO: O HOMEM BRANCO NÃO RESOLVEU SEUS PROBLEMAS COM A RELIGIÃO QUE TEM, MAS ACHA QUE DEVE LEVAR SUA RELIGIÃO PARA OS ÍNDIOS. O QUE ACHA DISSO?
TERENA – Os índios creem em Deus, o grande Criador. Muitas aldeias já aderiram aos costumes cristãos, tendo inclusive pastores e sacerdotes indígenas, que rezam e cantam na língua nativa. Acho que acima de tudo, Deus tem um plano para os índios. Ajudar o homem branco a conhecer o verdadeiro Deus, que fez os céus, a terra e a água, onde estão as fontes de sabedoria, de respeito às crianças e aos velhos, e dos alimentos e medicamentos do futuro. Lamentamos muito que em nome da Paz e do seu Deus, o homem branco continue matando.
11 – O QUE O ÍNDIO ESPERA DA CIVILIZAÇÃO, DO HOMEM BRANCO DE HOJE?
TERENA – Na verdade, agora estamos mais especializados em assuntos do branco, percebemos uma grande carência de metas e ideais que não dependem apenas de dinheiro ou poder. A sociedade do novo Milênio se perdeu entre as novas tecnologias e está gerando uma sociedade sem velhos e jovens, onde a Mulher por ser Mulher, poderá ser o equilíbrio, a tábua de salvação dos valores sociais, interétnicos, econômicos e religiosos. Um governo que defende o armamento de sua sociedade não está a favor do bem estar de seu Povo e sim dos interesses das indústrias de armas e guerras. O índio brasileiro não aceita ser parte da pobreza, mas quer mostrar que podemos ajudar, contribuir, mas dentro de um respeito mútuo.
“POSSO SER O QUE VOCÊ É, SEM DEIXAR DE SER QUEM SOU!”
12 – SUA LUTA É PROVAR QUE A DIFERENÇA CULTURAL É FATOR DE DISCRIMINAÇÃO QUANDO DEVERIA SER FATOR DE UNIÃO PELA PLURALIDADE ÉTNICA. VOCÊ CONSEGUE PASSAR ESSA MENSAGEM?
TERENA – Eu tive oportunidade de nascer em uma pequena aldeia, de estudar sem qualquer apoio ou cotas, e mesmo com a discriminação poder chegar a fazer um curso de aviadores na FAB. Aprendi muito com os valores militares. Tenho uma profissão rara, que é pilotar aviões. Outros índios não tiveram essa oportunidade. Muitos cansados, desiludidos voltaram para suas Aldeias para formar um novo espírito de lideranças tradicionais, religiosas e políticas. Mas no novo Milênio é impossível aceitar quaisquer argumentos que nos isolem das oportunidades, por isso quando começamos o movimento indígena nos anos 80, buscamos aliados para trocas de ideias dos nossos valores e da sociedade como um todo, organizando os índios, debatendo com mestres da Antropologia, da CNBB, da OAB, da SBPC, envolvendo artistas e personalidades – tudo isso ajudou a sermos melhores compreendidos. Ajudou-nos a levar uma nova mensagem aos brasileiros: “Posso ser o que você é, sem deixar de ser quem sou!”
CULTURA FORTE, MAS ECONOMIA FORTE
13 – OS ÍNDIOS PARECIS SÃO HOJE GRANDE PRODUTORES RURAIS. FAZEM DUAS SAFRAS POR ANO DE SOJA, MILHO, GIRASSOL E OUTROS PRODUTOS. TRÊS MIL ÍNDIOS FAZEM MAIS DE R$ 50 MILHÕES COM O AGRONEGÓCIO. TEM ÍNDIO PILOTO DE COLHEITADEIRA, AGRÔNOMO E TEM ÍNDIO ESPECIALISTA EM MERCADO. FUNAI E IBAMA CRIAM TODAS AS DIFICULDADES BUROCRÁTICAS A ELES. O QUE VOCÊ ACHA DISSO?
TERENA – Temos que olhar com desconfiança tudo que é mágico. Se todos os agricultores fossem plantar soja para ficarem ricos, não haveria pobreza e fazendeiros endividados com bancos e credores. Teríamos condições de plantar soja, mas também seguir os princípios indígenas de gerar a segurança alimentar familiar. O Agronegócio não funciona assim. Por outro lado, os irmãos indígenas estão se empenhando em fazer a sua parte, que é demonstrar sua inteligência no manejo com a terra e sua força de trabalho. Ainda não sabemos como foram feitos os acordos financeiros das partes envolvidas.
14 – VOCÊ ACHA QUE O GOVERNO ESTÁ MEIO INDECISO?
TERENA – O Ministério da Agricultura do governo Bolsonaro tem demonstrado sua contradição interna. Alguns assessores de alto nível emitem sons de discriminação histórica e até de ódio. Então como acreditar fielmente que esse Ministério é um aliado. Seria um marketing ou seria a reformulação do Anhanguera quando mentiu para os antigos donos dessas terras, ao ameaçar por fogo em todos os rios, ao acender um fogo com aguardente? O mais estranho é que os órgãos de fiscalização e controle e defesa dos povos indígenas como a FUNAI e o IBAMA, estão sendo descontruídos como tais, mas felizmente isso não acontece com o Ministério Público Federal, que certamente dará um norte nos encaminhamentos futuro.
De toda forma, sempre defendo a livre determinação dos Povos Indígenas, a começar pela demarcação territorial, com cultura forte, mas economia forte também.
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Entrevistas

Luciano Cordoval – Entrevista sobre Barraginhas

As águas vão rolar

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Barraginhas: a salvação das lavouras

A solução para os desertos de Gilbués

Silvestre Gorgulho

Desde a primeira reportagem da Folha do Meio Ambiente sobre o deserto vermelho de Gilbués, em outubro de 2005, o tema não saiu mais da mídia. Depois vieram as matérias sobre as barraginhas. Primeiro em Minas Gerais, depois as experiências feitas pelo técnico da Embrapa, Luciano Cordoval, no Piauí. Mais precisamente na região do entorno do Parque da Serra da Capivara. Cordoval, coordenador do projeto, preparou 30 técnicos da Emater-PI e da COOTAPI – Cooperativa de Técnicos Agrícolas do Piauí que treinaram outros multiplicadores das comunidades locais. Todos foram responsáveis pela implantação de mais de 300 das 3.600 barraginhas programadas na zona rural de 12 municípios: São Raimundo Nonato, Guariba, Paes Landim, Oeiras, São Lourenço, Caracol, Jurema, Acauã, Paulistana, Santa Luz, Coronel José Dias e Aniz de Abreu. E agora as barraginhas chegaram ao município de João Costa, que tem desertos vermelhos à semelhança de Gilbués. Se a iniciativa salvar as terras de João Costa, com certeza Gilbués, também, estará salva. Graças às barraginhas e ao trabalho incansável de um técnico persistente e sonhador: Luciano Cordoval.

A foto mostra o estado avançado de degradação. As casinhas, ao fundo, é a prova
de que já houve um apogeu, onde tudo era verde coberto de matas, mas a ação do homem foi tornando o cenário desertico

 

Folha do Meio – O que o motivou a trabalhar para tentar reverter a degradação das terras de Gilbués?
Luciano Cordoval
– Quando vimos pela primeira vez, na Folha do Meio Ambiente, a reportagem sobre o deserto vermelho de Gilbués, em outubro de 2005, ficamos extremamente estarrecidos.
Olha, foi impressionante  ver aquelas imagens publicadas. Mas, imediatamente, este estarrecimento deu origem a uma empolgação. Sim, porque comecei a buscar uma solução. Queria enfrentar aquele desafio. Queria montar uma equipe para desenvolver tecnologias sociais de conservação de solos e água. Não é fácil trabalhar à distância. Mas este problemão de Gilbués é uma questão humanitária e de solidariedade.

FMA – Você tem acompanhado na mídia o desdobramento da questão dos desertos de Gilbués?
Luciano 
– Sim, estou acompanhando tudo desde aquela primeira matéria que saiu na Folha do Meio. Depois vieram os desdobramentos como no Globo Rural – que até mostrou o jornal de vocês – Globo Repórter, novamente a Folha do Meio Ambiente, com as cartas dos leitores, e muitas citações na Internet.
E o tempo foi passando. Iniciamos nossos trabalhos de captação de águas superficiais de chuvas, pelas barraginhas, para conservação dos solos e água e revitalização de mananciais e córregos, no Semi-Árido e Sub-Úmido piauienses.
Dentre os municípios abrangidos pelo projeto, destacamos o de João Costa, pelo elevado grau de degradação de seus latossolos vermelhos, sob vegetação de Cerrado, após desmatamentos, o que o torna muito parecido ao deserto de Gilbués.

FMA – João Costa está longe de Gilbués. Como você descobriu o deserto vermelho de João Costa ?
Luciano –
O avanço das barraginhas, no Piauí, foi planejado para contemplar doze municípios, sendo oito do Semi-Árido e quatro na transição para o Sub-úmido. Em março e abril de 2007, após caminhada pelos sete municípios vizinhos, para implantar o sistema, chegamos a João Costa.
Eles já tinham ouvido falar do projeto e tiveram o privilégio de assistir recentemente, por meio de suas parabólicas, a uma reportagem da TVE, no programa Mobilizando o Brasil, mostrando o avanço das barraginhas no Semi-Árido piauiense e já estavam ansiosos. Isso porque 60 a 70% dos solos do município encontram-se em elevado grau de degradação. Essa situação criou um am-
biente contagiante, favorável, que está contagiando a todos.

“O que for bom para a região de João Costa será bom para Gilbués. João Costa será uma vitrine demonstrativa para a solução dos desertos vermelhos”

FMA – Por que esses municípios piauienses foram contemplados?
Luciano –
Porque as barraginhas, ao serem premiadas e certificadas como tecnologia social da Fundação Banco do Brasil, em 2003, receberam um aval para serem disseminadas pelo país, e o estado escolhido foi o Piauí. Mais especificamente a região de seu Semi-Árido e um pouco da transição ao Sub-Úmido.
Na verdade foi pela repercussão do sucesso de nossas experiências em Minas Gerais, nos últimos dez anos. Além de nove municípios do Semi-Árido, foram escolhidos três do Sub-Úmido, sob vegetação de Cerrado. Guaribas, Santa Luz e João Costa se enquadram nessa categoria e são mais parecidos com as regiões de Minas onde já vimos desenvolvendo nosso trabalho com as barraginhas. Desde o início, esperávamos muito desses municípios e eles estão correspondendo.

“É preocupante tendência atual de converter enormes áreas em cultivos para a
produção de etanol. O homem avança, come o filé e deixa os ossos: os desertos vermelhos
”.

FMA – Você acredita que João Costa possibilitará o desenvolvimento de um protótipo para Gilbués?
Luciano
– Mesmo estando a 400km de distância, João Costa tem muita similaridade com a região degradada de Gilbués, quanto a solos, predominando os latossolos vermelhos, muito frágeis frente à erosão, além de um regime de chuvas parecido, acima de 1.000 mm. E como nós já estamos familiarizados com a região, as  pessoas  já  estão mobilizadas e motivadas.
Também já foram implantadas as primeiras 300 barraginhas. Agora, nós também estamos motivados e encantados, principalmente com o clima favorável instalado. E também com  todo esse envolvimento que está nos motivando buscar mais recursos para complementar nossa experiência. Estamos  utilizando esse município como nossa base para introduzir uma cultura de plantios em nível, terraceamentos, plantio direto e trabalhar a educação ambiental sustentável.
Assim, queremos mais e mais barraginhas nas fissuras/erosões maiores e milhares de microbarraginhas, não dispersas, mas coladas umas às outras, como alvéolos no “favo de mel”, nas microenxurradas capilares, nas encostas degradadas.

FMA – Como é mesmo esse sistema “favos de mel”?
Luciano
– As barraginhas tradicionais serão feitas nas grandes enxurradas, que já apresentam os sulcos feitos pela erosão. Os milhares de alvéolos (microbarraginhas) serão nas enxurradas minúsculas, capilares, quase imperceptíveis, serão como guarda-chuvas invertidos e dentro de cada alvéolo será plantada uma árvore leguminosa nitrificadora, como leucena e algaroba, que deixará suas folhas caírem, para recuperar o solo.
Enquanto se gasta uma hora de máquina para uma barragi-nha, fazem-se de 8 a 12 microbarraginhas nesse mesmo tempo.

FMA – Então, João Costa será o laboratório?
Luciano
– Justamente, será o laboratório que pensávamos ter na própria região de Gilbués. Já nos encantamos com a região, com o povo, com a problemática, há reciprocidade, é tudo que necessitávamos.
O que for bom para a região de João Costa será bom para Gilbués. Assim, pretendemos tornar João Costa uma vitrine demonstrativa para a solução desse problema de desertos vermelhos de regiões com solos sob vegetação de Cerrado. Domados os solos-problemas, daí a levar para regiões similares, é questão de arranjos adaptativos, ajustes, sintonia fina.
O importante é o homem, o envolvimento com o povo e esse já é nosso parceiro em João Costa, é meio caminho andado. O mais, é correr atrás dos recursos e trabalhar, trabalhar, estamos otimistas.

FMA – Você acredita que outros desertos poderão surgir?
Luciano
– Creio que isso é inevitável, em face do avanço dos desmatamentos e a introdução de pastagens e lavouras sem a aplicação dos cuidados necessários e das técnicas conservacionistas e, principalmente, sem reposição de nutrientes.
Nesse sentido, é preocupante a apressada tendência atual de converter enormes áreas em cultivos para a produção de etanol. O homem avança, come o filé e deixa os ossos, os desertos vermelhos. O Brasil Central está cheio disso.

FMA  – Você é otimista mesmo assim?
Luciano
– Essa é a minha missão, tentar regenerar solos degradados, veredas e matas ci-liares, revitalizar mananciais, nascentes e córregos, implantar capões no entorno das barragi-nhas e nos eixos úmidos formados por elas.Com a umidade readquirida e o sol, vêm o verde, as nascentes, volta a vida, volta a esperança, somos geradores de esperanças e temos conseguido isoo, o que nós torna otimistas.

FMA  – Então,você mudou de estratégia?
Luciano –
Sim, pois desco-brimos nosso sítio de trabalho, tropeçamos no nosso tesouro. Numa região em que a mídia não está fazendo pressão, pode-remos gradativamente, e sem as tensões e cobranças externas, apenas as nossas, ter tranqüilidade para desenvolver nossos planos, não será uma corrida contra o tempo, mas um avanço natural. Penso que nada é por acaso, há momentos em que, como se diz em Minas Gerais, o cavalo está passando arreado à nossa frente…

Os desertos vermelhos de Gilbués estão à espera dos resultados dos experimentos com as barraginhas de João Costa. Uma esperança a caminho.      (Foto: André Pessoa)

 

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