Entrevistas
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Drogas: problemas e soluções
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Entrevistas
Kátia Queiroz Fenyves fala a respeito de sustentabilidade e meio ambiente

Kátia Fenyves é Mestre em Políticas Públicas e Governança pela Sciences Po Paris e formada em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo. Ao longo de sua trajetória profissional, acumulou experiências em cooperação internacional para o desenvolvimento sustentável no terceiro setor e na filantropia. Atualmente é Gerente do Programa de Finanças Verdes da Missão Diplomática do Reino Unido no Brasil.
1. Você estudou e tem trabalhado com a questão de sustentabilidade e o meio ambiente. Pode nos falar um pouco a respeito desses temas?
Meio ambiente é um tema basilar. Toda a vida do planeta depende de seu equilíbrio. A economia, da mesma forma, só se sustenta a partir dos recursos naturais e de como são utilizados. Sustentabilidade, portanto, foi o conceito que integrou as considerações aos aspectos ambientais, sociais e econômicos, revelando de forma mais sistêmica esta inter-relação e, sobretudo, colocando o meio ambiente como eixo estratégico do desenvolvimento, para além de seu valor intrínseco.
2. Quando se fala em sustentabilidade, pensa-se no tripé social, ambiental e econômico. Como você definiria esses princípios? Qual deles merece maior atenção, ou todos são interligados e afetam nossa qualidade de vida integralmente?
Exatamente, sustentabilidade é o conceito que revela as interligações entre os três pilares – social, ambiental e econômico e, portanto, são princípios interdependentes e insuficientes se tomados individualmente. Talvez, o ambiental seja realmente o único que escapa a isso. A natureza não depende da economia ou da sociedade para subsistir, mas, por outro lado, é impactada por ambos. Por isso, sustentabilidade é um conceito antrópico, ou seja, é uma noção que tem como referencial a presença humana no planeta.
3. Questões relacionadas à sustentabilidade, preservação do meio ambiente e consumo consciente são discutidas nas escolas e universidades?
Há entre as Diretrizes Curriculares Nacionais estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação, que são normas obrigatórias, as específicas para Educação Ambiental que devem ser observadas pelos sistemas de ensino e suas instituições de Educação Básica e de Educação Superior a partir da Política Nacional de Educação Ambiental. Estas contemplam todos os temas citados na pergunta. Não sou especialista na área então é mais difícil avaliar a implementação, mas em termos de marco institucional o Brasil está bem posicionado.
4. Quando se fala em preservação do meio ambiente, pensa-se também nos modelos de descarte que causam tantos danos ao meio ambiente. Existe alguma política de incentivo ao descarte consciente?
Mais uma vez, o Brasil tem um marco legal bastante consistente para o incentivo ao descarte consciente que é a Política Nacional de Resíduos Sólidos de 2010, que é inclusive uma referência internacionalmente. Na verdade, mais que um incentivo ela é um desincentivo ao descarte inconsciente por meio do estabelecimento da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos e a logística reversa. Isso significa que a PNRS obriga as empresas a aceitarem o retorno de seus produtos descartados, além de as responsabilizar pelo destino ambientalmente adequado destes. A inovação fica sobretudo na inclusão de catadoras e catadores de materiais recicláveis e reutilizáveis tanto na logística reversa como na coleta seletiva, algo essencial para um país com nosso contexto social.
5. Você acha que os modelos de descarte atuais serão substituídos por novos modelos no pós-pandemia? O que fazer, por exemplo, para incentivar as pessoas a descartar de forma consciente as máscaras antivírus?
Sempre é preciso se repensar e certamente a pandemia deu destaque a certas fragilidades da implementação da PNRS. Grande parte dos hospitais brasileiros ainda não praticam efetivamente a separação e adequada destinação de seus resíduos e, na pandemia, este problema é agravado tanto pela maior quantidade de resíduos de serviços de saúde gerados como por uma maior quantidade de geradores, uma vez que a população também começa a produzir este tipo de resíduo em escala. Falta ainda muita circulação da informação, então talvez este seja o primeiro passo: uma campanha de conscientização séria que jogue luz nesta questão.
6. Na sua opinião, o mundo está mais consciente das necessidades de preservação do meio ambiente e dos recursos naturais para que gerações futuras possam deles usufruir?
Acredito que tenhamos passado do ponto em que estas necessidades de preservação eram uma questão de consciência e chegamos a um patamar de sobrevivência. Também não se trata apenas das gerações futuras, já estamos sofrendo as consequências do desequilíbrio ambiental provocado pela ação humana e do esgotamento dos recursos naturais desde já. A própria pandemia é resultado de relações danosas entre o ser humano e o meio ambiente e os conflitos por fontes de água, por exemplo, são uma realidade.
7. Quais as ações que mais comprometem e degradam o meio ambiente?
Nosso modelo produtivo e de consumo como um todo é baseado em uma relação predatória com o meio ambiente: retiramos mais do que necessitamos, sem respeitar os ciclos naturais de reposição e, além disso, quando descartamos os resíduos e rejeitos não cumprimos com os padrões adequados estabelecidos. Já temos conhecimento suficiente para evitar grande parte dos problemas, mas ainda não conseguimos integrá-lo nas nossas práticas efetiva e definitivamente.
8. O que na sua opinião precisa ser feito para que as sociedades conheçam mais a respeito de sustentabilidade, preservação do meio ambiente e consumo consciente?
Acredito que para avançarmos como sociedade precisamos tratar a questão das desigualdades socioeconômicas que estão intrinsicamente relacionadas a desigualdades ambientais, inclusive no que diz respeito às informações, ao conhecimento. A educação é, portanto, um componente estratégico para este avanço, mas é preciso ter um entendimento amplo que traga também os saberes tradicionais para esta equação. Além disso é preciso cada dia mais abordar o tema da perspectiva das oportunidades, pois a transição para modos de vida mais sustentáveis, que preservam o meio ambiente e que se baseiem em consumo conscientes alavancam inúmeras delas; por exemplo, um maior potencial de geração de empregos de qualidade e menos gastos com saúde.
9. A questão climática está relacionada com a sustentabilidade? Como?
A mudança do clima intensificada pela ação antrópica tem relação com nossos padrões de produção e consumo em desequilíbrio com o meio ambiente: por um lado, vimos emitindo uma quantidade de gases de efeito estufa muito significativa e, por outro, vimos degradando ecossistemas que absorvem estes gases, diminuindo a capacidade natural do planeta de equilibrar as emissões. Assim, a questão climática está relacionada com um modo de vida insustentável. A notícia boa é que práticas sustentáveis geram diretamente um impacto positivo no equilíbrio climático do planeta. Por exemplo, o Brasil tem potencial para gerar mais de 25 mil gigawatts em energia solar, aproveitando sua excelente localização geográfica com abundância de luz solar, uma medida sustentável que, ao mesmo tempo, é considerada uma das melhores alternativas para a diminuição das emissões de CO2 na atmosfera, que é um dos principais gases intensificadores do efeito estufa.
Entrevistas
MARCOS TERENA

De filho pródigo à liderança internacional, o índio, piloto e cacique Marcos Terena, tornou-se um líder respeitado e o ponto de equilíbrio entre autoridades brancas e os povos indígenas.




Barraginhas: a salvação das lavouras
A solução para os desertos de Gilbués
Silvestre Gorgulho
Desde a primeira reportagem da Folha do Meio Ambiente sobre o deserto vermelho de Gilbués, em outubro de 2005, o tema não saiu mais da mídia. Depois vieram as matérias sobre as barraginhas. Primeiro em Minas Gerais, depois as experiências feitas pelo técnico da Embrapa, Luciano Cordoval, no Piauí. Mais precisamente na região do entorno do Parque da Serra da Capivara. Cordoval, coordenador do projeto, preparou 30 técnicos da Emater-PI e da COOTAPI – Cooperativa de Técnicos Agrícolas do Piauí que treinaram outros multiplicadores das comunidades locais. Todos foram responsáveis pela implantação de mais de 300 das 3.600 barraginhas programadas na zona rural de 12 municípios: São Raimundo Nonato, Guariba, Paes Landim, Oeiras, São Lourenço, Caracol, Jurema, Acauã, Paulistana, Santa Luz, Coronel José Dias e Aniz de Abreu. E agora as barraginhas chegaram ao município de João Costa, que tem desertos vermelhos à semelhança de Gilbués. Se a iniciativa salvar as terras de João Costa, com certeza Gilbués, também, estará salva. Graças às barraginhas e ao trabalho incansável de um técnico persistente e sonhador: Luciano Cordoval.
A foto mostra o estado avançado de degradação. As casinhas, ao fundo, é a prova
de que já houve um apogeu, onde tudo era verde coberto de matas, mas a ação do homem foi tornando o cenário desertico
Folha do Meio – O que o motivou a trabalhar para tentar reverter a degradação das terras de Gilbués?
Luciano Cordoval – Quando vimos pela primeira vez, na Folha do Meio Ambiente, a reportagem sobre o deserto vermelho de Gilbués, em outubro de 2005, ficamos extremamente estarrecidos.
Olha, foi impressionante ver aquelas imagens publicadas. Mas, imediatamente, este estarrecimento deu origem a uma empolgação. Sim, porque comecei a buscar uma solução. Queria enfrentar aquele desafio. Queria montar uma equipe para desenvolver tecnologias sociais de conservação de solos e água. Não é fácil trabalhar à distância. Mas este problemão de Gilbués é uma questão humanitária e de solidariedade.
FMA – Você tem acompanhado na mídia o desdobramento da questão dos desertos de Gilbués?
Luciano – Sim, estou acompanhando tudo desde aquela primeira matéria que saiu na Folha do Meio. Depois vieram os desdobramentos como no Globo Rural – que até mostrou o jornal de vocês – Globo Repórter, novamente a Folha do Meio Ambiente, com as cartas dos leitores, e muitas citações na Internet.
E o tempo foi passando. Iniciamos nossos trabalhos de captação de águas superficiais de chuvas, pelas barraginhas, para conservação dos solos e água e revitalização de mananciais e córregos, no Semi-Árido e Sub-Úmido piauienses.
Dentre os municípios abrangidos pelo projeto, destacamos o de João Costa, pelo elevado grau de degradação de seus latossolos vermelhos, sob vegetação de Cerrado, após desmatamentos, o que o torna muito parecido ao deserto de Gilbués.
FMA – João Costa está longe de Gilbués. Como você descobriu o deserto vermelho de João Costa ?
Luciano – O avanço das barraginhas, no Piauí, foi planejado para contemplar doze municípios, sendo oito do Semi-Árido e quatro na transição para o Sub-úmido. Em março e abril de 2007, após caminhada pelos sete municípios vizinhos, para implantar o sistema, chegamos a João Costa.
Eles já tinham ouvido falar do projeto e tiveram o privilégio de assistir recentemente, por meio de suas parabólicas, a uma reportagem da TVE, no programa Mobilizando o Brasil, mostrando o avanço das barraginhas no Semi-Árido piauiense e já estavam ansiosos. Isso porque 60 a 70% dos solos do município encontram-se em elevado grau de degradação. Essa situação criou um am-
biente contagiante, favorável, que está contagiando a todos.
“O que for bom para a região de João Costa será bom para Gilbués. João Costa será uma vitrine demonstrativa para a solução dos desertos vermelhos”
FMA – Por que esses municípios piauienses foram contemplados?
Luciano – Porque as barraginhas, ao serem premiadas e certificadas como tecnologia social da Fundação Banco do Brasil, em 2003, receberam um aval para serem disseminadas pelo país, e o estado escolhido foi o Piauí. Mais especificamente a região de seu Semi-Árido e um pouco da transição ao Sub-Úmido.
Na verdade foi pela repercussão do sucesso de nossas experiências em Minas Gerais, nos últimos dez anos. Além de nove municípios do Semi-Árido, foram escolhidos três do Sub-Úmido, sob vegetação de Cerrado. Guaribas, Santa Luz e João Costa se enquadram nessa categoria e são mais parecidos com as regiões de Minas onde já vimos desenvolvendo nosso trabalho com as barraginhas. Desde o início, esperávamos muito desses municípios e eles estão correspondendo.
“É preocupante tendência atual de converter enormes áreas em cultivos para a
produção de etanol. O homem avança, come o filé e deixa os ossos: os desertos vermelhos”.
FMA – Você acredita que João Costa possibilitará o desenvolvimento de um protótipo para Gilbués?
Luciano – Mesmo estando a 400km de distância, João Costa tem muita similaridade com a região degradada de Gilbués, quanto a solos, predominando os latossolos vermelhos, muito frágeis frente à erosão, além de um regime de chuvas parecido, acima de 1.000 mm. E como nós já estamos familiarizados com a região, as pessoas já estão mobilizadas e motivadas.
Também já foram implantadas as primeiras 300 barraginhas. Agora, nós também estamos motivados e encantados, principalmente com o clima favorável instalado. E também com todo esse envolvimento que está nos motivando buscar mais recursos para complementar nossa experiência. Estamos utilizando esse município como nossa base para introduzir uma cultura de plantios em nível, terraceamentos, plantio direto e trabalhar a educação ambiental sustentável.
Assim, queremos mais e mais barraginhas nas fissuras/erosões maiores e milhares de microbarraginhas, não dispersas, mas coladas umas às outras, como alvéolos no “favo de mel”, nas microenxurradas capilares, nas encostas degradadas.
FMA – Como é mesmo esse sistema “favos de mel”?
Luciano – As barraginhas tradicionais serão feitas nas grandes enxurradas, que já apresentam os sulcos feitos pela erosão. Os milhares de alvéolos (microbarraginhas) serão nas enxurradas minúsculas, capilares, quase imperceptíveis, serão como guarda-chuvas invertidos e dentro de cada alvéolo será plantada uma árvore leguminosa nitrificadora, como leucena e algaroba, que deixará suas folhas caírem, para recuperar o solo.
Enquanto se gasta uma hora de máquina para uma barragi-nha, fazem-se de 8 a 12 microbarraginhas nesse mesmo tempo.
FMA – Então, João Costa será o laboratório?
Luciano – Justamente, será o laboratório que pensávamos ter na própria região de Gilbués. Já nos encantamos com a região, com o povo, com a problemática, há reciprocidade, é tudo que necessitávamos.
O que for bom para a região de João Costa será bom para Gilbués. Assim, pretendemos tornar João Costa uma vitrine demonstrativa para a solução desse problema de desertos vermelhos de regiões com solos sob vegetação de Cerrado. Domados os solos-problemas, daí a levar para regiões similares, é questão de arranjos adaptativos, ajustes, sintonia fina.
O importante é o homem, o envolvimento com o povo e esse já é nosso parceiro em João Costa, é meio caminho andado. O mais, é correr atrás dos recursos e trabalhar, trabalhar, estamos otimistas.
FMA – Você acredita que outros desertos poderão surgir?
Luciano – Creio que isso é inevitável, em face do avanço dos desmatamentos e a introdução de pastagens e lavouras sem a aplicação dos cuidados necessários e das técnicas conservacionistas e, principalmente, sem reposição de nutrientes.
Nesse sentido, é preocupante a apressada tendência atual de converter enormes áreas em cultivos para a produção de etanol. O homem avança, come o filé e deixa os ossos, os desertos vermelhos. O Brasil Central está cheio disso.
FMA – Você é otimista mesmo assim?
Luciano – Essa é a minha missão, tentar regenerar solos degradados, veredas e matas ci-liares, revitalizar mananciais, nascentes e córregos, implantar capões no entorno das barragi-nhas e nos eixos úmidos formados por elas.Com a umidade readquirida e o sol, vêm o verde, as nascentes, volta a vida, volta a esperança, somos geradores de esperanças e temos conseguido isoo, o que nós torna otimistas.
FMA – Então,você mudou de estratégia?
Luciano – Sim, pois desco-brimos nosso sítio de trabalho, tropeçamos no nosso tesouro. Numa região em que a mídia não está fazendo pressão, pode-remos gradativamente, e sem as tensões e cobranças externas, apenas as nossas, ter tranqüilidade para desenvolver nossos planos, não será uma corrida contra o tempo, mas um avanço natural. Penso que nada é por acaso, há momentos em que, como se diz em Minas Gerais, o cavalo está passando arreado à nossa frente…
Os desertos vermelhos de Gilbués estão à espera dos resultados dos experimentos com as barraginhas de João Costa. Uma esperança a caminho. (Foto: André Pessoa)
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